Fez todo o seu percurso profissional na indústria automóvel, um meio que ainda é dominado pelos homens. A austríaca Viktoria Kaufmann veio para Portugal para liderar a SIVA e coloca a fasquia alta: quer pôr a empresa na rota do sucesso, tornando-a numa “grande, rentável e emblemática empresa em Portugal, tal como foi no passado”.
Licenciada em Ciências Aplicadas pela Universidade de FH-Joanneum, Mag. (FH), Styria, começou a sua carreira na Porsche Austria, em 2008, como responsável pelo desenvolvimento da rede e ainda pelo Departamento de Controlo de Vendas (de todas as marcas Porsche Áustria). Deixou a Áustria em 2012 para rumar ao Chile, onde integrou a Porsche Chile, como diretora de marca e líder do Departamento de Business Management. Em 2016 abraçou um novo desafio, desta vez na Colômbia, ao serviço da Porsche Colombia, como CEO Importador VW, Audi, Seat, Škoda. Desde 2019 que passou a integrar a SIVA – Sociedade de Importação de Veículos Automóveis, como diretora-geral. Uma responsabilidade que reparte com Pedro Almeida, situação que descreve como “dividimos o esforço e duplicamos a velocidade”.
Viktoria Kaufmann integrou o Programa de Desenvolvimento Interno da Porsche Holding (Basic Lead Development, Highline) e o Programa de Gestão Internacional de Marketing e Vendas da Volkswagen AG. Tem 35 anos e é casada. O marido acompanhou-a para o Chile, a Colômbia e agora para Portugal.
Nesta entrevista, em exclusivo à Executiva, defende que “não importa qual é o género, o que importa são os resultados no trabalho.”
Quais são os principais passos da sua jornada profissional, antes de chegar a Portugal?
Em 2007 comecei com um estágio na Porsche Holding Salzburg (PHS) – importadora de marcas do Grupo Volkswagen, onde recebi a minha primeira oferta de trabalho como assistente do diretor de marca da Volkswagen na Áustria. Depois disso, fiquei cerca de 5 anos a trabalhar na sede da Porsche, na Áustria, no Departamento de pesquisa de mercado, a gerir o desenvolvimento da rede de concessionários e no Controlo de vendas da Porsche Áustria.
Quando é que assumiu a primeira posição ligada à gestão?
Em abril de 2012, como diretora do Departamento de Controlo de vendas da PHS, na Áustria.
Como evoluiu a sua carreira desde então?
No final de 2012, parti para o Chile – primeiro como gestora de projeto quando assumimos o controlo do importador Porsche Chile com as marcas do Grupo Volkswagen e, nos últimos anos, geri o Controlo de vendas e a Rede de concessionários.
Em março de 2016 comecei como diretora-geral da Porsche Colômbia – a importadora das marcas do Grupo VW, com um total de 116 colaboradores.
Quando desejamos crescer profissionalmente na nossa empresa, devemos – pelo menos uma vez – trabalhar no exterior antes de conseguirmos isso.
Porque escolheu ou aceitou o desafio de uma carreira internacional?
Gosto de desafios, de conhecer novas pessoas, novas culturas e isso tudo vem com uma carreira internacional. Desde o início, como estagiária, tive sempre o objetivo pessoal de me tornar diretora-geral e sabia que, quando desejamos crescer profissionalmente na nossa empresa, devemos – pelo menos uma vez – trabalhar no exterior antes de conseguirmos isso. E, para mim, tornou-se mais do que um must trabalhar internacionalmente, agora faz parte do que eu realmente adoro no meu trabalho.
Quais os traços de personalidade que é preciso ter para ser um bom diretor fora do país de origem?
Acho que precisamos de ter uma mente aberta, sermos sociáveis (para construir relacionamentos de forma mais fácil) e também corajosos, com forte foco nos negócios. É preciso um esforço grande para começar uma vida num novo ambiente, com novas pessoas, novos sítios. Mas, o que também é muito importante é a capacidade de escutar atentamente o que nos rodeia. Inteligência emocional, coaching e competências motivacionais são determinantes para nos ligarmos mais rapidamente às pessoas e entendermos as suas necessidades. Mas o mais importante: permanecermos fiéis a nós mesmos e sermos confiáveis.
As pessoas são sempre o fator de sucesso da empresa. Podemos superar quaisquer obstáculos e desafios com a equipa certa, se as pessoas estiverem do nosso lado e nos apoiarem.
Esta é a sua terceira missão fora do país de origem. O que aprendeu das duas anteriores?
Primeiro, o que funciona na Áustria – o país de origem da PHS – não é necessariamente o mesmo do que noutros países estrangeiros. Precisamos de ouvir – e fazer muitas perguntas – e entender primeiro as circunstâncias e o ambiente local antes de agir. As pessoas são sempre o fator de sucesso da empresa. Podemos superar quaisquer obstáculos e desafios com a equipa certa, se as pessoas estiverem do nosso lado e nos apoiarem.
