Está o teletrabalho em vias de extinção?

Melhora o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, em alguns acasos até aumenta a produtividade e reduz custos às empresas. Mas muitas companhias que o defendiam estão agora a voltar atrás na decisão. Perceba porquê.

O isolamento e as suas consequências são as principais desvantagens de trabalhar a partir de casa.

Em duas décadas, os números do teletrabalho — que nos EUA não iam além dos 20% em 1996 — dispararam. Hoje, 60% das empresas norte-americanas permitem aos funcionários pelo menos alguma flexibilidade para trabalharem a partir de casa, segundo um inquérito feito este ano pela Society of Human Resource Management, ainda que 77% das empresas sondadas não disponibilizem o home office como solução a tempo inteiro. São sobretudo os profissionais com família a seu cargo que o consideram como uma solução “extremamente importante”.

As vantagens não são apenas para os trabalhadores; as empresas também poupam, sobretudo em despesas com instalações, energia e outras. Ao desocupar o equivalente a 540 hectares em espaço nos seus escritórios em todo o globo, a IBM terá poupado cerca de 2 mil milhões de dólares até hoje, segundo a revista The Atlantic. Em 2012 publicou um relatório onde referia o aumento da produtividade e a redução de despesas como as duas grandes vantagens deste regime. A empresa que revolucionou o teletrabalho há 38 anos, quando instalou os primeiros terminais remotos em casa de colaboradores, tem hoje 40% dos seus 386 mil funcionários em todo o mundo a trabalhar a partir casa. Prestava até serviços de consultoria neste campo a outras empresas que quisessem fazer o mesmo.

No entanto, a IBM e outras empresas norte-americanas, como a Yahoo e a Best Buy, estão a chamar de volta ao escritório os seus funcionários que trabalhavam a partir de casa. Ou pelo menos estão a repensar as suas políticas de flexibilidade total, incitando os funcionários a trabalharem mais no escritório do que em casa. Porquê esta súbita mudança de posição?

Problemas no desempenho

Algumas das desvantagens mais óbvias de trabalhar a partir de casa prendem-se com a performance dos funcionários. É mais difícil gerir colaboradores a funcionarem em regime de home office, monitorizar o seu desempenho e a qualidade do seu trabalho, corrigir a rota de um projeto que se desviou da meta inicial. E numa era em que chegar primeiro e com a solução mais eficiente é o mantra empresarial, perder tempo com estas questões, quando não se trabalha no gabinete ao lado do chefe de projeto, pode ser crítico.

Para quem passa a maior parte do tempo a trabalhar a partir de casa, a atualização constante de aptidões e conhecimentos, que acontece mais facilmente no quotidiano do escritório, é menos imediata, fácil e direta, bem como o incentivo para a formação e desenvolvimento de novas competências.

Team player ou lobo solitário?

A forma de trabalhar é, nos dias de hoje, mais baseada na colaboração entre profissionais com diferentes funções do que há duas décadas. Um estudo da Deloitte apurou que apenas 38% das empresas nos EUA estão organizadas por departamentos de trabalhadores com as mesmas funções e tarefas. A maior parte prefere hoje equipas multidisciplinares, que até podem mudar consoante o projeto.

Se o teletrabalho pode ajudar a melhorar a produtividade de profissionais que não dependem tanto da comunicação com uma equipa, como para um funcionário de call center — muitas empresas já optam por ter colaboradores a trabalhar a partir de casa — ou para um consultor independente, outras funções dependem da proximidade física, do esforço conjunto e da troca regular de ideias, que não se consegue fazer tão facilmente trabalhando a partir de casa, como escreve Jerry Useem no The Atlantic. Mesmo com ferramentas como a videoconferência, o email e os chats a ajudar. Atualmente, e em vários setores de atividade como os Serviços, os projetos implicam a necessidade de “eficiência colaborativa”, ou seja, de uma equipa a trabalhar lado a lado, no sentido de resolver um problema rápida e eficientemente.

Longe da vista, longe da comunicação

Ainda que as novas plataformas digitais tenham vindo facilitar a comunicação para quem trabalha à distância, essa mesma distância física parece funcionar como um “escudo”, inibindo os utilizadores de recorrerem a elas, dizem as pesquisas. Um estudo da IBM concluiu que, quando aparece um problema novo, os funcionários presentes no mesmo edifício de escritório trocam, em média, 38 comunicações no sentido de o resolverem, mas apenas 8, se trabalharem a partir de casa e longe uns dos outros. O factor “exposição” — trabalhar no mesmo edifício, ainda que em salas ou pisos diferentes — tende a aumentar a predisposição para responder mais rapidamente a emails e mensagens escritas ou tratar do assunto por telefone.

Os meios de comunicação também não são igualmente eficientes quando se trabalha à distância: telefone e videoconferência são mais imediatos e eficientes que emails e chats de empresa.

Não admira, por isso, que o isolamento seja um dos maiores problemas do teletrabalho e a principal queixa dos profissionais que optaram por ele. Para além das desvantagens para o networking e socialização, longe da troca de informação com os nossos pares a criatividade também pode sair a perder.

Hoje, a IBM — que há cinco anos enfrenta perdas sucessivas nas receitas— acredita que, ao trazer os funcionários de volta ao escritório, irá melhorar a sua produtividade, rapidez e criatividade, diz a Business Insider. Por isso, os espaços de trabalho estão a ser repensados para pequenas equipas multidisciplinares de engenheiros, programadores, diretores de projeto e designers trabalharem em proximidade, uns com os outros e com consumidores finais e clientes. Mas a empresa vai continuar a permitir alguma flexibilidade de trabalho remoto aos seus colaboradores, de modo a não prejudicar o tão almejado work life balance. Uma solução conjunta entre os dois sistemas de trabalho pode ser a mais flexível, onde todos podem sair a ganhar.

Outras desvantagens de trabalhar em casa:

Tantas ou mais distrações que no escritório: seja porque o vizinho faz barulho, os seus filhos estão em casa e não a deixam concentrar-se, o telefone toca ou a família decidiu aparecer. É preciso fazer esforços extra para não ser interrompida e deixar bem claro a todos que não está disponível durante aquele horário, tal como se estivesse no escritório.

— Não há horários: parece uma benesse (e é) mas tem os seus contras. Muitas pessoas que trabalham a partir de casa partem do princípio que, por não estarem sujeitos ao controlo constante de uma chefia no escritório, têm de compensar esta vantagem trabalhando mais, ou que se espera mais delas. Além disso, quem está do outro lado muitas vezes espera que, por estar em casa, o profissional esteja disponível a toda a hora, via email ou telefone. Aqui também há limites a serem estabelecidos.

É preciso ser muito autodisciplinada: seja para cumprir prazos, não se deixar levar por distrações, não misturar tarefas domésticas com tarefas laborais a meio do expediente, ou para continuar a sentir-se motivada sem o feedback de um superior, um mentor ou dos colegas.

— Ser esquecida numa promoção: Pode até ser a pessoa certa para aquele lugar, mas os colegas que estão em permanente contacto no escritório ganham em visibilidade, podendo lutar pela promoção de forma mais agressiva.

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