A Corte Francesa serviu de inspiração a outros monarcas, nomeadamente, a D. João V. o nosso Rei-Sol, que adoptou o cerimonial e o luxo franceses. Cognominado o Magnânimo também pelo uso que fez do ouro e diamantes provindos do Brasil, na construção do faraónico conjunto arquitectónico constituído pela Basílica, Palácio e Convento de Mafra, onde trabalharam 25 mil operários durante cerca de 20 anos e, que representou a concretização de um sonho e o cumprimento de uma promessa.
Também a construção do Aqueduto das Águas Livres, com 60 quilómetros de comprimento, que veio trazer água a Lisboa, é de sua responsabilidade, sob pressão da contínua falta de água principalmente na parte ocidental da cidade. Foi considerado, então, por um jornal de Paris, a mais sumptuosa empresa do género daquele tempo. Para construir o Aqueduto houve que recorrer a subscrição pública, na cidade de Lisboa, como Imposto Real da Água lançado pelo rei para o efeito. Um monumento de impressionante grandiosidade. A maior ponte de pedra do mundo, que tem também o maior arco em ogiva, de todo o planeta e que, por esse facto, se encontra no Guiness.
Na época Joanina espalharam-se pelo país, outras obras de menor vulto: palácios, muitas igrejas de talha dourada, azulejos e mármores. Nobres e burgueses mandaram erigir também os seus palácios e solares, representativos da sua prosperidade.
A este luxo exterior correspondia uma vivência de fausto e ostentação na Corte: grandes tapeçarias decoravam as paredes, rico mobiliário, cristais, objectos de prata maciça, porcelanas da China, tudo isto conferia brilho aos aposentos e à mesa do Rei-Sol português. O clero e a nobreza, isentos de impostos e a quem o povo pagava dízimas, vestiam-se esplendorosamente, com rendas, veludos e cetins ornados de jóias. Festas, profanas e religiosas, representações teatrais e musicais, (ópera e concertos), cortejos, autos de fé, procissões, espectáculos a que assistiam todos os grupos sociais e, muitas vezes, o Rei, constituíam a oportunidade e o cenário privilegiado para a exibição de tamanha pompa.
O clero controlava a Inquisição, o tribunal tenebroso que serviu para punir religiosos, cristãos novos e até políticos, que eram condenados em Autos de Fé, a que assistia, certamente com deleite, um público numeroso e heterogéneo. Esta aliança entre o poder temporal e espiritual manifestou-se na grandiosidade da Embaixada ao Papa Clemente XI , liderada pelo Marquês de Fontes. D. Rodrigo de Menezes que a preparou durante três anos. Foi de tal monta a sumptuosidade da mesma que, durante muitos anos não foram enviadas mais embaixadas, por outros reis por não se atreverem ao confronto. Outras embaixadas a Viena de Áustria, Paris e Países Baixos, igualmente, muito luxuosas, tiveram lugar no seu reinado.
Monarca absoluto, D. João V que nunca reuniu as cortes, pairava acima de tudo e de todos, satisfazendo, sem limites, as suas fantasias e desejos, pelo menos no apogeu do seu longo reinado. Enquanto as classes privilegiadas, clero e nobreza viviam em abundância a baixa burguesia e o povo definhava. Então, o Rei demonstrava também o seu poder através de benesses. Ouvia os súbditos, três vezes por semana, através de audiências. Ao sábado eram concedidas aos nobres, que tinham o privilégio de falar de pé com o Rei. Nos outros dias eram reservadas a todos: nobres e vilões, ricos e pobres que falavam ajoelhados. Nessas audiências havia uma cesta com moedas de ouro, que o rei distribuía pelos seus súbditos mais desfavorecidos.
O luxo de Madre Paula de Odivelas
D. João V foi também magnânimo para a sua amante mais célebre, Paula Teresa da Silva e Almeida, (1701-1768), que adoptou o nome religioso de Madre Paula de Odivelas, de quem teve vários filhos. Alheio ao escândalo da relação, concedeu-lhe avultadas tenças reais e, bem assim a todos os seus herdeiros e sucessores. Ordenou que lhe fosse construída uma residência “cujo interior era digno da magnificência do rei do ouro” . Assim era a popularmente designada “Torre de Madre Paula”, atingida pelo terramoto de 1755 e demolida em 1948, por ameaçar ruína. Na Biblioteca Nacional de Lisboa existe um manuscrito anónimo que dá conta do esplendor dos seus aposentos: abundância de prata, como “ ainda não se viu”, ouro nas cortinas e nas borlas dos cortinados, assentos de veludo amarelo, móveis, espelhos, oratórios, “leito de moda”com santos de ouro maciço e relevos, arcas de roupa valiosíssima. Madre Paula banhava-se numa banheira de prata maciça, que pesava 3580 onças, dourada por dentro e por fora, que deslumbrou a corte de Londres quando D. João V a encomendou. Uma onça corresponde a 28,35grs. Servida por nove criadas, Madre Paula viveu sumptuosamente, mesmo após a morte de D. João V, até ela própria falecer aos 67 anos. Encontra-se sepultada na Casa do Capítulo do Convento de Odivelas.
Outros capítulos de “A deslumbrante história do luxo”
Capítulo 1. Introdução: tudo o que luz é luxo
Capítulo 2. Paleolítico: o luxo espiritual
Capítulo 3. Antiguidade: o luxo torna-se ostentação
Capítulo 4. Esbanjar para impressionar
Capítulo 5. Idade moderna, paixão por antiguidades
Capítulo 6. O luxo das amantes e do champanhe
Capítulo 7. O brilho da corte do rei Sol
Capítulo 8. As mulheres e amantes de Luís XIV
Capítulo 9. As mulheres que brilharam na corte do Bem Amado
Capítulo 10. Maria Antonieta, Madame Déficit