Como e porque é que surgiu a oportunidade de vir para Portugal?
Foi em novembro de 2018, quando o CEO da PHS nos visitou na Colômbia e me perguntou pessoalmente se gostaria de aproveitar a oportunidade de ir para Portugal e trabalhar na SIVA como diretora-geral, juntamente com o meu colega da equipa local, Pedro de Almeida. Estava há quase 3 anos na Colômbia e há quase 7 na América do Sul, senti que estava na hora de voltar para a Europa. Também devido à minha experiência como diretora-geral na Colômbia, onde aprendi um idioma semelhante (castelhano), foi uma oportunidade natural para mim.
Qual é a sua missão como líder da SIVA em Portugal?
A minha missão pessoal como líder é proporcionar aos nossos profissionais um ambiente de trabalho excelente, motivador e confiável, do qual todos se orgulhem de fazer parte. Quero desafiá-los a alcançar novos níveis de compromisso e, é claro, ajudar a desenvolver cada profissional individualmente. Eu quero que nós – como SIVA – nos tornemos num local de trabalho atraente para os atuais funcionários e os próximos que venham a integrar a empresa.
Os nossos principais desafios passam por colocar a SIVA novamente no caminho de uma grande, bem-sucedida, rentável e emblemática empresa em Portugal.
Quais são os principais desafios em termos de negócios?
Os nossos principais desafios agora passam por colocar a SIVA novamente no caminho de uma grande, bem-sucedida, rentável e emblemática empresa em Portugal, como já foi no passado. Também pretendemos alcançar o top-3 das empresas de distribuição da PHS a nível mundial.
Isto significa “dar um novo fôlego” às marcas do Grupo VW: Volkswagen, Volkswagen Veículos Comerciais, Audi e Škoda. Trabalhar na imagem das marcas e na confiança que os nossos clientes depositam nelas. Mas, claro, também envolve um trabalho muito focado com a nossa rede de concessionários para recriar um clima de confiança e de cooperação.
Estou a conhecer cada um dos colaboradores pessoalmente e visitarei todos os nossos concessionários em Portugal.
Quais as principais mudanças que fez ou está a planear fazer?
Há muito a ser feito; mesmo estando aqui há apenas dois meses, tenho algumas ideias muito claras sobre o que quero fazer.
Quero entender o nosso negócio em Portugal, como o mercado funciona, ouvir o que é necessário, fazer muitas perguntas, conhecer todos. Quero investir nos nossos colaboradores – neste momento, estou a conhecer cada um deles pessoalmente. Quero investir nas nossas grandes marcas e no relacionamento com a nossa rede de concessionários e com os nossos parceiros do Grupo Volkswagen. E quero crescer novamente com as nossas marcas no mercado português.
As principais mudanças serão a implementação da cultura, valores, pensamento e maneira de agir da PHS. Um plano claro – que já está decidido – é implementar novos sistemas de TI (Tecnologias e Informação) provenientes da PHS. E visitarei todos os nossos concessionários em Portugal para ter uma imagem clara da situação atual e das necessidades de agir em conformidade.
Aprendendo português, também é mais fácil construir relacionamentos com quem me rodeia.
Como se adaptou a uma equipa que não conhecia e num ambiente externo?
Para ser muito sincera, fui recebida de forma calorosa pelos colegas portugueses. Mas, é claro, os períodos iniciais trazem sempre algum tipo de incerteza para os dois lados: os colaboradores a receberem um novo diretor e eu a receber uma nova equipa para gerir. Agora, a prioridade para mim é, passo a passo, transformar essa incerteza em certeza. Isso só pode ser feito ao conhecermo-nos melhor e ir gerando confiança uns nos outros. E aprendendo português também é mais fácil construir relacionamentos com quem me rodeia.
Como é composta a sua equipa em termos de género, idade e formação académica?
Na SIVA temos 280 pessoas a trabalhar com uma idade média de 44 anos e 30% de mulheres na equipa. A senioridade média é de 14 anos de permanência na empresa, o que significa que temos pessoas muito experientes e com um grande conhecimento do negócio. Mais de 50% tem formação universitária.
O meu colega Pedro e eu complementamo-nos, o que traz uma nova e inovadora mistura na gestão da SIVA.
Do seu ponto de vista, o que trouxe para a gestão da SIVA?
Penso que trago uma nova visão sobre o negócio; um ponto de vista feminino e quero trazer para a SIVA um novo espírito para essa mudança em que estamos inseridos. Quero transmitir proximidade, empreendedorismo, espírito de equipa de trabalho árduo e internacionalidade. Quero desafiar e desenvolver as pessoas. Penso que o meu colega Pedro e eu nos complementamos, o que traz uma nova e inovadora mistura na gestão da SIVA.
Como é trabalhar com a liderança partilhada por dois diretores-gerais?
