Regras de etiqueta a observar, religiosamente, num funeral

Este é o tema de que ninguém deseja falar, mas a verdade é que um funeral é uma cerimónia que se rege pelas regras de etiqueta social e exige um cuidado acrescido no que respeita ao nosso comportamento.

Joana Andrade Nunes é consultora de protocolo, etiqueta e comunicação.

Pela sua natureza, os eventos fúnebres trazem consigo uma carga emocional inegável e o cuidado com cada detalhe que envolve estas cerimónias — visando espelhar o respeito pelos mortos —  está inscrito na história da Humanidade. Se as cerimónias fúnebres de altas entidades são pautadas pelas regras de protocolo oficial — e, como tal, não serão tratadas neste artigo —  as cerimónias privadas regem-se pelas regras de etiqueta social. Ambas representam, contudo, um momento de dor particularmente sensível que implica um cuidado acrescido no que respeita ao nosso comportamento. Para que a nossa presença, as nossas palavras — e o nosso silêncio — não sejam considerados ofensivos pela família do defunto, é fundamental saber o que dizer, o que não dizer e como estar — ou se deveremos estar presencialmente. Conheça as regras de etiqueta num funeral.

 

Quem pode estar presente

 

Contrariamente ao que sucede num funeral de Estado — em que só pode estar presente quem tem um convite — é fundamental confirmar com o(s) membro(s) da família mais próximo(s) se será adequada a nossa presença no velório, na missa de corpo presente e/ou no funeral.

Se um funeral aberto a toda a comunidade (isto é, não limitando a presença de quem pode estar presente) é a escolha de inúmeras famílias, há famílias que pretendem vivenciar este momento apenas com o núcleo mais próximo. Não há, assim, opções certas nem opções erradas; não devemos julgar a escolha da família, em particular quando não coincide com a nossa visão sobre o tema. Cabe-nos apenas confirmar qual o tom das cerimónias fúnebres e garantir que a nossa presença (ou a nossa ausência) são esperadas.

 

Como estar

Se, outrora, indicar qual a postura correta num evento fúnebre não parecia ser um tema, infelizmente, no século XXI, parece que se vai perdendo o respeito pelo defunto, e pela família que o vela, e o “bom senso” está em vias de extinção. Não raras vezes, assistimos a eventos fúnebres em que se contam “piadas” à porta da casa mortuária, em que se fala alto de qualquer assunto, em que se come, bebe e fuma, à porta da igreja, como se de uma festa se tratasse.  Respeitar o desgosto de quem acabou de perder um ente querido é fundamental e, como tal, comportamentos que não estejam em sintonia com a dor e sofrimento não podem ter lugar.

Independente de partilharmos ou não as convicções religiosas do defunto e da sua família, se escolhemos estar presentes em qualquer cerimónia fúnebre, temos o dever de observar, religiosamente, as regras do evento em questão. Nesta matéria, o respeito pela tipologia da cerimónia é absolutamente crucial. Tal não implica, por exemplo, que tenhamos de rezar a oração que está a ser rezada ou entoar os cânticos que vão ser interpretados; contudo, temos o dever de permanecer em silêncio — e com uma postura de reflexão — enquanto as orações e os cânticos são proferidos.

Um dos momentos particularmente marcantes nesta temática, é a apresentação dos pêsames no final da missa de corpo presente. Quantas vezes assistimos a “atropelos” e “empurrões” de quem entende ter o direito de ser o primeiro a cumprimentar a família enlutada que se encontra no banco da frente?! Sendo um momento particularmente sensível e de dor, a nossa conduta deve ser particularmente paciente, compreensiva e demonstrar respeito para com todos.

Por fim, e apesar de parecerem temas tão óbvios que nem necessitariam de ser mencionados, não posso deixar de mencionar o quão importante é o respeito pelo horário de cada cerimónia e o dever de ter o telemóvel em silêncio.

Infelizmente, também nesta sede, a falta de pontualidade é notória o que me faz, mais uma vez, reforçar este tema. Não há nada pior do que as entradas “sequenciais” quando uma cerimónia já está a decorrer. A porta que se abre; a porta que se fecha; a porta que se volta abrir e, de seguida, o ruído ensurdecedor da porta que se fecha novamente. Talvez quem não seja pontual, desconheça o quão desrespeitoso e ofensivo pode ser para a família do defunto…

Independentemente do teor da cerimónia, jamais deveremos ter o telemóvel com som: este deverá estar em silêncio ou modo de voo — não há nada mais constrangedor do que o toque do telemóvel durante uma cerimónia. Caso tenhamos necessidade de atender a chamada telefónica, pedimos licença e saímos para um lugar recatado: atender o telemóvel — “ainda que a sussurrar” — no local: jamais!

