Ver para querer

Estamos a assistir a um volte face na razão que levou ao nascimento das redes sociais, isto é, a partilha massificada de conteúdos pessoais, perante uma audiência mais ou menos generalizada, consoante as preferências de quem publica. Entrar em conversação, dar a conhecer os momentos marcantes, partilhar sentimentos ou artigos, suscitar a discussão, afirmar pontos de vista, etc…

Toda esta panóplia de conteúdos tem um ponto comum, independentemente da rede social utilizada e do tipo de mensagem: é que a mesma era criada pelo próprio e partilhada com a sua “audiência”.

No entanto, não há nenhum retrocesso na recorrência às redes sociais, antes pelo contrário. De todo o tempo em que estamos online, 50% estão dedicados às redes sociais, isto é, mais 40% desde o início da corrente década, correspondendo a 25% do tempo em que estamos em atividade.

Paralelamente, é sabido que são os conteúdos de imagem, e sobretudo vídeo, que têm crescido exponencialmente, precisamente porque são os que mais captam a atenção e interesse dos utilizadores, ou para consumo próprio (de tempo) ou para partilhar com os pares.

Até aqui, nada de novo, pois esse já era o caminho traçado pela imprensa e televisão, nas quais a dinâmica da imagem, do som, da foto e do vídeo prevalece sobre a notícia densa, confusa, longa e maçuda. O germinar dos podcasts, das revistas repletas de imagens, dos debates sobre os debates ou da notícia em direto são a expressão disso mesmo.  O que o TikTok trouxe de grande novidade às redes sociais da Meta (Facebook, Instagram ou Threads), for dar-lhes alimento para perceber que era através do vídeo que se desenhava o formato da comunicação do futuro.

Talvez esse excesso de produção (dos outros) tenha contribuído para algum comodismo geral, uma vez que nos últimos 3 anos, o número de utilizadores que publica as suas próprias notícias caiu de 40% para 28%.

Sendo assim, onde está o volte face?  Ele dá-se porque se os utilizadores não fabricam os seus próprios conteúdos, alguém o fará por eles. São as marcas e os algoritmos da inteligência artificial que não só “fabricam” conteúdos, como os otimizam a adaptam ao perfil de cada um de nós. É o número de visualizações e partilhas que alimenta o algoritmo e torna a mensagem cada vez mais frequente e atrativa, rentabilizando o investimento das marcas.  Já agora, cerca de 60% dos utilizadores fazem scroll contínuo aos vídeos que se vão sucedendo.

Para além de ser mais cómodo aceder rapidamente aquilo que é colocado online por outros, sobretudo vídeos, imagens, citações, textos ou reflexões há uma razão mais forte para esta alteração de paradigma. Ela deriva do facto de que as redes sociais estão sujeitas ao comentário, como se de um leque de moderadores (avaliadores) se tratasse. E nem sempre os comentários vão no sentido pretendido pelo emissor, com exposição também pública da posição antagónica.

E qual tem sido o caminho procurado para a exposição das opiniões e posts próprios? São precisamente os circuitos mais fechados de comunicação, em grupos restritos e escolhidos, como no Telegram ou WhatsApp. O bate papo que esteve na génese das redes sociais mudou de trajetória e moveu-se para fóruns mais restritos: os grupos que escolhemos, onde todos temos um denominador comum, somos identificados como fãs e onde não há intermediação. É precisamente aqui que se encontra o lastro que pode propagar um ponto de vista, uma história ou uma fake new.

Já não precisamos de ver para crer! Porque também já sabemos que nem tudo o que se vê tem credibilidade.

Vemos por uma simples razão: queremos!

 

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Publicado a 12 Fevereiro 2024

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