Texto de Maria Domingas Carvalhosa, CEO da Wisdom Consulting
Anualmente, a Transparência Internacional (TI) divulga o Índice de Perceção de Corrupção (IPC) o principal indicador de corrupção no setor público do mundo. Produzido desde 1995, o IPC avalia 180 países e territórios numa escala em que o 0 significa que o país é percebido como muito corrupto e 100 muito integro.
O Índice de Perceção da Corrupção de 2019, da Transparência Internacional, mostra que Portugal perdeu pontos face a 2018 (passou de 64 para 62), elevando para sete o número de anos em que permanece estagnado neste ranking (no 30º lugar, a par com a Espanha, o Qatar e as Barbados). O nosso país fica ainda abaixo da média da UE. Convenhamos que a situação não é propriamente muito brilhante.
Sendo que a questão da ética e da transparência dos poderes públicos é algo que me interessa e me mobiliza, este facto preocupa-me. É que ao fim de sete anos a ‘nadar na maionese´, esperava-se que os poderes públicos mostrassem alguma preocupação relativamente ao tema. Esperava-se que, no mínimo, tentassem igualar os níveis médios alcançados pelos restantes países europeus.
Para a seção portuguesa da Transparência e Integridade, o resultado obtido por Portugal reflete “a falta de reformas estruturais para o reforço da integridade no sistema político”, reitera a estagnação do país ao longo dos últimos sete anos no que diz respeito ao combate à corrupção e adensa a importância de ser adotada uma “verdadeira Estratégia Nacional contra a Corrupção”.
Um dos temas que regularmente a Transparência e Integridade levanta é a questão da regulamentação da Representação de Interesses Legítimos, vulgo Lobbying. De facto, quem, como eu, tem acompanhado, ao longo dos últimos anos, as várias tentativas do legislador para oferecer ao país uma eficaz regulação do lobbying ficará desolado. As legislaturas passam e esta nunca vê a luz do dia. E porquê?
É que deveria ser já um facto assente, pelo menos para todos os que acreditam que, numa sociedade democrática, os interesses privados podem e devem coexistir com os interesses públicos, que o Estado deve decidir e legislar com base no equilíbrio entre eles. E que, por uma questão de transparência, a representação de interesses legítimos deve ser regulamentada.
Na maioria dos países civilizados, mormente nos que apresentam baixas taxas de corrupção, a representação de interesses legítimos é uma realidade regulamentada. Ou seja, exigem-se boas práticas no relacionamento entre os representantes do interesse público e os representantes dos interesses privados e os processos são, ou devem ser, transparentes, ou seja, do conhecimento público.
Em Portugal, esta situação, tão simples à primeira vista, não é possível, E não é possível pelo facto de nunca gerar consensos. E eu não entendo porque não os gera. É que a ética e a transparência – ideologias à parte – deveriam ser iguais para a esquerda e para a direita. Será assim tão difícil de entender?
Durante muito tempo considerei, optimisticamente, em cada nova legislatura, que seria desta que a regulação da representação dos interesses legítimos seria publicada. Já não o faço. E com pena, já que os números mostram que merecíamos mais. Resta-me pensar que, neste tema, iremos continuar, orgulhosamente na cauda da Europa.
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