As duas faces do valor: combinar sucesso em cliente com crescimento do negócio

É comum haver um conflito de objetivos empresariais entre a competitividade e a rentabilidade. Aumentar a quota de mercado exige investimento em processos, pessoas, tecnologia, comunicação, etc… que, a curto (ou médio) prazo, afetam a rentabilidade.

Este paradigma de prioridades também divide aqueles que se focam na criação de valor para os clientes (com a ambição de crescer cada vez mais), por contraposição daqueles que elegem a eficiência operacional (pelas sinergias e redução de custos) como a foco central do seu modelo de gestão.

Este artigo centra-se na necessidade de conjugar ambos os objetivos, isto é, na procura incessante de novas formas de criar valor e marcar a diferença face à sua concorrência, ao mesmo tempo que se captura valor para o negócio.

Na realidade, podemos encontrar pelo menos três domínios onde é possível marcar a distinção da oferta com e geração de valor: através do preço, do momento da compra ou do segmento do mercado.

Comecemos pelo preço e consideremos o exemplo do café, onde um pacote de 1kg custa aproximadamente 15 €. Agora migremos para a oferta de cápsulas de café: cada cápsula tem cerca de 7g de café, o que significa que serão necessárias cerca de 142 cápsulas para perfazer 1 kg. Vendidas no formato cápsula, uma caixa com 40 unidades custa cerca de 13 €, pelo que serão necessárias 3,6 caixas para perfazer 1 kg, isto é, despender perto de 46 €. É evidente que não se trata de uma comparação pura e dura entre a quantidade de café (um pacote não é uma cápsula e não tem os mesmo custos unitários), mas é um claro exemplo de diferenciação que, simultaneamente, vai ao encontro das preferências de comodidade do consumidor e capta um volume de negócios acrescido. Num modelo de negócio distinto, o racional da Netflix ou da Spotify é semelhante: flexibilidade, comodidade e recomendações, não pelo preço unitário, mas por uma assinatura. No final do dia, mais clientes satisfeitos e maior volume de negócios.

Outra forma de olhar para a captura de valor está relacionada com o tempo de vida útil dos clientes. Todos os negócios que implicam atos de recompra (a grande maioria), devem considerar o tema da fidelização como sendo estratégico.  Em muitos casos, o investimento na captação de mercado apenas é compensado ao longo da réplica de compras. Não é por acaso que algumas empresas optam por contratos de fidelização de 12 ou 24 meses, exatamente para garantirem que o break-even do investimento no cliente é ultrapassado ao longo do período. Mas este não é o exemplo ideal, porque não estamos necessariamente perante um processo de criação de valor para o cliente, mas de uma obrigatoriedade que lhe é imposta. Vejamos então a combinação impressora + toner ou aparelho de barbear + lâminas, com preços muito apelativos do hardware que são compensados pela recompra contínua de consumíveis, a preços menos convidativos. Na mesma linha, muitos setores de atividade (ex. automóvel) praticam preços de venda muito competitivos e fazem da assistência técnica pós-venda a centralidade do contributo para a captura de valor para o negócio.  A aposta em estratégias de cross selling com elevado grau de qualidade de serviço e eficácia, contribui decisivamente para otimizar o binómio rentabilidade-competitividade.

Nos vários exemplos anteriores, a captura de valor encontra-se dentro da base de clientes existente. Todavia, é comum identificar segmentos de mercado que não estão dispostos ou não podem pagar os preços atuais, mas demonstram interesse no produto ou serviço. Neste caso, deve entrar em ação a arquitetura de uma estratégia de marca. Marcas distintas dentro da mesma tipologia de produto ou serviço respondem por mercados relevantes distintos. São inúmeros os bons exemplos desta realidade, que provam saber conjugar a criação e captura de valor. Desde o grupo Inditex (Zara, Bershka, Massimo Dutti, Oysho, Pull&Bear, Stradivarius, Uterqüe ou Lefties) ao grupo VW (Volkswagen, Skoda, Seat, Cupra, Audi, Lamborghini, Bentley, Porsche ou Ducati), ou ao grupo Hilton com 24 marcas distintas de oferta hoteleira com diferentes propostas de valor. O maior erro que pode ocorrer nesta matéria é o de querer esticar a corda debaixo da mesma marca, gerando ambiguidade, uma imagem difusa e destruindo mercado.

Estes três caminhos não são mutuamente exclusivos, podendo e devendo suscitar abordagens combinadas. Esta categorização, desenvolvida através do simples reconhecimento de padrões, tem o objetivo de ajudar os executivos a refletir sobre formas de inovação na captura de valor, sem sacrifício da qualidade percebida junto do mercado.

 

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Publicado a 26 Novembro 2024

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