Lia Garcia é gestora de Marketing de Oncologia na Bristol Myers Squibb (BMS), em Espanha, e lidera o grupo BNOW-workforce (grupo que dentro da BMS está focado no desenvolvimento das carreiras, principalmente das mulheres, e no work life balance). Faz também parte do Extended Board do The Lisbon MBA Alumni Club, desde 2018.
Licenciada em Ciências Farmacêutica, desde 2000 que tem vindo a trabalhar no sector farmacêutico em áreas distintas, como o marketing, vendas, acesso ao mercado, área de ensaios clínicos, regulatório e consultoria. O MBA que fez na Católica Lisbon em 2007 (atual The Lisbon MBA Católica/Nova) permitiu-lhe assumir posições mais estratégicas e de liderança de equipas e preparou-a para trabalhar em outros mercados. Depois de uma experiência de cinco anos no Brasil, desde 2017 que lidera o marketing do mercado português na sua área de negócio a partir de Madrid.
Quais eram os seus planos de carreira quando terminou a licenciatura?
Quando terminei a licenciatura de Farmácia queria trabalhar na indústria farmacêutica e conhecer várias áreas dentro da indústria, para poder depois decidir onde me queria focar.
Também desde cedo, tive vontade de trabalhar em outros países. Tive a oportunidade de participar do programa ERASMUS, na Grécia, e fiz um estágio numa farmácia em Inglaterra durante a faculdade. Estas experiência contribuíram para despertar o interesse pelo mercado de trabalho fora de Portugal.
Senti muita curiosidade de poder fazer parte de uma empresa que estava a dar os primeiros passos.
O seu primeiro emprego foi numa empresa com pouco mais de um ano. O que a levou a fazer essa escolha e o que mais a marcou nessa primeira experiência profissional?
Na época, quando me foi apresentado o projeto da PharSolution, que é uma consultora na área farmacêutica, senti muita curiosidade de poder fazer parte de uma empresa que estava a dar os primeiros passos.
Foi sem dúvida uma experiência muito enriquecedora. Por um lado, como era uma startup tive a oportunidade de acompanhar a criação e o desenvolvimento de uma nova empresa, e por outro lado como era da área de consultoria tive a possibilidade de trabalhar em projetos distintos e ficar com uma visão um pouco mais abrangente da indústria.
Ainda que sempre no mesmo setor, trabalhou em seis empresas diferentes. O que de mais importante aprendeu em cada uma delas?
Apesar de serem empresas distintas, desde uma pequena empresa portuguesa até empresas de grande dimensão multinacionais, o denominador comum em todas elas foi perceber que o trabalho em equipa interdisciplinar é essencial para se conseguir bons resultados.
Fazer o MBA da Católica a tempo inteiro foi sem dúvida uma das etapas mais marcantes da minha vida, quer a nível profissional, quer a nível pessoal.
O que a levou a fazer o MBA seis anos após a licenciatura?
Desde que comecei a trabalhar percebi que tinha de investir na minha formação nas áreas de gestão e desde muito cedo decidi que fazer o MBA era um dos meus objetivos profissionais. Sabia também que era necessário ter experiência profissional para poder tirar o máximo partido do MBA, e por isso foi um projeto que nos primeiros anos no mercado de trabalho ficou “em espera”.
Realmente, não há a altura certa para tirar um MBA, mas houve uma fase da minha vida, perto dos 30 anos, em que após refletir no meu percurso profissional, decidi que não podia adiar mais esse projeto. Decidi sair da empresa onde estava na altura, para me dedicar 100% ao MBA. Hoje posso dizer que o MBA da Católica (atual The Lisbon MBA Católica|Nova) feito a tempo inteiro foi sem dúvida uma das etapas mais marcantes da minha vida, quer a nível profissional, quer a nível pessoal.
Qual o impacto do MBA na sua carreira?
A nível profissional, o MBA proporcionou-me novas valências no âmbito da gestão (muito mais abrangentes do que aquelas a que tinha estado exposta até aí) com conteúdos atualizados e alinhados com a realidade das empresas. O MBA desafia-nos a pensar de forma diferente e prepara-nos para um mundo em constante mudança, um VUCA world (Vision, Understanding, Courage, Adaptability), no qual “the change is the new normal”. Quando terminei o MBA, tive a possibilidade de começar a trabalhar em áreas mais estratégicas e em funções de liderança de equipas.
A nível pessoal também evoluí bastante, porque a interação e o trabalho diário num ambiente de grande diversidade (diferentes nacionalidades e provenientes de áreas profissionais muito distintas) contribuiu para desenvolver uma mentalidade mais aberta e estar mais predisposta a procurar novas formas de analisar as situações, assim como a aceitar novas ideias.
Quando e como surgiu a primeira oportunidade de trabalhar fora de Portugal?
