Gestão de topo continua a ser um mundo de homens

Apesar dos avanços em virtude da entrada em vigor da Lei das Quotas, as melhorias numéricas são conseguidas graças a lugares não executivos, onde o poder de decisão é menor.

Os órgãos de administração das empresas cotadas em Bolsa têm, em média, 9 membros, dos quais, apenas dois são mulheres.

Os conselhos de administração das empresas portuguesas cotadas em bolsa continuam a ser órgãos de poder predominantemente masculinos, não obstante as melhorias conseguidas em virtude da aplicação da Lei das Quotas. A presença feminina nos seus órgãos de administração passou de 18% em 2018 para 22% em 2019. Nos órgãos de fiscalização as mulheres passaram a ocupar 26% dos assentos, quando no ano da entrada em vigor da Lei eram 19%.

Esta é uma das conclusões que se pode extrair do WoBómetro, estudo do projeto Women on Boards, coordenado pelas professoras do ISEG Sara Falcão Casaca e Maria João Guedes, que visa retratar a representação de mulheres e homens nos órgãos de gestão das empresas cotadas em bolsa e das entidades que integram o setor empresarial do Estado.

Retrato das empresas cotadas

Os dados coligidos pelos investigadores do projeto evidenciam que em 2019 (20 de outubro de 2019) existem 39 empresas cotadas na Euronext Lisboa, abrangidas pela Lei 62/2017, com 444 membros efetivos dos órgãos sociais, 93 dos quais são mulheres. Os órgãos de administração têm, em média, 9 membros, dos quais 2 são mulheres, enquanto os órgãos de fiscalização têm, em média, 3 membros, dos quais 1 é mulher. A proporção de mulheres em cargos executivos passou de 9% para 12%. Por comparação, nos cargos não executivos o aumento foi de 4 pontos percentuais (de 26% para 30%). Neste cenário, continuam em franca minoria as mulheres que são presidentes do órgão de administração ou da Comissão Executiva: Paula Amorim na Galp e Cláudia Azevedo na Sonae.

No Top Wob, o pódio das empresas que têm uma representação mais equilibrada entre mulheres e homens nos seus órgãos de gestão, encontra-se a Inapa (43%), no lugar cimeiro, seguida pela Corticeira Amorim, e pela Sonae Capital, (33%), e, em terceiro lugar, encontram-se a Jerónimo Martins e a Sonae (30%). Apenas 22 empresas cumprem a obrigação legal de divulgar planos para a igualdade.

Empresas do PSI-20

Fazendo zoom sobre as maiores empresas cotadas em Bolsa, que compõem o índice PSI-20 (17 empresas, pois a EDP Renováveis não foi considerada por ter sede no estrangeiro), verifica-se que as mulheres ocupam 25% dos lugares nos órgãos de administração (em 2018 eram 21%). A evolução é positiva desde 2018, quando entrou em vigor a Lei das Quotas (Lei n.º 62/2017). Nesse ano registou-se um incremento de 5,4 pontos percentuais da presença de mulheres nas empresas do índice PSI-20, mas ainda assim Portugal encontra-se 3 pontos percentuais (pp) abaixo da média europeia (28%). Nos órgãos de fiscalização 30% dos assentos são ocupados por mulheres (27% em 2018).

No entanto, a entrada de mulheres para os conselhos de administração tem-se feito sobretudo para cargos não executivos. Apenas 11% dos cargos executivos são desempenhados por mulheres (8% em 2018). Por comparação, nos cargos não executivos a presença feminina é mais expressiva (33%, versus 29% no ano passado).

Empresas sujeitas à Lei das Quotas

A Lei n.º 62/2017 determina que “a proporção de pessoas de cada sexo designadas de novo para cada órgão de administração e de fiscalização de cada empresa não pode ser inferior a 20%, a partir da primeira assembleia geral eletiva após 1 de janeiro de 2018, e a 33,3%, a partir da primeira assembleia geral eletiva após 1 de janeiro de 2020”.
Se atentarmos apenas nas 23 empresas da Bolsa a quem a Lei das Quotas já é aplicável verificamos que as mulheres são 24% dos membros do órgãos de administração e 29% dos órgãos de fiscalização (em 2018 eram, respectivamente, 18% e 22%). Nas 12 empresas do PSI-20, a presença feminina aumentou de 20% para 25% nos órgãos de administração e de 27 para 31% nos órgãos de fiscalização.

Índíce WoB-Euronext Lisbon

O projeto Women on Boards produziu ainda o índice WoB-Euronext Lisbon, que “visa mensurar a representação equilibrada entre mulheres e homens nos órgãos de administração das empresas cotadas na Euronext Lisbon. O índice varia entre 0 (zero) e 1 (um), em que 0 representa um órgão composto por apenas um grupo homogéneo (só homens ou só mulheres) e o valor 1 significa um órgão composto por um grupo paritário (50% de homens e 50% de mulheres). O índice WoB global médio é de 0,42, melhor do que o valor de 0,36 apurado para 2018, mas longe do desejável.

 

O WoBómetro integra-se no “Women on Boards: an Integrative Approach”, projeto do Centro de Investigação em Sociologia Económica e das Organizações / Consórcio em Ciências Sociais e Gestão (Socius/CSG) do ISEG-Universidade de Lisboa, financiado pela FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia e pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, e que irá decorrer até abril de 2021. Ao avaliar os resultados da aplicação da nova lei para a paridade de género em órgãos de gestão, não só em termos quantitativos como qualitativos, a equipa científica “não pretende sobrepor-se às entidades oficiais com competências no acompanhamento da efetividade da Lei das Quotas”, sublinha Sara Falcão Casaca. “Por um lado, os objetivos do Projeto são mais vastos e os resultados mais abrangentes; por outro lado, enquadra-se num projeto científico.”

Após a produção quantitativa, seguir-se-á uma análise qualitativa que incluirá entrevistas a mulheres em posições de liderança nestas empresas. A Executiva é stakeholder deste projeto.

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