De nacionalidade Suíça, Anna Lenz está na Nestlé desde 2004, tendo integrado a equipa da Nespresso, em 2010, para assumir o cargo de diretora financeira no mercado italiano. Três anos depois, surgiu o convite para se mudar para a sede da Nespresso, em Lausanne, na Suíça, com as novas funções de Head of Corporate Controlling. Em junho de 2017, passou a acumular estas funções com a responsabilidade pelo mercado português. Como Market Director, a executiva tem agora pela frente a missão de reforçar a estratégia da Nespresso em Portugal, impulsionando o crescimento e desenvolvimento do negócio neste mercado, que é um dos mais exigentes. Fluente em 6 línguas, Anna Lenz tem um Master em Matemáticas, pelo Politécnico de Zurique, e um Executive MBA, da London Business School, ambos concluídos com especial distinção.
Qual o futuro que idealizava para si quando estudou Matemática?
Eu estudei Matemática porque gostava de números e lógica e queria aprender mais sobre isso. Foi uma escolha feita pelo puro prazer de entender. Tive um professor muito bom no liceu que despertou esta curiosidade em mim e acabei, também, por gostar imenso do que estudei na universidade. Nunca o fiz como uma “meta”, por achar que isso me levaria a alguma posição específica, e com certeza nunca imaginei que me levaria a Diretora de Mercado da Nespresso em Portugal.
Durante 4 anos, não vivi em lugar nenhum, mas tive a oportunidade de trabalhar em 29 países diferentes, onde conheci várias categorias de produtos e muitas instalações do Grupo.
Qual foi o seu primeiro emprego?
Desde jovem trabalhei enquanto estudei. Entre os 16 e 24 anos fui “bartender”, e aí descobri o prazer de servir clientes e ter consumidores satisfeitos ou até mesmo surpreendidos pela positiva, pelo nível de serviço. Foi aqui que descobri também várias marcas e sistemas de café, e onde aprendi muito sobre café e a fascinante combinação entre café e leite. Na Suíça, bebem-se muitas receitas de leite e eu tinha que prepará-las todas à mão. Nessa altura, nem sonhava que hoje existiria uma máquina (como a Aguila da Nespresso) que pudesse preparar uma receita de forma tão simples, e muito profissional, enquanto preparava todos aqueles cappuccinos à mão… O meu primeiro trabalho, depois de ter terminado os estudos, foi na Auditoria Operacional do Grupo Nestlé. Durante 4 anos, não vivi em lugar nenhum, mas tive a oportunidade de trabalhar em 29 países diferentes, onde conheci várias categorias de produtos e muitas instalações do Grupo: desde fábricas, até centros de distribuição ou sedes de vendas. Além disso, esta experiência permitiu-me conhecer diferentes culturas, trabalhar em vários idiomas e, também, fundir amizades que perduram até hoje!
Qual o segredo para evoluir na carreira quando se trabalha há 14 anos no mesmo grupo?
Não me parecem 14 anos! O grupo Nestlé é tão grande, está presente em tantos países e em tantas categorias que, mudar entre eles, parece quase mudar de empresa. Auditar uma fábrica de leite em Moçambique não tem nada a ver com fazer análises em excel na Suíça ou falar de café com a Executiva em Portugal. Eu gosto de mudança e de novos desafios – não consigo imaginar ter ficado no mesmo país e na mesma divisão da Nestlé por tantos anos. Ainda existem muitos países onde não vivi e negócios que mal conheço, por isso, ainda sonho com o meu futuro nesta empresa.
Trabalhar em diferentes países permitiu-me aumentar as posições para as quais a empresa me poderia considerar.
Em que medida trabalhar em 4 países diferentes impactou a sua carreira? O que de mais importante aprendeu em cada um deles?
Ser “mobile” e trabalhar em diferentes países é claramente um acelerador de carreira. Isso permitiu-me sair da minha zona de conforto, aprender várias maneiras de ver o negócio, alargar o meu network e, também, aumentar as posições para as quais a empresa me poderia considerar. Trabalhar pela Nespresso em diferentes países permitiu-me, por um lado, apreciar a força tão global desta marca mas, também, como nos podemos e devemos adaptar às formas de comprar e beber café em cada país. Encontrar esse equilíbrio – de alavancar um produto e uma marca internacional e de os adaptar localmente – é um dos grandes desafios desta posição.
