Paula Perfeito: “Quão diferente seria o mundo se as lideranças fossem mais diversas…”

Paula Perfeito é apaixonada pela Comunicação, mas também pela liderança e pelo talento. Diz que quanto mais um convite a assusta, mais hipótese há de o aceitar, por isso na Altice já teve inúmeras funções, sendo atualmente Head of Media, Partnerships and Communications no SAPO, e não hesitou em assumir a presidência da PWN Lisbon em 2022.

Paula Perfeito é Head of Media, Partnerships and Communications no SAPO.

Há quase duas décadas no setor das comunicações, Paula Perfeito tem competências de comunicação institucional, reputacional e de produto, media relations e marketing intelligence na Altice Portugal, onde tem assumido diferentes funções de gestão de projetos e equipas e trabalhou marcas como a TMN, a MEO e o SAPO. Apesar desta relação já durar há tantos anos, não era este o sonho que levou Paula Perfeito a licenciar-se em Comunicação Social, na Universidade Católica, mas sim o de ser jornalista. E foi essa a sua primeira profissão, assim que saiu da faculdade, mas durou apenas um ano, até receber o convite da então PT para experimentar a área da comunicação institucional. Assume que esta escolha terá sido a decisão profissional mais difícil da sua vida, mas a verdade é que dura até hoje.

Em paralelo, Paula Perfeito criou o site de comunicação e cultura Entre | Vistas, para o qual já entrevistou mais de 100 pessoas, lançou o livro As Perguntas Que Somos, dinamiza projetos de locução, coordena e assegura a moderação de debates, sendo autora do fórum de reflexão multidisciplinar sobre liderança e talento “Conversas do Avesso” e, desde 2016, integra a PWN Lisbon, organização especializada em liderança e diversidade, primeiro como membro do seu board e, desde 2022, como presidente.

 

Diz que nasceu para comunicar, mais propriamente para fazer perguntas. O que a fez optar pela comunicação institucional numa altura em que já estava onde, aparentemente, sempre quis estar, numa televisão? 

Se me tivesse sido colocado essa pergunta há 20 anos, ter-me-ia causado um arrepio na espinha. Hoje, já não, ainda que, objetivamente, essa continue a ter para mim o epíteto de ‘decisão profissional mais difícil’. E volto atrás para a contextualizar: no final do curso de licenciatura em Comunicação Social da Católica (período pré-Bolonha), um protocolo entre a universidade e uma televisão generalista para premiar o melhor aluno proporcionou a minha entrada numa redação de televisão. Pela primeira vez e num cenário ‘real’, fui chamada a fazer o que fizera, desde o tempo da infância, a brincar: simular cenários de entrevistas, perguntar, comunicar. Ali era ‘a sério’, mas sentia-me em casa, ao lado de profissionais que me habituara a ver no ecrã que mudou o país e o mundo. Decorrido o protocolo, e numa (inesperada e surpreendente) bifurcação surgida logo ali no início da vida profissional, fui desafiada a ficar na televisão. Ao mesmo tempo, fui também chamada para um outro desafio profissional, no campo da comunicação institucional, na empresa de referência no país na qual ainda hoje me encontro. Corriam os 24 anos de idade e nas palavras de Álvaro de Campos «todos os sonhos do mundo». E fez-me sentido assumir, naquele tempo, aquela decisão, dado o desafio que me foi dirigido – e que me pareceu único para uma jovem profissional de 24 anos – de liderar o arranque de raiz de uma área de comunicação, num ambiente corporativo muito desafiante e numa das empresas mais relevantes para a economia do país e da vida de todos os portugueses.

Nunca se arrependeu dessa decisão?

Honestamente, não. Passados 20 anos depois de ter iniciado a minha atividade profissional na televisão, justamente, e com outras oportunidades que foram surgindo, olhando para todo o trajeto com a maturidade e a experiência adquiridas, tenho a profunda convicção de que não existe uma via única para destinar aquilo a que podemos chamar ‘vocação’ e, mesmo que se siga numa aparente via única, ela terá com toda a probabilidade diferentes saídas, o que pressupõe diferentes possibilidades para o desenvolvimento do ‘talento’. No trajeto profissional, a comunicação tem sido para mim uma trave-mestra, independentemente das marcas, das equipas, dos projetos ou das funções que assumi. Tenho tido a oportunidade de no âmbito de funções profissionais ou do exercício de iniciativas de cidadania desenvolver projetos de comunicação de raiz, como a fundação do Entre | Vistas, a plataforma digital de comunicação cultural que lancei em 2014, hoje com cerca de 100 líderes entrevistados e que deu origem ao livro que publiquei em 2022, As Perguntas que Somos; apresentar eventos e moderar debates, com destaque para o lançamento do inédito fórum de reflexão multidisciplinar sobre liderança e talento “Conversas do Avesso”; ou criar do zero formatos audiovisuais e workshops de comunicação que desenhei de raiz e que me deram um gosto e um gozo extraordinários.

