A curiosidade pelo comportamento humano levou Filipa Ferreira à licenciatura em Psicologia e um primeiro emprego em Recursos Humanos ditou a sua ligação a esta área. Começou a carreira na Sonae, onde desempenhou várias funções, passou pelo Banco Carregosa e, mais tarde, pela Talkdesk — um dos unicórnios portugueses — onde criou a equipa global de Employee Experience, assumindo também a liderança estratégica de Recursos Humanos em Portugal. Há cinco anos, quando fez o Executive MBA na Porto Business School, Filipa Ferreira lançou uma empresa de consultoria e advisory, que é hoje o seu principal projeto, ao mesmo tempo que se dedica à investigação e à academia.
Formou-se em Psicologia e desde o início que dirigiu a sua carreira para os Recursos Humanos. O que a atraiu nesta área?
A formação em Psicologia foi uma escolha convicta: com uma forte curiosidade sobre o comportamento humano e confortável no que hoje sei que é a inteligência emocional, a minha atividade profissional teria que passar por trabalhar diretamente com pessoas e contribuir para o seu bem-estar. Num contexto de mercado exigente, marcado pela elevada taxa de desemprego ou trabalho precário, fiz a minha primeira candidatura e tive a oportunidade de assim iniciar o meu percurso na área de Recursos Humanos.
Hoje, olhando em retrospectiva para as diferentes etapas e multiplicidade de desafios que marcaram o meu percurso, encontro um denominador comum – o meu compromisso com um propósito significativo, impactando positivamente indivíduos e contextos reais de trabalho, sempre em alinhamento com uma forte ética profissional, humildade intelectual e convicção na responsabilidade pela construção de uma comunidade mais rica em valores e em resultados.
Quais as principais etapas do seu percurso profissional?
O meu percurso profissional iniciou-se na Sonae, tendo abraçado a cada dois anos novos desafios nas áreas Corporativas e de Retalho. Assumi, desde cedo, responsabilidades de gestão e liderança de áreas e equipas, tanto em áreas de desenvolvimento (como por exemplo Comunicação, Gestão de Talento, Liderança e Cultura), como em funções com uma forte ligação ao negócio como HR Lead. Tive, também, o privilégio de trabalhar na área da Saúde, como Diretora de Unidade de Negócio, desafio que destaco pelo desenvolvimento do interesse pela área de gestão.
Mais tarde, querendo conhecer novas realidades, setores de atividade e contribuir para a criação e partilha de conhecimento, aproximei-me da consultoria, academia e investigação. Destaco a experiência no setor da banca, em projetos de consultoria com entidades privadas e públicas, bem como a proximidade ao setor tecnológico, com ligação ao mundo das start-ups e scale-ups.
A paixão por este setor é inegável, tendo tido oportunidade de integrar a Talkdesk – um dos unicórnios portugueses – com responsabilidade de construir, de raiz, a equipa global de Employee Experience, assumindo também a liderança estratégica de Recursos Humanos em Portugal. Ainda que com menos tempo para me dedicar aos desafios da consultoria, investigação e academia, mantive nos últimos anos um percurso dual.
O interesse pela gestão, a vontade de diversificar e amplificar o meu enfoque na construção e partilha de conhecimento nos domínios da estratégia, talento, liderança e desenho de carreira, levou-me a tomar a decisão de investir a tempo inteiro no meu próprio negócio.
Estou dedicada à consultoria e advisory, conciliando com a área da investigação e academia, o que me permite ter uma proposta de valor completa, diferenciada e segmentada, capitalizando o domínio técnico e a experiência prática em diferentes realidades, a nível nacional e internacional.
Que mais-valia retirou de cada uma dessas experiências?
A oportunidade de já ter trabalhado em e com diferentes setores de atividade e empresas com diferentes níveis de maturidade de negócio e modelos de trabalho muito distintos é sem dúvida uma mais-valia para a minha realização profissional. Implicou, continuamente, a identificação de prioridades de negócio e a sua tradução em estratégia ágil de recursos humanos, obrigando à integração de vários domínios de conhecimento e uma forte capacidade de empreender, seja ao nível da construção de equipas como de criação de soluções.
A investigação e experiência na academia, desafia-me a conhecer tendências, realidades de trabalho distintas e a confrontar-me com diferentes perspetivas, que me fazem continuamente questionar e procurar saber mais.
Por fim, a contínua proximidade às pessoas é energia e direção – com um profundo respeito pelo perfil de cada um, procuro ter empatia e encontrar elos de ligação; e é essa conexão que orienta a minha ação, pautada pela consistência, pelo compromisso e por manter a verticalidade dos meus valores.
[Durante o MBA] foi fundamental manter uma forte disciplina e foco, clarificar lógicas de trabalho com os grupos em que nos envolvemos e “escolher as minhas batalhas”.
Porque decidiu fazer o MBA e porque escolheu a PBS?
