Mundo digital: do Goodwill aos Resultados

Vivemos na era da dependência digital, que nos parece fazer esquecer que houve (e há) outro mundo no qual realizávamos uma percentagem grande das tarefas que executamos hoje. Não tão depressa, não tantas, não com tanta informação e opinião. É, por isso, que vivemos num mundo mais cómodo que nos permite ter acesso a qualquer tipo de informação e, em breve, aceder a qualquer bem ou serviço.

Dito isto, do lado dos consumidores que usufruem da comodidade da vida digital, tudo se tornou mais prático, fácil, interessante, diverso e rápido. É, portanto, uma etapa sem retorno no que respeita à criação de valor para os clientes.

E o que se passa do lado das empresas que assentam o seu modelo de negócio na lógica digital?

São as empresas do momento (aquelas de que quase todos somos clientes), têm uma dimensão como poucas tiveram até então e, sobretudo, representam valor económico através do seu goodwill, isto é, o seu valor de mercado. As taxas de crescimento anuais de algumas dos novos modelos de negócio digitais (ex: alimentação, saúde, serviços, turismo, transporte) chegam a atingir os 40% e a capitalização bolsita das mesmas não pára de crescer exponencialmente.

Mas será que há uma correlação clara entre o valor de mercado e a rentabilidade dessas empresas? A resposta é não! Por exemplo, se no retalho mundial, a rentabilidade média de vendas ronda os 5%, no comércio digital, a rentabilidade de vendas da grande maioria das empresas varia entre 1% e 2%. Aliás, este é um dos factores que explica que a Amazon tenha começado a alargar a sua oferta para o mundo não digital (ex. compra supermercados Whole Foods), o mesmo acontecendo com a Alibaba, com a aposta na cadeia de supermercados HEMA e que tem feito um casamento quase perfeito entre o digital e o real.

É verdade que os primeiros a desbravar o mundo digital como modelo de negócio,acumularam know howe mercado suficiente para garantir a sustentabilidade do seu negócio, mesmo sabendo que este assentava na diversificação para vários mercados relevantes. Tem sido assim desde que Jeff Bezos injecta os lucros da Amazon no próprio negócio, aumentando consecutivamente as áreas de intervenção da empresa, com uma projecção exponencial do seu valor. Recordemos que há precisamente 10 anos, uma acção da Amazon estava cotada a 77 dólares, enquanto que hoje atinge os 2.000 dólares. Para percebermos a dimensão do sucesso da marca, refira-se que atingiu lucros no primeiro trimestre de 2019, no valor de 3,6 mil milhões de dólares.

E são muitas as empresas que conseguem esses resultados? A resposta também é não! A grande maioria das plataformas digitais não conseguem atingir (por enquanto) o break even, em função dos mercados conhecerem cada vez mais concorrentes. E muitos daqueles que têm êxito no mercado, não geram receitas suficientes que permitam superar os investimentos e custos, necessários para operar de forma competitiva em qualidade de serviço e preço.

Mais ainda são os casos onde ainda não se obtiveram resultados positivos, apesar do valor de mercado atingir números impressionantes. O esforço gigantesco de investimento para estar presente à escala global, sem falhas, através do reforço contínuo do investimento em marketing e assegurar uma cadeira de valor que gere confiança, seja na entrega de um produto, na verificação de uma operação bancária, na reserva de um hotel, no mapa que nos guia pelas estradas fora, só é compensado pelo crescimento exponencial de vendas e da sua base de clientes.

Segundo a Economist, um levantamento junto de 12 empresas unicórnio (com valor superior a mil milhões de dólares) da área da tecnologia digital, evidenciou prejuízos acumulados de 14 mil milhões de dólares, num acumulado de 47 mil milhões de dólares.

Assim, o break-even da realidade digital é distante no tempo e requer persistência, coerência na estratégia, garantia da qualidade de serviço, preços competitivos, diferenciação face à concorrência e, sobretudo, capacidade para atrair investidores.

O sucesso de qualquer start up do mundo digital é o de criar um valor de mercado tão atractivo, ao ponto de vir a engordar um dos grandes tubarões digitais da Google, Amazon, Facebook, Apple ou Microsoft que, dia a dia, cada vez mais, dominam a informação, conhecimento dos mercados e consumidores, ao passo que alargam o seu portfólio de soluções.

Livro Recomendado: What’s Your Digital Business Model? Six Questions to Help You Build the Next-Generation Enterprise, Peter Weil, 2018

Publicado a 06 Maio 2019

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