Entrevista Kim Sawyer:
ligada ao sucesso

A embaixatriz, advogada e, também ela, empresária, acredita que o networking é uma das ferramentas que podem ditar o sucesso na carreira ou nos negócios

A empresa de Kim Sawyer faz recuperação de ativos em contencioso para as maiores companhias americanas

Licenciada em artes pela Clark University e em Direito pela Boston University School of Law, a embaixatriz dos Estados Unidos, Kim Sawyer, tem mais de 22 anos de experiência jurídica, seja em escritórios de advocacia ou na sua própria empresa, o The Locator Services Group (TLSG), que presta serviços de recuperação de ativos em contencioso a grandes empresas da lista Fortune 500. Recebeu o prémio de excelência do Women’s Business Enterprise Star em 2014 e foi vencedora do Enterprising Women of the Year Award em 2011. É membro da Unclaimed Property Professionals Organization, do  Center for Women & Enterprise, Women Presidents’ Organization, e do Women Impacting Public Policy.

Kim Sawyer lançou o programa Connect to Success, patrocinado pela Embaixada dos Estados Unidos em Portugal, para apoiar as mulheres no mundo dos negócios. A embaixatriz, advogada e, também ela, empresária, acredita que o networking é uma das ferramentas que podem ditar o sucesso na carreira ou nos negócios e que o fracasso é o primeiro passo para o êxito, desde que se aprenda com ele.

O mentoring é uma das principais iniciativas do programa Connect to Success. Acredita que esta relação pessoal é particularmente eficaz a ajudar as mulheres empresárias a terem sucesso? Todos as iniciativas do Connect to Success (C2S) visam fortalecer e apoiar o crescimento das empresas detidas por mulheres, por diferentes meios, e todas são igualmente importantes. O mentoring de negócios do C2S pode ter um tremendo impacto porque as mulheres empresárias não estão a ser apoiadas por uma única pessoa, mas sim por uma equipa de gestores, cada um com a sua área de especialização (recursos humanos, marketing, finanças, etc.). Assim, a equipa de mentoring está bem preparada para corresponder às várias necessidades específicas que muitas das nossas empreendedoras enfrentam. Por muito talentosa que a equipa de mentoring seja, e por mais valiosas e perspicazes que sejam as suas orientações, a menos que haja uma forte relação pessoal entre a proprietária do negócio e os seus mentores, ela não vai sentir a paixão ou a confiança nos conselhos que recebe e não poderá (ou quererá) seguir as sugestões da equipa.

Teve um mentor em alguma fase da sua vida profissional? Só quando a minha empresa já tinha cerca de 15 anos de existência é que tive um mentor. Tive a sorte de ser selecionada como mentee por grandes empresas norte-americanas para os seus programas de mentoring de negócios. Pela primeira vez, eu estava a trabalhar o meu negócio e não no meu negócio. Devido ao enorme impacto que este programa teve no crescimento da minha empresa, foi o que usei como base para desenvolver o programa de mentoring de negócios C2S.

Quais são as principais diferenças que encontra entre o ambiente de negócios para as mulheres nos Estados Unidos e em Portugal? A principal diferença é cultural e refere-se tanto a homens como a mulheres. Em Portugal, parece haver uma falta de autoconfiança e uma maior dose de atitude “eu não posso”. Nos Estados Unidos há uma atitude “Eu posso”. Nos Estados Unidos, mesmo que as pessoas não saibam “como”, dizem “Eu posso” e encontram uma forma de o fazer. Sem autoconfiança é excecionalmente difícil de lidar com a incerteza, que inevitavelmente existe quando se constrói um negócio. Além disso, em Portugal o fracasso é visto de modo negativo, apesar de que tantas pessoas de negócios excecionalmente bem sucedidas terem falhado, até mesmo várias vezes, antes de terem êxito. Isso resulta em falta de autoconfiança, de atitude “eu posso” e medo do fracasso, o que não permite que muitos empreendedores portugueses assumam os riscos calculados que são necessários para alcançar o sucesso.

