Rita Gonçalves é licenciada em Organização e Gestão de Empresa, pelo ISCTE. Como formação, fez ainda o PAGE da Universidade Católica e o Advanced Development Program na Nova School of Economics. Iniciou a sua carreira na PwC em 2003 e é revisor oficial de contas desde 2013. Pertence ao departamento de Assurance, tendo realizado projetos de auditoria e outros serviços de fiabilidade junto de empresas nacionais e internacionais, nomeadamente empresas com títulos admitidos à negociação.
O que a conduziu à PwC assim que terminou a licenciatura? Este era o emprego com que sonhava?
Quanto terminei a Universidade vi-me assolada com a dúvida da maior parte dos nossos recém-licenciados. O que gostaria de fazer o resto da vida. Colocando o tema nesta perspetiva, a decisão assume um peso ainda maior. Durante o curso tinha tido algumas cadeiras que me tinham estimulado (auditoria, contabilidade, fiscalidade) e decidi que deveria tentar a minha sorte nas designadas Big4. Para ser sincera, na altura concorri a todas e fiz o processo de recrutamento em várias até à fase final. No entanto, a minha escolha recaiu na PwC porque foi aquela com a qual mais me identifiquei. Acho que a experiência que temos com as empresas na fase de recrutamento é marcante e decisiva.
Recorda o seu primeiro projeto de grande responsabilidade e de que forma ele impactou a sua evolução profissional?
Recordo com muito carinho e até alguma gratidão a oportunidade que me foi dada de gerir um grande cliente da firma, que teve um papel crucial no meu desenvolvimento profissional e na minha evolução na estrutura da PwC. Este projeto, que conduzi nos últimos 8 anos, permitiu-me contactar com diversos territórios, conhecer várias empresas, várias pessoas, vários negócios e enriquecer a minha carreira de forma ímpar.
Infelizmente, os últimos anos e alguns escândalos financeiros, têm colocado as firmas de auditoria sob um enorme escrutínio e pressão. Acredito que este foco por parte da opinião pública, dos reguladores e da economia em geral, terão como grande benefício a melhoria dos serviços prestados, por parte de todos os intervenientes no mercado financeiro.
Quais os momentos marcantes da sua carreira?
A promoção a senior foi um dos momentos mais marcantes da minha carreira, acima de tudo pelo que representava: a partir desse momento passei a ter um papel muito mais ativo nos projetos, gerindo equipas, gerindo a relação com o cliente, numa base constante. Foi um grande desafio, nomeadamente porque no ano seguinte casei e nasceu o meu filho, o que veio alterar a minha dinâmica profissional de forma radical.
Qual o projeto mais estimulante em que participou?
O projeto mais estimulante em que participei foi um projeto em Moçambique, que me permitiu não apenas um desenvolvimento técnico, mas acima de tudo o contacto com uma realidade completamente diferente. Era um projeto de grande relevância para a economia moçambicana, do ponto de vista económico e do ponto de vista social. Ver in loco a capacidade que as empresas podem ter de criar impacto na sociedade em que se insere foi um privilégio.
Como consegue desafiar-se numa empresa em que já trabalha há tantos anos?
Os desafios são constantes. Ao fim de 16 anos, continuo a aprender diariamente. Por outro lado, a existência de vários níveis dentro da organização tem a dupla função de motivar os colaboradores e apresentar-lhes novas funções. Vamos sendo constantemente expostos a novos projetos, novas funções, consequentemente novos desafios. E é por esta razão que continuo com a PwC ao fim de tanto tempo e que acordo todos os dias com motivação para vir trabalhar e enfrentar os desafios.
O que mais gosta naquilo que faz?
O que mais gosto é a falta de monotonia, é a a aprendizagem constante e a partilha com os outros (clientes, colaboradores). Por outro lado, o contributo para o desenvolvimento das minhas equipas e das suas competências são algo que me motiva bastante. Acho que uma carreira alternativa, seria a de docente. Quem sabe, um dia?
Quais as principais mudanças que a sua área tem enfrentado?
Infelizmente, os últimos anos, e alguns escândalos financeiros, têm colocado as firmas de auditoria sob um enorme escrutínio e pressão. Para além da elevada pressão, criou-se uma ideia de que todas as empresas de auditoria prestam um mau serviço, não atuam com independência e integridade no mercado. No entanto, acredito que este foco por parte da opinião pública, dos reguladores e da economia em geral, terão como grande benefício a melhoria dos serviços prestados, por parte de todos os intervenientes no mercado financeiro, e a clarificação de algumas zonas nebulosas sobre o âmbito da nossa atuação.
Temos um grande desafio que é o de motivar as novas gerações para a profissão de auditoria/consultoria. Vivemos hoje com a ideia de sermos uma profissão burocrática, demasiado rotineira, e em que o worklife balance é muito difícil, se não impossível.
E quais os principais desafios que se avizinham?
A par das preocupações mais técnicas, temos um grande desafio, que é o de motivar as novas gerações para a profissão de auditoria/consultoria. Vivemos hoje com a ideia de sermos uma profissão burocrática, demasiado rotineira, e em que o worklife balance é muito difícil, se não impossível. Uma parte desta ideia é mito, outra terá uma ponta de verdade.