Como referi, desde que saí da faculdade tinha interesse em trabalhar fora de Portugal para conhecer outras realidades, mas durante vários anos não consegui concretizar esse desejo. Quando pensava que já tinha passado a fase de tentar encontrar uma posição de trabalho no estrangeiro, surgiu a oportunidade de uma forma completamente diferente da que tinha planeado.
O meu marido teve uma proposta para trabalhar em consultoria estratégica no Brasil e eu acompanhei-o. Inicialmente fui sem nenhuma perspetiva profissional em vista, mas em pouco tempo comecei a trabalhar numa multinacional líder de mercado no Brasil, a Takeda, onde cresci muito profissional e pessoalmente.
É nestas alturas [quando mudamos de país] que a nossa capacidade de resiliência, mentalidade aberta e o networking fazem muita diferença.
O que equacionou antes de aceitar e quais os principais receios e expectativas que tinha?
Por um lado, tinha muita vontade de experimentar viver num outro país, mas havia vários receios e naquela época o maior para mim era mudar para um país e não conseguir arranjar trabalho.
Antes da decisão tentei recolher o máximo de informação sobre o mercado de trabalho e ativar o meu network, que poderia estar relacionado com o Brasil.
É nestas alturas em que a nossa capacidade de resiliência, mentalidade aberta (growth mindset) e o networking fazem muita diferença.
Como correu a adaptação ao Brasil e o que mais a surpreendeu na forma de trabalhar dos brasileiros?
A característica, que para mim é a mais marcante dos brasileiros é o seu grande otimismo, que lhes permite, em muitas situações, arriscar mais em novos projetos. Trabalhei com excelentes profissionais que desde o primeiro dia me ensinaram muito e me mostraram que há “sempre” caminho(s) para atingir os objetivos.
O grande desafio no Brasil é a burocracia. Muitas vezes deparamo-nos com situações em que para conseguirmos o documento A, precisávamos antes ter adquirido o documento B, e para obter o documento B precisávamos de ter marcado com 3 meses de antecedência.
Como acontece a mudança para Espanha e quais as principais diferenças que notou em relação aos dois mercados que já conhecia?
Ao contrário da mudança para o Brasil, que foi impulsionada por uma questão pessoal, desta vez foi profissional. Eu estava a trabalhar na Bristol-Myers Squibb em Portugal há 3 anos e a empresa ofereceu-me a oportunidade de ir para Espanha e ficar responsável pelo marketing da área de Hematologia para Espanha e Portugal.
Em geral, o mercado espanhol tem bastantes semelhanças com o nosso mercado, e para um português é fácil a adaptação.
A pandemia do Covid-19 está a mudar a forma de a indústria farmacêutica interagir com os profissionais de saúde.
Que áreas de negócio e que mercados tem hoje sob a sua alçada e qual a sua importância no volume de negócios e na quota de mercado da empresa?
Atualmente sou responsável pelo marketing da Oncologia de Portugal. Esta é uma área de forte crescimento no mercado hospitalar e é uma das principais áreas de negócio da Bristol-Myers Squibb (BMS).
Além disso, também estou atualmente a liderar o grupo “BNOW-workforce” para o mercado de Espanha e Portugal, que tem como objetivo contribuir para o desenvolvimento de carreiras e o “work life balance” dos empregados da BMS.
Quais os principais desafios que enfrenta hoje na sua área?
Agora enfrentamos um desafio significativo com a pandemia do Covid-19 que tem um impacto grande na saúde e na economia e que, no caso da indústria farmacêutica, está a mudar a forma de interagir com os profissionais de saúde.
Todas estas mudanças representam uma oportunidade para reinventarmos a nossa forma de trabalhar, para poder responder às necessidades atuais e futuras dos profissionais de saúde.
Para além da questão da pandemia, temos um desafio constante em Portugal que é o acesso aos medicamentos inovadores. Comparativamente a outros países da Europa (como Espanha), o tempo de introdução de inovação terapêutica é muito superior.
Qual foi o momento mais marcante da sua carreira e porquê?
Há dois momentos que marcaram a minha carreira profissional: o MBA e trabalhar no Brasil, que foi o meu primeiro contacto com uma realidade diferente de Portugal, no mercado de trabalho.
Ambos me desafiaram e me colocaram em situações totalmente novas, que seguramente contribuíram para o meu desenvolvimento profissional.
O que mais gosta naquilo que faz?
É um privilégio poder trabalhar numa área que está focada nos doentes e que oferece opções terapêuticas que contribuem para lhes dar mais tempo de qualidade para poderem estar com as suas famílias e amigos.
Além disso, gosto muito de trabalhar com pessoas que pensam de forma diferente e que nos desafiam, de forma positiva, a pensarmos “fora da caixa”.
Que conselho deixaria a uma executiva que ambicione uma experiência internacional?
Não desistir e ter coragem de conhecer o “desconhecido”.