Muitas mulheres me dizem que, porque o mundo empresarial é dominado por homens, as portuguesas precisam ser “menos femininas” para alcançarem posições de liderança ou grande sucesso nos negócios. Não concordo com este sentimento. Um dos elementos mais importantes para o sucesso, independentemente do seu sexo, é ser autêntico – permanecer fiel a quem se é. A mulher deve abraçar a feminilidade, se isso é importante para ela. Não há nada de errado, ou inconsistente, numa mulher de negócios bem sucedida que gosta tanto de ler a Vogue como a The Economist.

Não há nada de errado, ou inconsistente, numa mulher de negócios bem sucedida que gosta tanto de ler a Vogue como a The Economist.

Por que há tão poucas mulheres nos Conselhos de Administração e como empresárias bem-sucedidas? Uma das razões por que existem tão poucas mulheres nos conselhos pode estar relacionada com a carga tradicionalmente desproporcional de responsabilidades familiares que recai sobre as mulheres e com o facto de que as políticas e práticas de recursos humanos, muitas vezes, não considerarem este peso desigual. Tradicionalmente os homens também têm tido maiores oportunidades de networking e de formação e, consequentemente, têm mais autoconfiança e acesso a oportunidades de crescimento. Além disso, embora 48,6% da força de trabalho em Portugal seja constituída por mulheres, apenas 27,4% estão em posições de liderança. As mesmas razões por que existem tão poucas mulheres nos Conselhos de Administração também explica por que 75% das pessoas em posições de liderança nas empresas são homens.

Dito isto, há estudos que provam que as empresas são mais rentáveis ​​ e conseguem recuperar mais rapidamente de períodos de recessão económica quando incluem mulheres em posições de liderança. Mais, como cerca de 80% dos consumidores de produtos e serviços são mulheres, faz sentido que elas devam estar envolvidas nas decisões principais sobre a forma como esses produtos são desenvolvidos ou esses serviços são oferecidos. Quando gestores e administradores entenderem os benefícios económicos da igualdade de género para os seus negócios, o ritmo de mais mulheres em cargos de liderança deverá acelerar.

networking ou “construir relações” é essencial para o seu sucesso profissional.

Qual o papel do networking para o sucesso? O networking ou “construir relações” é essencial para o seu sucesso profissional. As pessoas que encontramos, e com quem construímos relações, em grande parte determinam as nossas oportunidades futuras.

Quais são os hábitos dos bons networkersEu acho que um bom hábito é conhecer as histórias das pessoas e tentar estabelecer uma conexão, independentemente da sua posição atual ou de quem são. Um dos hábitos mais importantes dos bons networkers é pesquisar antecipadamente para as suas reuniões. Antes de se encontrarem frente a frente, tire partido do LinkedIn e do Google para ter uma ideia de quem essa pessoa é. Interesses ou experiências compartilhadas podem ajudar a estabelecer uma ligação. Mas igualmente importante é o que acontece depois de uma reunião. A chave para transformar uma simples reunião num contacto significativo e duradouro está em dar acompanhamento e demonstrar apreço pelo tempo concedido.

Pensa que os portugueses têm esta atitude? Não sei o suficiente sobre os hábitos de networking dos portugueses para poder comentar. O networking nos Estados Unidos é excecionalmente valioso, mas também pode ser extremamente demorado, e nem todas as reuniões levam a algum lugar. Estes obstáculos podem desencorajar algumas pessoas de procurar ativamente oportunidades de networking; no entanto, isso não deveria acontecer. É preciso apenas uma boa reunião para conduzir a uma grande oportunidade.

Qual é, na sua opinião, a chave para uma carreira de sucesso? Um dos elementos mais importantes para o sucesso, além de trabalho duro, assumir riscos calculados, e ir mais além, é a persistência e ser “genuíno” – permanecer fiel a quem você é.

No escritório de advocacia senti a desigualdade de género e o assédio sexual.