 

“Se a nova função proposta me ‘assustar’, então é nessa medida que a levo a sério e a pondero. Porque isso quererá dizer que estou a ser transportada para fora de pé e que me está a ser reconhecida a capacidade de corresponder à nova ambição.”

 

Está na mesma empresa há quase duas décadas. Nunca sentiu vontade de mudar? Qual o segredo dessa relação tão duradoura?

Para uma relação tão duradoura, tem de haver amor! Mas também um propósito, uma visão de futuro e o sentido do impacto que se pode gerar. Ao longo da minha experiência corporativa, tenho vindo a consolidar uma visão estratégica, know-how e diferentes valências, da comunicação institucional, reputacional e interna à comunicação de marca e produto, bem como media relations, marketing intelligence e, nos últimos anos, em gestão de parcerias e desenvolvimento de negócio. Ao mesmo tempo, tenho progressivamente assumido funções de gestão de projetos emblemáticos e equipas multidisciplinares, em marcas líderes de mercado (por esta ordem, PT ACS, TMN, PT, MEO e SAPO) no setor das comunicações, um dos mais desafiantes, vertiginosos e relevantes para a vida económica e social do país. Destaco, por fim, uma premissa inerente a toda a evolução e sem a qual já teria mudado: poder aprender.

Mudar de função é, muitas vezes, quase como mudar de empresa, tais os novos desafios que lhe estão inerentes. Como reage e o que equaciona quando recebe uma proposta para uma nova função? 

Ao contrário do que possa à partida suceder com outras pessoas, se a nova função proposta me ‘assustar’, então é nessa medida que a levo a sério e a pondero. Porque isso quererá dizer que estou a ser transportada para fora de pé e que me está a ser reconhecida a capacidade de corresponder à nova ambição.

Qual é o seu modus operandi quando chega a uma nova função? Mostra logo as suas ideias ou reserva um tempo para conhecer a equipa e o ambiente em que se move?

Tipicamente, quando inicio uma nova função, partilho com a nova equipa o meu estilo pessoal de gestão e a visão para o projeto, sempre suportada numa atitude de escuta e envolvimento de todos os elementos da equipa, procurando conciliar o que já se fez bem com o que se pode fazer melhor e em conjunto.

Que características considera fundamentais para ser um bom líder?

Quando me falam de um (bom) líder, lembro-me de uma frase que uma vez ouvi do dramaturgo e encenador José Silva Melo: «Interessa-me dar aos atores de quem gosto papéis que eles podem fazer e não sabiam». Ora, um bom líder é visionário e tem a capacidade de criar novos líderes; tem, para além das competências, um quadro de valores inegociáveis; está ao serviço; pela sua forma de comunicar, envolve o outro, mobiliza em torno de uma meta estipulada para um propósito comum; sabe como enaltecer o valor do outro e (sem humilhar) corrigir erros de forma construtiva; empurra a equipa e vai à frente se tiver de assumir responsabilidades; sabe arriscar e, simultaneamente, continua com humildade a aprender; sabe escutar; sem “cola ao poder”, identifica sucessores; sabe sonhar e incute no outro a importância do sonho. Faz pontes, dialoga, agrega. Une. Inspira…

 

“Um estudo desenvolvido pela Fundação EFR (Empresas Familiarmente Responsáveis) refere que há uma perda de mais de 20% de talento devido a obrigações familiares que inibem as pessoas de assumir maiores responsabilidades nas organizações. E, desses, mais de 80% são mulheres sobre quem recaem maiores responsabilidades familiares, com ascendentes ou descendentes.”

 

Acha que as mulheres lideram de forma diferente?

A meritocracia deve ser o ponto de partida inegociável, sem condescendências. Como equacionar outro ponto de partida? Pergunto. Agora, se considerarmos as especificidades da liderança no feminino, designemos assim, olhemos para o Pew Research Center, que nos diz que as mulheres se destacam em vários fatores decisivos da liderança corporativa, como a criação de espaços de trabalho seguros, a valorização e integração de pessoas oriundas de diferentes contextos, a consideração do impacto social das decisões de negócio, a mentoria e o cuidado com colaboradores mais jovens ou o sentido de justiça face às condições e ao estatuto remuneratório. Quão diferente seria o mundo se as lideranças fossem mais diversas…

Há cada vez mais mulheres em funções de liderança, há estudos que provam que empresas com lideranças mais diversas são mais rentáveis e sustentáveis, as características da liderança feminina são cada vez mais valorizadas… porque não temos já mais mulheres como CEO e administradoras executivas?

