Paula Perfeito: O Meu Maior Desafio

Paula Perfeito, responsável pela Gestão Parcerias TV e Comunicação Multicanal MEO, num testemunho que revela que para a mesma vocação pode haver vários formatos e roupagens.

Paula Perfeito é responsável pela Gestão Parcerias TV e Comunicação Multicanal MEO.

Com mais de década e meia no setor das comunicações e um estágio remunerado em televisão como prémio para o melhor aluno de Comunicação Social da Universidade Católica Portuguesa (2004), Paula Perfeito é profissional de comunicação, com competências de comunicação institucional, reputacional e de produto, media relations e marketing intelligence na Altice Portugal, onde tem assumido diferentes funções de gestão de projetos e equipas. É mentora e construtora do Entre | Vistassite de comunicação e cultura que fundou em 2014. É, desde 2016, board member da PWN Lisbon, organização especializada em liderança e diversidade, na qual assume a responsabilidade das áreas de comunicação e eventos. Dinamiza projetos de locução, coordena e assegura a moderação de debates, sendo autora do fórum de reflexão multidisciplinar sobre liderança e talento “Conversas do Avesso”.

 

“Os maiores desafios na vida profissional estão associados, não raras vezes, a mudanças significativas, que podem passar pela aceitação de novas responsabilidades; o salto para fora das zonas habituais, obrigando ao desenvolvimento de novas competências; até à partida para novas culturas ou países distantes, exigindo uma readaptação da própria vida… Comigo, foi diferente. E começo por revisitar, para contextualizar, o tempo da (minha) infância.

Uma das brincadeiras que os meus pais contam e recontam que eu tinha, ainda antes das primeiras letras, era fazer de conta que entrevistava: lançava as perguntas e devolvia as respostas, para de novo perguntar. Elaborava conversas com ilustres figuras imaginárias e simulava a narrativa, colocando a voz, treinada mais tarde pelo hábito de ler em voz alta, marchetado e bem pela singular professora primária, que incitava a sermos (muito) mais do que aprendizes do português e da matemática.

Cresci a ‘entrevistar’, a interpelar, a colocar-me no lado de quem ausculta, quer saber mais e procura no outro o importante acrescento para uma ideia maior. Na escola, fui desenvolvendo não sei se um talento ou uma vocação para a pergunta. Para dar a cara, para dar a voz. Não tive qualquer dúvida de que seguiria uma área de humanidades, para depois “fazer” comunicação. E foi Comunicação Social que escolhi, na Universidade Católica Portuguesa, pela amplitude e profundidade da formação e o legado de humanidade que fica para além da sólida experiência curricular. Aí, com professores de que me lembrarei sempre, fortaleci essa vontade de perguntar e usar a palavra. Estava lançado o verdadeiro propósito de um curso: ensinar a pensar.

No fim, um protocolo entre a universidade e uma televisão generalista para premiar o melhor aluno proporcionou a minha entrada numa redação de televisão. Pela primeira vez e num cenário ‘real’ era então chamada a fazer o que fizera, desde o tempo da infância, a brincar. Ali era ‘a sério’, mas sentia-me em casa. Ao lado de profissionais que me habituara a ver no ecrã que mudou o país e o mundo, estava eu. Muitos deles entre os que me marcaram na forma de construir a própria pergunta, como com José Tolentino Mendonça: «quando as perguntas que trazemos valem mais do que as respostas provisórias que encontramos». E aí percebemos quão importante é o sentido do (saber) perguntar.

Decorrido o protocolo, e numa (inesperada e surpreendente) bifurcação surgida logo no início da vida profissional, a querer marcar (ou não) determinantemente o meu caminho, sou desafiada a ficar na televisão. Ao mesmo tempo (exatamente ao mesmo tempo), sou também chamada para um outro desafio profissional, na área da comunicação institucional, na empresa de grande referência no país na qual ainda hoje me encontro. Corriam os 23 anos de idade e nas palavras de Álvaro de Campos «todos os sonhos do mundo». Também o peso então sentido de uma decisão balanceada entre o perpetuar de um sonho, em parte já concretizado, e a oportunidade de liderar desde logo o startup de uma área de comunicação, numa abordagem corporativa e institucional.

Assumida a decisão e ao longo de mais de década e meia, tenho vindo a consolidar uma visão estratégica, know-how e valências de comunicação institucional e de produto, media relations e marketing intelligence numa das empresas mais relevantes para a economia do país, na qual tenho assumido diferentes funções de gestão de projetos e equipas. Também com entrevistas pelo meio e inclusive para a televisão. A televisão, que entretanto ganhou outros espaços e formatos, fora do linear. Nesta mais de década e meia, sublinho a interação e permanente aprendizagem com extraordinários profissionais, com impacto no que me tornei como profissional e como pessoa (e isso, no final, será o essencial para lá de todas as funções).

E porque a influência da professora primária é transversal a toda a vida, como tudo o que vem de alicerces firmes, especializei-me em conciliar (penso que o verbo é de facto esse) diferentes responsabilidades relacionadas com a pergunta. Desde há cerca de seis anos, e em regime de voluntariado, procuro deixar uma marca pessoal e contribuir para o desenvolvimento e a dinamização da Professional Women’s Network Lisbon (PWN Lisbon), organização sem fins lucrativos no âmbito da qual entrevisto todos os meses um líder, para a partilha de modelos e práticas de excelência, e desenhei de raiz as “Conversas do Avesso”, para juntar num mesmo lugar oradores com perfis nos antípodas, numa conversa à volta do talento e da liderança. Mais um fórum para a pergunta, nem de propósito. Na PWN Lisbon, tenho sido a mais nova de uma equipa de carismáticos líderes com quem muito tenho aprendido, desde logo a perguntar melhor.

Há quase sete anos, fundei o Entre | Vistas, plataforma digital de comunicação e cultura, na qual entrevisto personalidades inquietantes, com histórias de vida, trajetos profissionais e domínio de saberes que possam constituir uma oportunidade para a consolidação de valores, o debate de ideias e a hierarquia de conhecimentos. É o meu (humilde) exercício de cidadania cultural e curadoria de conteúdos de comunicação, que conta já com mais de 50 personalidades entrevistadas: na literatura, edição, tradução, poesia, artes plásticas, ciência política, gestão, música, dança, religião e fé, fotografia, história da arte, matemática, arquitetura, responsabilidade social, comunicação, humor, gastronomia, moda… Mapeando conhecimentos e, fundamentalmente, valores de referência. Não terá sido à toa que o Entre | Vistas tenha sido lançado no ano em que nasceu o meu primeiro filho. Aí, mais do que nunca, assumi um radical compromisso com a pergunta, consciente de que o legado a deixar aos filhos não está na resposta pela resposta. Mas na construção que começa imediatamente antes, com a pergunta.

Ao longo dos anos, surgiram vários outros desafios profissionais, é certo. Mas menos difíceis, chegados com naturalidade e merecendo, a seu tempo, a devida ponderação, numa tomada de consciência mais alinhada com a missão e o propósito de vida, menos com a medida do esforço.

Disse-nos a incontornável escritora brasileira do século XX, Clarice Lispector: «Vocação é diferente de talento. Pode-se ter vocação e não ter talento, isto é, pode-se ser chamado e não saber como ir». Talvez caiba aí mesmo a lição aprendida: não só nada é absolutamente irreversível, como há para a mesma vocação vários formatos e roupagens. O que é preciso é saber (como) ir.

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