Com formação de base e especialização é em Psicologia e, trabalhando eu na área de Recursos Humanos, sempre senti uma forte necessidade de conseguir compreender melhor o negócio, nas suas diferentes dimensões.
O meu interesse pelo domínio da gestão foi sendo, então, crescente ao longo da minha carreira, pelo que, aliando a vontade contínua de aprender, com a vontade de conhecer diferentes realidades e alargar o meu networking profissional, a escolha por fazer um MBA foi óbvia. A Porto Business School é uma escola de excelência, reconhecida nacional e internacionalmente, que me permitia também conciliar com uma atividade profissional no domínio da consultoria e proximidade à família.
Como conciliou o MBA com a vida profissional e pessoal?
Quando procurei fazer o MBA, quis criar condições, a nível profissional e pessoal, para conseguir fazê-lo com “espaço e tempo”: não procurava apenas beneficiar dos conhecimentos apreendidos em sala, mas queria claramente investir bastante mais em alguns domínios de conhecimento, capitalizar a oportunidade de desenvolver a minha rede profissional, curiosidade em investigar mais sobre alguns temas e espaço para estar a desenhar novos percursos.
O MBA é intenso, seja nos momentos formais de sala de aula, como nos momentos de trabalhos de grupo, envolvimento nas atividades propostas pela Porto Business School ou criadas por nós próprios. Foi fundamental manter uma forte disciplina e foco, clarificar lógicas de trabalho com os grupos em que nos envolvemos e “escolher as minhas batalhas”: obviamente houve momentos e áreas em que investi mais e menos, de forma consciente e consequente, nas diferentes dimensões da minha vida. Reconheço que foi basilar o suporte familiar, para conseguir ter o nível de entrega e dedicação que procurava neste projeto.
Qual o impacto do MBA na sua carreira e na sua vida?
O Executive MBA foi, para mim, um verdadeiro programa de transformação pessoal e profissional, assumindo-se como um momento privilegiado de crescimento, exploração de limites e oportunidades. Desafiou-me a conhecer-me melhor, desenvolver (novas) competências, alavancar a minha network e delinear possíveis percursos futuros, abraçando novas oportunidades e também dando um novo sentido aos desafios em que já estava a investir. Procurei, neste sentido, aproximar-me de novas cohorts de MBA, estando hoje também a dar o meu contributo como parte ativa desta comunidade.
Recordo-me de divulgar oportunidades profissionais “no café central”, “na missa” ou “na vizinha Espanha” porque já nessa altura era difícil atrair e recrutar talento, e do conforto que era, em tantos hotéis por todo o país, já conhecerem as minhas preferências.
Qual o maior desafio profissional com que teve de lidar e como o enfrentou?
Dependendo da “lente” com que olho e perspetivo o meu percurso profissional, encontro uma grande multiplicidade de desafios nas diferentes responsabilidades profissionais que fui assumindo.
Destaco, no início do percurso profissional, o desafio de trabalhar numa realidade em crescimento muito acelerado e na necessidade de cumprir objetivos em “contra-relógio”, obrigando-me a estar longe da família e amigos e a ter que sozinha percorrer Portugal de lés-a-lés, reinventando a forma de atrair, identificar os perfis certos para os desafios que tínhamos em mãos. Recordo-me de divulgar oportunidades profissionais “no café central”, “na missa” ou “na vizinha Espanha” porque já nessa altura era difícil atrair e recrutar talento e do conforto que era, em tantos hotéis por todo o país, já conhecerem as minhas preferências.
Mais tarde, o desafio da liderança, gerindo equipas, com dimensão significativa e uma grande diversidade de perfis, desde os meus 20 e poucos anos. O assumir de novas responsabilidades em áreas sobre as quais não tinha experiência ou conhecimento, nomeadamente na gestão, obrigando um forte investimento em aquisição de conhecimento, a ganhar coragem para conversar com diferentes pessoas mais experientes e a assumir riscos.
Também partilho o desafio de trabalhar com start-ups ou scale-ups, tendo construído equipas globais, em contexto remoto, com timezones muito distintas e em ambientes pouco estruturados, com um forte pendor de agilidade, inovação e experimentação, procurando manter o olhar no futuro – construindo -, ao mesmo tempo que estruturava e tornava mais eficiente o presente.
Assumi que nunca estava preparada para os desafios, mas sempre preparada para aprender. Trabalhei e liderei com energia, ousadia e capacidade para ultrapassar obstáculos, indo para além do óbvio na procura de soluções estruturantes, aceitando novas ideias, garantindo sempre um forte compromisso com os projetos e o interesse genuíno nas pessoas com as quais trabalhei.
Lecionar é um propósito e, ao mesmo tempo, um enorme desafio. A necessidade de me manter atualizada no domínio do conhecimento científico, nas tendências e práticas organizacionais a nível global, bem como a preparação dos momentos de contacto com alunos, considerando as suas experiências e perfis, é pedra base para uma experiência de aprendizagem diferenciadora, desafiadora e que possa promover mudança nos indivíduos e nos seus mais diversos contextos de atuação.