Nos países onde vivi, também aprendi sobre a cultura de cada um. Por exemplo, como se tomam as decisões – em Inglaterra, antes de uma reunião onde se deve tomar uma decisão importante, vai-se beber um drink para conversar com calma, depois do dia de trabalho. Já em Itália, é o café logo ao início do dia com os colegas onde se sabem as novidades importantes e onde se podem influenciar decisões. Na Suíça, decide-se mesmo na reunião prevista para esse fim. Em Portugal, ainda estou a descobrir…
Qual o principal desafio que enfrentou na sua vida profissional?
Aos 29 anos fui promovida a diretora financeira da Nespresso Itália, um dos nossos grandes mercados. Ainda era nova, não tinha nenhuma experiência em liderar equipas, apesar da minha formação em Matemática complementada com um MBA, não tinha ainda um conhecimento sólido de Contabilidade nem de Controlo de Gestão e, a somar a tudo isso, ia mudar-me para um país novo com uma cultura que não conhecia. Foi um começo intenso, que também implicou mudanças na equipa, mas tive um chefe que confiou em mim e me deixou descobrir a nova função para poder tornar este desafio num sucesso.
Antes de vir para Portugal não dava entrevistas nem falava em grandes eventos. E é a primeira vez que lidero uma equipa de 500 pessoas.
É a primeira vez que lidera um mercado. Quais as principais mudanças que isso implicou na sua vida profissional e pessoal?
O trabalho sempre foi uma coisa importante para mim e uma das prioridades na minha vida. Tenho a sorte de ter um marido que sempre me apoiou neste caminho e que adaptou a sua carreira profissional para poder trabalhar nos diferentes países para onde fui destacada. Neste sentido, a nível pessoal mais uma mudança de país não significou uma mudança marcante, mas estamos conscientes de que tivemos muita sorte em termos sido destacados para um país tão bonito e onde toda a família (também temos duas crianças pequenas) percebe o idioma. Agora que aqui vivemos, entendo a razão pela qual Lisboa sai todos os dias na imprensa internacional como um destino turístico de eleição. Apesar de estar a viver em Lisboa desde o verão passado, ainda estou com o “olhar de turista” admirando a beleza da cidade.
A nível profissional mudou bastante, sobretudo em dois aspetos. A forte visibilidade que a Nespresso tem em Portugal e que, como consequência disso, a minha maior exposição – nunca antes dava entrevistas ou falava em grandes eventos. O outro é a equipa – já no passado geri equipas, mas nunca tinha liderado 500 pessoas. Isso dá-me uma grande responsabilidade mas, em simultâneo, um grande orgulho. Sinto que tive sorte, cheguei aqui e descobri uma equipa extremamente profissional e empenhada, com um alto nível de motivação, o que facilita imenso o meu trabalho.
Em Portugal a sua nomeação foi comunicada como ‘a primeira liderança feminina da Nespresso em Portugal’. Até que ponto a igualdade de género é uma prioridade na Nespresso?
Na Nespresso Portugal a equipa da direção é composta por 6 mulheres e 4 homens. Mesmo nos níveis de coordenação, temos um bom equilíbrio de géneros. Assim, mais do que ser uma prioridade, para nós é um facto. Pessoalmente, na minha carreira, nunca vivi qualquer forma de discriminação nem tratamento preferencial por ser mulher e acho que assim deveria ser em qualquer empresa.
Por ser um país pequeno, no meu tempo na sede mundial, na Suiça, nunca vi Portugal como um mercado “importante”. Só ao chegar aqui me apercebi da real força da marca.
O que mais a surpreendeu no mercado português?
Não sabia do peso que a categoria de café em cápsula tem em Portugal e a importância da Nespresso dentro dela. Por ser um país pequeno, no meu tempo na sede mundial, na Suiça, nunca vi Portugal como um mercado “importante”. Só ao chegar aqui me apercebi da real força da marca, da notoriedade que a Nespresso tem e do “carinho” que os portugueses têm por nós.
Quais os seus principais objetivos para a marca em Portugal?
