Nasceu em Lisboa em 1953. Aos 15 anos pertencia ao movimento associativo estudantil e nunca mais deixou de se interessar pela cidadania. Foi fundador do Instituto da Democracia Portuguesa, associação cívica criada em 2007 que esteve na origem do partido Nós Cidadãos. Doutorado em Filosofia, Mendo Castro Henriques é professor da Universidade Católica, onde foi também diretor do Gepolis, Centro de Estudos de Filosofia e Cidadania, entre 1994 e 2004. Autor e coautor de 12 títulos publicados em Portugal, Brasil e França e de 110 artigos, dedica-se aos estudos de filosofia política e filosofia da consciência e é um especialista em Eric Voegelin e Bernard Lonergan. Neste texto elege as mulheres que mais o marcaram.
Mulheres de família
Começo por minha mãe, Maria da Graça. Não precisei de concordar com tudo o que dizia para a admirar pelas suas convicções fortes de justiça social e abertura ao mundo, pela importância que dava aos livros e à leitura, organizando feiras do livro e revistas, e pela irradiação em movimentos religiosos. Ainda bem que retomei os seus exemplos, depois das voltas que a vida dá. À minha ama, Evangelina, fiquei a dever muito carinho e atenções. A mãe dos meus filhos que sempre se esforçou por lhes incutir ternura. Na minha irmã, Ana, vejo a âncora da família alargada. Na minha filha, Teresa, vejo o sonho de educadora. E em minha segunda mulher, Nazaré, encontro todo o apoio para as nossas lutas e estudos comuns e o exemplo de quem quer transfigurar o mundo num sentido mais inclusivo. É a mulher da minha vida pelo que nela me reconheço. E o muito mais que tenho a dizer sobre a Nazaré não cabe em prosa.
Françoise Hardy, ídolo da juventude
Face aos estilos compulsivos das estrelas de música pop nos anos 1960, na minha adolescência, Françoise Hardy já era diferente. Era um trovador feminino cantando o amor e outras coisas simples, com uma voz quente e simples, e com a orquestra na mão, sob a forma da sua guitarra. Teria sido minha namorada virtual. Mas como ela não me ligou, eu tive de me pôr a caminho e procurar alguém cuja companha transmitisse a mesma presença adorável. A carreira e a vida de Françoise Hardy mantiveram-se sempre equilibradas, apesar de ter de aturar o “meu rival” Jacques Dutronc (grande intérprete). E ainda bem que continuam juntos.
Joana d’ Arc, heroína
Outra francesa, neste caso fora de moda. Uma jovem extraordinária que aos 18 anos mudou os destinos do seu país. As biografias que li em miúdo, até aos filmes de Dreyer, Rosselini e Luc Besson e à Oratória de Claudel e Honegger revelam o mesmo que a historiografia confirmou: Joana d’ Arc realizou o impossível por entre as suas contradições místicas e guerreiras, numa época e numa função em que a mulher era desprezada. De certo modo, ela foi a grande gestora que, com eficiência, eficácia e coragem cumpriu a missão de libertar a França. Por outro lado, foi uma mulher que mostra como o sonho comanda a vida…. E a morte, também… Porque foi ela a decidir que preferia ser executada a trair o seu ideal.
Hellen Keller, educadora
Assisti em muito pequeno à representação de O Milagre de Ann Sullivan no Teatro Monumental, levado pela minha mãe. Só muito mais tarde entendi tudo o que significava a luta de quem, nascendo cega e surda-muda, foi ajudada a libertar-se das trevas e do isolamento, através de um esforço persistente e através da ajuda de outra pessoa. Hellen conseguiu obter uma educação formal e tornou-se uma autora de marca e uma ativista de causas sociais. Os centros Hellen Keller atestam que a sua mensagem é duradoura. Mas a sua filosofia é que me marcou: somos todos iguais, mas todos mesmo, portadores de deficiências no corpo ou na consciência. O que conta é darmos a mão a alguém até sairmos dessas trevas.
Jane Jacobs, ativista
Pode não ser conhecida na Europa mas é uma referência em planeamento urbano, nos EUA e Canadá. Conheci o seu pensamento e ação através de estudos comparativos com o filósofo Bernard Lonergan. Foi uma autora e ativista política que ensinou que “a diversidade é a essência da excelência”; que por detrás da aparente desordem das cidades deve estar uma rede de vontades humanas que se harmonizam e nunca um planeamento guiado pelo mercado; e que dessa escolha depende a violência ou a qualidade da vida urbana. Em Morte e Vida das Grandes Cidades (1961) e outras obras denunciou os megaprojetos de reurbanização e a selva de betão. Enfrentou com êxito, em duras lutas, os grandes lobbies do imobiliário em Nova Iorque; Greenwich Village deve-lhe muito.