 

O que dizer (o que não dizer)

Este é, talvez, um dos temas que mais desconforto nos causa. Pessoalmente, sinto sempre que qualquer palavra que possa dizer nunca conseguirá confortar a família. Contudo, lembremo-nos que “ignorar” a família não apresentando as nossas condolências porque não sabemos o que dizer, não deve acontecer. Quando as palavras parecem não querer sair, o silêncio, de mãos dadas com um abraço amigo e genuíno, pode ser tão ou mais reconfortante.

Há, contudo, algumas frases “padrão” que são esperadas pela família:

“Um forte abraço neste momento de dor.”
“Lamento/lamentamos a perda de (nome do defunto).”
“Os meus profundos sentimentos.”

Numa versão de teor institucional, frases como

“Os meus/nossos sentidos pêsames / os meus sentimentos” são adequadas.

Por fim, ainda que proferidas com boa intenção, devemos evitar as seguintes frases pois podem não ser bem recebidas pela família enlutada:

“Foi melhor assim, pois deixou de sofrer.”
“Na vida, tudo acontece por uma razão.”
“Foi melhor ter partido, para todos.”
“Foi a vontade de Deus.”
“Tens de te manter forte” ou
“Não chores à frente dos meninos: tens de te manter forte!”

 

O que vestir

Dependendo do nível de formalidade do funeral — e/ou da vontade do defunto — a resposta a esta questão poderá variar.

Contudo, tendo em conta que, tradicionalmente, está em causa um evento formal e solene, é expectável que o traje de quem estará presente esteja em consonância.

Reza, assim, a tradição de que qualquer peça de cor viva e vibrante esteja completamente vedada. Um vestido/fato preto — ou azul escuro — sem esquecer de manter  os braços cobertos — é uma escolha adequada para nós, mulheres.  Para os homens, um fato escuro com camisa branca e gravata preta, é o traje  esperado.

Contudo, há cada vez mais famílias que pedem, especificamente, para não se utilizar preto e para os presentes se apresentarem com uma cor específica (muitas vezes, banco). Nesse caso, devemos respeitar as orientações da família estando em conformidade.

 

O que levar

Na nossa cultura, continua a ser expectável enviar — ou entregar em mãos — uma coroa de flores, sempre acompanhada de um cartão onde apresentamos as nossas condolências.

Há, contudo, famílias que pedem, expressamente, para não ser observada esta tradição evitando o que consideram como “desperdício de flores”. Mais uma vez, o comportamento adequado é aquele que espelha o respeito pela vontade do defunto e da família enlutada.

 

Crianças num funeral?

Para terminar, uma palavra sobre um tema muitíssimo delicado que, dificilmente, encontrará uma resposta única. Tradicionalmente, as crianças estavam desoneradas de estar presentes em eventos fúnebres. Contudo, tudo dependerá da maturidade da criança e da relação da mesma com o defunto. Não raras vezes, estando em causa a partida de um avô ou a partida prematura de um progenitor, é fundamental que a criança possa dizer um último adeus e, assim, lidar com a perenidade da vida. Ser exposta, desde a infância, ao ciclo da vida — com bom senso e tendo em conta a maturidade da criança — é uma forma de aprendizagem que a ajudará, também, a crescer.

 

 

Joana Andrade Nunes é consultora de protocolo, etiqueta e comunicação, membro da Associação Portuguesa de Estudos de Protocolo, colaboradora no programa “Praça da Alegria”, na RTP 1 e autora da rubrica “Etiqueta Profissional”, na Executiva. Mestre e Licenciada em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, iniciou a carreira profissional como docente universitária nesta instituição e, até 2017, conciliou a atividade de docência com a prática de advocacia de negócios. Em 2014, foi distinguida com Menção Honrosa no âmbito do V Prémio Wolters Kluwer de Artigos Jurídicos Doutrinários. O seu livro Quatro Gerações à Mesa foi considerado o melhor livro de culinária de Portugal, pelos Gourmand World Book Awrads (2016) e o 3.º melhor do mundo, pelos gourmand World Book award, 2017. Desenvolve a atividade de consultoria e formação junto de prestigiadas equipas e organizações.

 

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