Muitas vezes, por não quererem, legitimamente. Tantas outras vezes por razões culturais, que não estou em condições de analisar com a devida propriedade. Mas, neste campo, atrevo-me a introduzir um aspeto que me parece fundamental, do ponto de vista sistémico. A complexidade e a pluralidade de papéis que todos desempenhamos nas diferentes dimensões das nossas vidas exige esta largueza de espírito na observação das diferentes oportunidades de crescimento e desenvolvimento que surgem e que impactam de forma diferente os homens e as mulheres. Tenhamos essa noção. A meu ver, é responsabilidade dos líderes a obrigação de promover um ambiente de conciliação das dimensões múltiplas que a vida dos colaboradores tem; e da promoção da igualdade de oportunidades no acesso aos vários lugares de decisão. E isso propicia-se quanto maior for a consciência sobre a relevância de acolher nas organizações ambientes de diversidade. Há que ultrapassar preconceitos, modelos de liderança datados e condições de resistência à mudança, desde logo num aspeto crucial: olhar para a família (dos colaboradores) como um stakeholder importantíssimo em qualquer organização. Relevo, neste contexto, um estudo desenvolvido pela Fundação EFR (Empresas Familiarmente Responsáveis), que refere que há uma perda de mais de 20% de talento devido a obrigações familiares que inibem as pessoas de assumir maiores responsabilidades nas organizações. E, desses, mais de 80% são mulheres sobre quem recaem maiores responsabilidades familiares, com ascendentes ou descendentes. Ora, não percamos de vista estes fatores de mitigação do talento e da diversidade. Uma empresa genuinamente comprometida tem de definir e implementar medidas de diversidade, igualdade e inclusão absolutamente inequívocas.

Quando e em que contexto despertou para a importância da igualdade de género? 

Estou profundamente convicta de que o facto de ter tido na hierarquia familiar – na geração dos meus pais e na dos meus avós – modelos de casais com papéis muitíssimo bem definidos e complementares, me preparou organicamente para aquele que é o meu próprio papel e a consciência de que isso é um ponto de honra. E também talvez por isso sinta a profunda convicção de que posso, de alguma forma, ser útil à causa preconizada pela PWN Lisbon e ao cumprimento do seu propósito: ser referência na criação e consolidação de lideranças com impacto, alicerçadas em referenciais de diversidade, igualdade e inclusão e promotoras do desenvolvimento das pessoas de forma integral.

 

“Acredito que, se não retirarmos daí os olhos [propósito, valores e sonhos], não teremos como nos perder ou desequilibrar.”

 

O que levou a assumir a liderança da PWN e qual a missão que traçou para o seu mandato?

Em primeiro lugar, o desafio que me chegou assustou-me e, por isso, como dizia atrás, levei-o a sério e ponderei-o! Seis anos depois de endereçar no board a pasta da comunicação estratégica, ter sido desafiada e eleita para a presidência foi, simultaneamente, um reconhecimento e uma responsabilidade. Fez todo o sentido, dado o propósito desta organização estar enquadrado no meu próprio propósito de vida e porque me permitiu refletir e antecipar o impacto que podemos gerar quando colocamos o que somos ao serviço de uma meta que não somos nós, mas que nos pode transformar integralmente. E já o fez. Pertencer à PWN Lisbon fez e faz toda a diferença na construção e consolidação do meu próprio sentido de missão pessoal, nas suas diferentes componentes; na aprendizagem ganha sobre os ecossistemas organizacionais e corporativos; na rede extraordinária de contactos de confiança (que não são comparáveis com os cartões de visita trocados em cocktails); na gratidão sobre todos os parceiros e voluntários que fazem parte e permitem fazer acontecer e, ainda, sobre todas as pessoas impactadas pela organização que nos dizem, elas próprias, que ser membro da PWN Lisbon lhes mudou a vida. No atual mandato, para além do crescimento sustentável da organização em todas as vertentes, é desígnio da PWN Lisbon consolidar a sua posição como parceiro de referência do país para a diversidade.

Tem o seu emprego, a PWN e a sua vida pessoal e familiar. Como consegue encontrar tempo para essas várias facetas e o que é mesmo fundamental para o seu equilíbrio? 

Com prioridades muito claras, foco, paixão, muito, muito trabalho, equipas alinhadas e empáticas e um extraordinário apoio familiar. E com os olhos colocados no propósito, nos valores e nos sonhos. Acredito que, se não retirarmos daí os olhos, não teremos como nos perder ou desequilibrar.

Qual o melhor conselho que deixa a uma jovem que está a dar os primeiros passos na carreira?

Olhar para a carreira quando se está a começar é ter a oportunidade de ter o futuro provisoriamente inteiro nas mãos. E isso é absolutamente fascinante. Todas as possibilidades estão em aberto. Não dou conselhos, porque cada pessoa é totalmente responsável pela gestão da sua própria carreira e não pode delegar essa responsabilidade em ninguém. Recordo apenas algumas ideias genéricas que, pelo menos a mim, me ajudaram até aqui: procurar conhecer a real vocação e ganhar talento para a direcionar intencionalmente; trabalhar, trabalhar, trabalhar; ter humildade e aprender fervorosamente com os erros e com os outros; construir em e com as equipas para ganhar perspetiva e alcance; ganhar consciência sobre o próprio valor e reconhecer o valor dos outros. Ter referências, pessoas e histórias que inspirem. Procurar deixar um legado. E tudo isto se faz todos os dias, desde o início, em cada passo dado…

 

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