Qual o momento de que mais se orgulha na sua carreira?
Como já referi, tive a oportunidade de trabalhar em diferentes projetos que são motivo de orgulho: pela sua complexidade, pelo carácter inovador, pelo impacto e, ainda, pelo desconforto que tantas vezes estes projetos também geram.
Destaco o momento em que fiz uma mudança de percurso, confrontando-me com a vontade de tomar uma decisão mais arriscada, menos óbvia e convencional, numa lógica de poder alargar o meu portfolio de conhecimento e experiência. Esta foi uma decisão muito maturada, com dúvidas e incertezas, mas também um período extraordinário de descoberta, oportunidade para resignificar experiências, adquirir novos conhecimentos, desenvolver a minha rede de contactos e, desenhar possíveis percursos e “novos eus”. Foi, claramente, o momento em que reconheci a importância de trabalhar o desenho de carreira, sendo esta uma das áreas em que invisto atualmente ao nível de investigação e da consultoria.
Destaco ainda um momento particular na esfera pessoal e social. Em 2020, mãe de uma bebé de um mês, juntei-me desde o início à equipa de liderança do movimento Tech4Covid, iniciado por um conjunto de empreendedores que admiro e, juntos, com um número extraordinário de voluntários, demos vida em contrarelógio a um conjunto de projetos que, naquele momento, tiveram impacto na vida das pessoas e das empresas. Não foi fácil conciliar o papel de mãe com o papel de responsabilidade social que todos temos, mas foi, claramente, um motivo de grande orgulho e de crescimento pessoal e profissional. Foi, ainda, um momento de expansão do meu interesse na tecnologia e uma constatação que estarei sempre muito mais orientada para “a construção” de equipas e novas soluções, desde o desenho à sua implementação, numa lógica de forte proximidade e com necessidade de “arregaçar as mangas”.
Mais do que focar-me onde estarei daqui a cinco anos, estou certa de que o meu investimento nos próximos anos será na concretização deste salto para a construção do meu próprio projeto.
Qual o seu projeto profissional atual e que principais desafios lhe coloca?
Depois de cerca de 15 anos numa carreira corporativa e, nos últimos anos, na sua combinação com a academia, estou atualmente a empreender e focada na construção do meu próprio projeto, conciliando o investimento na área de consultoria e advisory com a ligação à investigação e à academia . Nestes domínios colaboro com a Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação, a minha alma mater, e dou aulas na Porto Business School ao Digital e Executive MBA, bem como em programas de formação executiva.
Dedico ainda parte do meu tempo ao voluntariado, onde sinto que tenho impacto com as minhas competências na área da educação e da psicologia.
Relativamente aos principais desafios, destaco o equilíbrio entre o risco e a oportunidade de empreender e trabalhar por conta própria e a articulação do desafio profissional com as outras dimensões da minha vida, mantendo a clareza e diferenciação (ou conciliação!) entre o que faço e o que sou.
Onde ambiciona estar daqui a cinco anos?
Mais do que focar-me onde estarei daqui a cinco anos, estou certa de que o meu investimento nos próximos anos será na concretização deste salto para a construção do meu próprio projeto. Continuarei a alimentar o meu interesse pela aquisição e diversificação de conhecimento, no trabalho com os indivíduos ao longo do seu ciclo de vida e na construção de novas soluções, “arregaçando as mangas” e mantendo-me próxima dos contextos reais, em modelos de colaboração flexíveis, segmentados e personalizados (por exemplo ao projeto ou numa lógica de Fractional HR), mantendo sempre a inquietude e um olhar crítico sobre a realidade. Quem sabe se até é neste horizonte temporal que alio um interesse com o “desejo tão reforçado pelos amigos” de vir a escrever um livro.
Conhecendo o meu perfil pessoal e profissional, irei certamente também abraçar projetos que não estavam nos meus planos, algo que me entusiasma, pois acredito que quem trabalha com pessoas e para as pessoas, tem que aceitar o imprevisível e o não esperado, impulsionando crescimento e mudança positiva.
Olhando, ainda, para a acelerada e disruptiva transformação que vemos no mundo, na sociedade, nas empresas e nas pessoas, é importante construir eficazes redes de colaboração com genuíno interesse em resolver problemas reais e que a evolução possa ser verdadeiro motivo de orgulho para nós e para as gerações futuras. O sentido de responsabilidade exige que a verdadeira transformação venha de dentro. Precisamos urgentemente de menos ego e mais eco, unindo pensamento, coração e mãos, para fazer acontecer. Quero, como até hoje, poder ser coerente no exemplo que dou às minhas filhas: a ética, os valores e os princípios devem ser inabaláveis quando trabalhamos em rede e vivemos em comunidade. A ousadia, o tom e o propósito certo, na mestria dos encontros, movem-nos: a nós e ao mundo.
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