O facto de sermos uma empresa com uma renovação constante da sua força de trabalho, com mais de 50% dos seus colaboradores na casa dos 20 anos, obriga-nos a pensar nestes temas com muita seriedade e procurar uma adaptação constante da nossa estrutura às novas gerações, mudando a proposta de valor que lhes oferecemos (e não falo apenas de compensação monetária). As novas gerações terão uma capacidade de mudar as empresas e o seu modus operandi de forma radical. E essa mudança é espetacular. Os próximos anos serão de desenvolvimentos significativos nas organizações, e não existirá melhor conjuntura para um gestor desenvolver as suas competências.
Foi promovida a partner há poucos meses. Quais a sua principal missão nesta nova função?
Enquanto partner foi-me proposto um desafio muito interessante: de apoiar a firma, nomeadamente no departamento de auditoria, na sua adaptação ao mundo digital e às novas gerações e na reorganização dos processos internos, numa procura constante pelo aumento da qualidade e eficiência dos serviços que prestamos. Após vários anos de foco em exclusivo na auditoria, agrada-me bastante o facto de poder colocar em prática e desenvolver competências mais estratégicas e de gestão global da empresa.
Quais as competências e características que considera fundamentais para chegar à função que hoje ocupa?
Perseverança e empenho são as caraterísticas que considero fundamentais. Temos de ter a capacidade de não desistir na primeira adversidade e dar o nosso melhor em tudo o que fazemos. Logicamente, nem sempre é fácil, mas se desenvolvermos estas competências, em qualquer que seja o desafio a que nos propomos, seremos bem-sucedidas. A gestão emocional é outra caraterística que considero fundamental para chegar a um cargo de liderança. Não estou com isto a dizer que devemos ser frias na avaliação das questões, mas por vezes não podemos deixar que a emoção se sobreponha à razão. Devemos procurar o equilíbrio.
Ao longo do seu percurso profissional teve pessoas que a inspiraram ou mentores que a ajudaram a guiar a sua carreira?
Sem dúvida. Tive a sorte de me cruzar na vida com pessoas que me inspiraram, que me desafiaram, que me ajudaram a superar os desafios e me ajudaram a ser melhor. Penso que em alguns casos, viram em mim o potencial que eu não sabia existir. Com algumas delas, continuo a ter o privilégio de trabalhar. Com outras desenvolvi relações de profunda amizade.
Acho que é a nossa busca pela perfeição que muitas vezes compromete que consigamos ser bem-sucedidas nas várias vertentes da nossa vida e acabemos por fazer escolhas redutoras ao longo do percurso.
Qual o melhor conselho de carreira que recebeu ou o melhor exemplo com que aprendeu?
O melhor conselho que recebi foi que temos de aprender a perdoar o facto de não sermos perfeitas. Nem sempre vamos conseguir ser as melhores profissionais, as melhores esposas, as melhores mães, e temos de aceitar essa imperfeição. Acho que é a nossa busca pela perfeição que muitas vezes compromete que consigamos ser bem-sucedidas nas várias vertentes da nossa vida e acabemos por fazer escolhas redutoras ao longo do nosso percurso.
A PwC é uma empresa fortemente comprometida com a diversidade de género. Da sua experiência, quais as principais vantagens da diversidade de género em cargos de liderança?
Estando com a PwC há mais de 16 anos, considero que existe um compromisso real com a diversidade de género na empresa. Enquanto mulher nunca me senti de todo discriminada ou alienada de qualquer oportunidade, simplesmente pelo meu género. No que respeita às vantagens da diversidade de género, acredito que existem diferenças entre mulheres e homens na sua abordagem aos problemas, na forma como gerimos os recursos, e, numa empresa que presta serviços de assessoria esta diversidade de pensamento é essencial. Da partilha de opiniões ou abordagens distintas surge sempre uma solução mais forte e mais rica.
Por outro lado, uma empresa com efetiva diversidade nos seus cargos de liderança demonstra aos seus colaboradores que mais do que um statement que as empresas publicitam nos meios de comunicação internos e externos, as oportunidades surgem efetivamente para os melhores profissionais, independentemente da sua raça, religião ou género. E essa crença ajuda a que todos os colaboradores contribuam com o seu máximo potencial, com óbvio benefício para a empresa e para a sociedade.
Qual o seu contributo para que mais mulheres consigam progredir na carreira e ascender aos cargos que merecem e ambicionam?
Tento contribuir para a progressão da carreira das mulheres no dia-a-dia, nas várias interações que tenho com as minhas equipas, na sua composição e na definição dos papeis que cada membro deve ocupar. A flexibilidade das tarefas, horários e portabilidade/trabalho remoto são ferramentas que utilizo e promovo para que as mulheres não sintam o peso de não conseguir conciliar a carreira profissional com a sua vida pessoal.
Por outro lado, acredito que o mentoring é uma ferramenta poderosa no desenvolvimento das capacidades de qualquer profissional, ajudando a explorar o potencial de cada uma e apoiando em momentos em que as tomadas de decisão são mais desafiantes.
Que conselho deixaria a uma jovem executiva que deseje construir uma carreira de sucesso?
Que não nos imponhamos limites ou restrições. Que não abdiquemos das coisas que para nós são importantes, que nos definem. No final, é a junção de todas as nossas caraterísticas (mulher, mãe, filha, amiga, profissional) que enriquece a diversidade das empresas e contribui para o seu sucesso.