Como é que a Kim se tornou empreendedora? Quando tinha 16 anos, foi-me diagnosticada disgrafia, o que prejudica seriamente a minha capacidade de escrever e processar informações. A disgrafia é uma dificuldade de aprendizagem que muitas vezes afeta as capacidades motoras finas. Como resultado de minha dificuldade de aprendizagem, quando eu estava no secundário informaram os meus pais que eu nunca iria para a Universidade. Com persistência e apoio de uma família encorajadora, eu nunca desisti e licenciei-me em Direito. Quando comecei a carreira jurídica, trabalhava para uma agência do Estado, depois como associate num grande escritório de advocacia de Boston e, mais tarde, como conselheira geral para uma empresa de recuperação de serviços financeiros.

Em todos estes três ambientes, esperava-se que eu trabalhasse da mesma forma que todos os outros, o que era impossível, dada a gravidade do meu problema de aprendizagem. Além disso, no escritório de advocacia senti a desigualdade de género e o assédio sexual. Percebi que a única maneira de ter sucesso profissionalmente e de me sustentar financeiramente seria a criação de um ambiente de negócios não tradicional, em que eu pudesse processar de melhor forma as informações, minimizar a minha necessidade de escrever e não tivesse de lidar com um ambiente de trabalho hostil por causa do meu género. Ironicamente, foi a minha dificuldade de aprendizagem e as dificuldades por que passei como mulher profissional numa firma de advogados predominantemente masculina, em conjunto com o potencial que identifiquei na indústria de recuperação de ativos, que me levou a começar a minha empresa, a TLSG, há 22 anos.

Deve ser difícil de gerir a sua empresa em Boston e, ao mesmo tempo, desenvolver projetos como o Connect to Sucess, além de todas as funções de representação que, enquanto embaixatriz, desempenha em Portugal? Como consegue fazer tudo?  Não é fácil, e devo dizer que, provavelmente, cerca de 75% do meu tempo é passado a trabalhar. Mas este é o equilíbrio que funciona para mim porque mais importante do que o tempo que tenho para desfrutar longe do trabalho é a qualidade desse tempo. Além disso, o Connect to Success é o projeto mais gratificante em que já trabalhei. A possibilidade de pegar em todas as oportunidades que me foram oferecidas na minha vida e devolvê-las passando-as a outras pessoas e a imensa satisfação que recebo ao assistir ao crescimento dos negócios das mulheres envolvidas, como resultado da Connect to Success, é a melhor recompensa.

Qual é o seu mais precioso conselho para uma jovem empreendedora? “O fracasso com o qual aprendeu é o primeiro passo para o sucesso”. Muitos dos empreendedores mais bem sucedidos que conhecemos, já fracassaram, e muitas vezes mais de uma vez, antes de atingirem o sucesso.

Os números do C2S

Em menos de um ano, o Connect to Success (C2S) tem mais de 300 mulheres empresárias registadas. “O número e a qualidade das candidaturas que recebemos para o programa têm sido esmagadores, tal como o interesse demonstrado pelos workshops práticos de negócio”, afirma Kim Sawyer. O programa de mentoring empresarial do C2S foi a primeira iniciativa a ser lançada. Hoje 24 das maiores empresas em Portugal estão envolvidas no mentoring de 28 mulheres. “É mais do que o número de empresas que apoiam empreendedoras num programa semelhante no nordeste dos Estados Unidos”, congratula-se a promotora da ideia. No Programa de Consultoria MBA/Master, 15 mulheres estão a ser apoiadas por grupos de estudantes das escolas de negócios Católica Lisbon School of Business and Economics, ISCTE Business School, MBA Lisboa, Nova SBE, Porto Business School. Está previsto ser oferecido de novo durante o segundo semestre e também na primavera de 2016. Em conjunto com as escolas de Gestão da Católica e do Porto, bem como o Barclays e a L’Oréal, o C2S realizou quatro workshops para um total de cerca de 430 participantes.

 

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