The Great Exhaustion

Todos os dias lemos, ouvimos, discutimos o efeito dos telemóveis nas nossas crianças. Existe até um novo movimento de regresso a equipamentos sem touch screen para miúdos, os bons velhinhos telefones que serviam aquilo para que foram criados: só fazer chamadas ou enviar SMS.

Andamos preocupados, e com razão, com o impacto que este mundo digital possa ter nos cérebros dos jovens, mas esquecemo-nos de que nós, adultos que aprendemos a escrever com papel e lápis, em quadros de ardósia, também estamos a experienciar stress profissional de tanto tempo em frente aos ecrãs.

Já falamos aqui sobre o tema Great Resignation, mais recentemente abordei o Quiet Quitting. Hoje, quero falar-vos do movimento Great Exhaustion.

No final de 2023 muitas companhias começaram a aperceber-se de que os seus trabalhadores estavam mais cansados do que o chamado normal. Mesmo a sua maioria trabalhando de casa (algumas empresas tentaram o regresso ao escritório, mesmo que parcialmente), a vida profissional como era antes da pandemia tinha deixado de existir, mostravam fadiga, esgotamento, estavam sem energia.

Tínhamos passado da Great Resignation para a Great Exhaustion.

Tentando perceber o que levava a este cansaço extraordinário, chegou-se à conclusão que este reflete o tempo que passamos em frente ao ecrã.

A Microsoft, por exemplo, verificou que os seus funcionários passavam mais de 60% do seu tempo em ferramentas de comunicação digital — e-mail, chat, vídeo-conferências —, sobrando apenas 40% para a “criação” durante o uso do Word, Excel ou Power Point. Aliás, o tempo em reuniões online tinha aumentado 250 % desde fevereiro de 2020. E se durante a pandemia estas ferramentas faziam sentido, a verdade é que o regresso à normalidade manteve esta exigência dos contactos online. Nada mudou quando tudo mudou.

Um sem-fim de novas mensagens, calendários cheios de reuniões marcadas que nos obrigam a saltar de um assunto para outro, debilitam-nos mentalmente, tiram-nos espaço para pensar e desviamo-nos dos objetivos realmente importantes. É isto a Great Exhaustion,

Se a isto juntarmos todas as novas aplicações que supostamente são criadas para nos ajudar, o problema agrava-se. Programas de gestão, de comunicação interna, de partilha de ficheiros, de recursos humanos, de formação, de introdução de despesas, de faturação e vendas, enfim, há inúmeras aplicações desenhadas por equipas multidisciplinares e que têm vindo a ser desenvolvidas e compradas pelas empresas. Mas isso tem um custo incrível para quem tem de trabalhar com elas. Numa empresa incluída na Forbes 500, de bens de consumo, calculou-se que para uma simples transação cada pessoa envolvida tinha de mudar 350 vezes entre 22 aplicações e websites. Durante o dia, cada empregado saltava 3600 vezes entre apps.

E se este é um caso extremo, a verdade é que nós mudamos entre sites, emails, chats, programas muitas vezes durante o dia. E o problema não é só abrir uma nova janela: o problema é que nós demoramos tempo a ajustarmo-nos ao novo sistema, à sua semântica, cores, objetivos. E é esse tempo de ajuste que nos drena a energia ao fim de tantas horas diante de um ecrã.

Lemos isto e pensamos: “Claro que temos de estar cansados!”. Quando olhamos para os nossos filhos e os vemos fazer scroll, a mudar de imagem cada segundo, anestesiados diante do ecrã, ficamos arrepiados. Mas nós estamos a fazer exatamente a mesma coisa.

Como tudo na vida, assumir o problema e olhar para ele seriamente é o início da busca de uma solução. A dúvida é saber se a maioria dos nossos líderes já se apercebeu disso mesmo.

Entretanto, estes minutos diante do Word e da página em branco a escrever este texto descansou o meu cérebro. Parece incrível, mas pensar ainda é das funções mais relaxantes para a nossa cabeça!

 

Inês Brandão é fundadora e Global Business Manager da Frenpolymer. Leia mais artigos de Inês Brandão.

Publicado a 05 Setembro 2024

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