Esta é a forma como a PHS se organiza em todos os países e acho que a empresa tem muito a ganhar com essa estrutura de gestão. Como numa “bicicleta tandem”, dividimos o esforço e duplicamos a velocidade. E não consigo imaginar uma combinação melhor do que dois profissionais experientes, homem e mulher, a gerir este negócio.
Como numa “bicicleta tandem”, dividimos o esforço e duplicamos a velocidade. E não consigo imaginar uma combinação melhor do que dois profissionais experientes, homem e mulher, a gerir este negócio.
Como se sente num setor dominado por homens? Pode contar alguma história em que se tenha sentido descriminada? Como respondeu ou lidou com a situação?
É habitual perguntarem-me isso e é totalmente normal, pois a indústria automóvel é muito masculina.No meu caso, devo dizer que me sinto totalmente à vontade e não me considero uma mulher a cumprir “quotas”. Tenho uma autoconfiança saudável, sei quais são os meus pontos fortes e também sei que estou a fazer o meu trabalho pelo menos tão bem quanto os meus colegas homens, apenas de uma forma diferente. O “estilo feminino” é talvez mais emocional, mas é definitivamente mais orientado para as pessoas.
E sei – pelos resultados e números – que estou a fazer o meu trabalho muito bem. Não importa se somos homem ou mulher – se amamos o que fazemos, fazemo-lo da melhor maneira possível e é isso que conta.
Especialmente neste ramo, as mulheres não são vistas automaticamente para posições de liderança, por isso dê nas vistas: conseguindo ótimos resultados, com motivação e ambição de ser a melhor, com competências de trabalho em equipa, mas mantendo-se humilde e simpática.
Um conselho para uma jovem executiva com o objetivo de ter uma carreira na indústria automóvel?
Normalmente, não faço distinção entre homens e mulheres, pois acho que não importa qual é o género, o que importa são os resultados no trabalho. Se eu puder dar um conselho a jovens mulheres executivas, já que a indústria automóvel precisa definitivamente de mais mulheres, seria: saiba o que realmente deseja e não desista do seu objetivo. Seja corajosa e autoconfiante, não deixe que os primeiros obstáculos a derrubem logo no começo. Especialmente neste ramo, as mulheres não são vistas automaticamente para posições de liderança, por isso dê nas vistas: conseguindo ótimos resultados, com motivação e ambição de ser a melhor, com competências de trabalho em equipa, mas mantendo-se humilde e simpática. Se assim for, só precisa de estar pronta para aproveitar as oportunidades quando elas surgirem.
“O meu marido mudou-se comigo para Portugal. Ele também esteve comigo no Chile e na Colômbia, sempre a apoiar-me.”
Que rotinas adquiriu em Portugal que não tinha até agora?
No período da manhã e da noite falo muito com a minha família e com os meus amigos ao telefone, tendo em conta que agora tenho mais tempo, ao guiar todos os dias do centro de Lisboa para a Azambuja. E passei a comer mais peixe agora do que na minha vida inteira, e estou a começar a gostar muito.
Sentiu algumas dificuldades na adaptação à cultura portuguesa?
De modo algum. Penso que Portugal é a melhor maneira de voltar da América Latina para a Europa. É um começo tranquilo ao estar novamente no mundo europeu, com um forte espírito latino. Os portugueses são muito gentis, abertos, prestáveis, o que eu realmente gosto muito.
Do que mais gosta em Portugal?
Gosto das excelentes paisagens, do clima ameno, da comida e, claro, das pessoas.
Do que gosta menos em Portugal?
Creio que vou precisar de mais tempo para descobrir isso.
O que há de melhor em Portugal, do que noutros lugares?
Pastéis de nata e Cristiano Ronaldo.
O que é melhor nos outros países onde trabalhou?
Na Colômbia: variedade de paisagens e climas num só país e a música típica. No Chile: esquiar mesmo ao lado de casa, em Santiago (fez-me sentir na Áustria) e “Palta” (abacate).
A sua família mudou-se consigo para Portugal? Como se têm adaptado?
Sim, o meu marido mudou-se comigo para Portugal. Ele também esteve comigo no Chile e na Colômbia, sempre a apoiar-me de uma maneira excelente e sou-lhe muito grata por isso. Ele também se está a adaptar muito bem, sobretudo agora, desde que encontrámos o nosso apartamento e sentimo-nos, dia após dia, cada vez mais confortáveis e mais em casa!
Quais são os seus passatempos?
Gosto de viajar muito, conhecer o país, e aqui é ótimo porque pode-se viajar de carro para qualquer lugar. Gosto de praticar Ioga, mas continuo a procurar um bom lugar em Lisboa para começar de novo, e gosto de surfar – ainda estou a aprender – e o facto de estar em Portugal é uma vantagem. E passar tempo com minha família e estar com minha sobrinha dado que agora a posso visitar com mais frequência na Áustria.