Em Portugal tem-se verificado uma alteração na forma como se bebe café. Se há uns tempos o consumo de café se fazia quase em exclusivo no formato espresso, hoje temos muitos momentos em que a receita de leite, à base de espresso (como por exemplo um cappuccino), passou a ser a opção de muitos portugueses. Por isso, um dos meus objetivos para Portugal é poder proporcionar a todos os consumidores a derradeira receita de leite, de forma rápida, simples e com a qualidade de um barista. Todos sabemos que o momento da manhã é passado com o café e, nesta perspetiva, se um espresso merece um café de elevada qualidade, uma receita de leite não merece menos. A Nespresso, quando chegou a Portugal há 15 anos, mudou a forma de preparar um espresso, com a introdução da cápsula – e que hoje em dia nem se imagina não existir. No mundo das receitas de leite temos a mesma ambição e queremos mudar a forma como se preparam. Desta vez não com uma nova cápsula, mas através das várias opções de máquinas e acessórios que oferecemos e que podem ser usadas tanto no conforto de casa, pelos nossos consumidores, como fora do lar, através dos nossos parceiros.
Outro dos meus grandes objetivos é desafiar as empresas a olharem para o café como um verdadeiro benefício para os colaboradores. Os estudos mostram que no local de trabalho um bom café é percecionado como um importante benefício para os colaboradores e que isso os faz sentirem-se mais valorizados e motivados. Tendo em conta a realidade competitiva que o mercado de trabalho apresenta, esta é uma forma acessível para demostrar que a empresa se preocupa e pretende dar as melhores condições de trabalho aos seus colaboradores. Estudos efetuados em várias empresas demonstram que 43% dos colaboradores valorizam um bom café, mais do que um lugar à janela e, 68%, preferem um café de excelência, a ganhar 15 minutos extra de pausa de almoço. Do ponto de vista do canal HoReCa, o objetivo da Nespresso Portugal é salientar a importância que o café assume numa experiência gastronómica e que, por este motivo, não pode ser desvalorizado ou esquecido.
O café faz parte da experiência global que temos num restaurante ou num hotel, e tem que ser visto com essa importância. Até porque, normalmente, vem antes da conta! Para nós, é importante fazer tudo isto de forma sustentável – e é por isso que a Nespresso tem estado a trabalhar consistentemente na área de reciclagem. Para ser efetiva, a reciclagem tem de ser fácil para os clientes e parceiros com os quais contamos neste caminho. Para que isto possa acontecer, temos vindo a desenvolver soluções que permitem reciclar as cápsulas, com a mesma facilidade com que foram compradas – seja nas nossas boutiques ou através do estafeta que entrega uma nova encomenda – ou nos quase 300 pontos de reciclagem espalhados pelo país. Para os clientes profissionais oferecemos soluções adaptadas às diferentes necessidades de cada um. Com tudo isto, comprometemo-nos a duplicar a nossa taxa de reciclagem até 2020, com a meta de atingir os 30% de cápsulas recicladas. Mas, vamos ainda mais além – depois de recebermos as cápsulas, de separar a borra do alumínio e de reciclar o alumínio, fechamos o ciclo da reciclagem apoiando a nossa sociedade através do projeto “Reciclar é Alimentar”, em parceria com o Banco Alimentar de Ajuda Contra a Fome. Neste projeto, a borra de café retirada da cápsula é integrada num composto agrícola que irá fertilizar campos de arroz, posteriormente doado ao Banco Alimentar. Este é um projeto que muito nos orgulha, não só por ter nascido em Portugal, mas essencialmente porque, desde o seu início em 2010, já conseguiu mais de 430 toneladas de arroz, entregues a quem mais precisa.
Que conselho de carreira deixaria a uma jovem que está a entrar no mercado de trabalho?
Eu nunca fui de “planear” a minha carreira e nunca aceitei uma posição por acreditar que essa decisão me levaria a uma posição superior. Sempre aceitei as posições que tive pelo que eram, e por acreditar que iria gostar do que ia fazer e que isso iria acrescentaria valor à empresa, nesta posição. Esta minha convicção fez-me recusar posições “importantes”, por estar certa de que não iria ser feliz a desempenhá-las ou que não ia conseguir fazer um bom trabalho. Acho que desta forma mantemo-nos “abertos” para agarrar oportunidades que possam surgir e que nunca imaginámos serem possíveis. A acrescentar a isto, estar motivado, e gostar do que se faz, é uma força motriz muito grande para entregar, sempre, um melhor resultado.