Foi durante a sua passagem pelo Brasil, enquanto frequentava o mestrado em Moda e estagiava na Osklen, que Ana Penha e Costa decidiu criar a sua marca: a +351. Ao ver as amigas lançarem negócios, percebeu que queria seguir o mesmo caminho e desenhar as suas peças. Na Osklen, marca com a qual sempre se identificou, aprendeu o processo de produção de vestuário, e, quando percebeu “que já sabia o suficiente”, decidiu regressar a Portugal com a certeza de que queria lançar a +351.
Quando criou a marca, em 2014, fez questão de conhecer de perto as fábricas onde a roupa da era produzida, tendo mesmo chegado a estagiar numa delas, “para compreender melhor todo o processo de produção e poder transmitir esse conhecimento à equipa”. Hoje a +351 conta com mais de 10 lojas: duas em Lisboa (São Bento e Chiado) e as restantes pelo mundo, mas o objetivo é “expandir”, para “o dobro ou o triplo”, refere Ana Penha e Costa.
Como surgiu a ideia de criar a +351?
Estava no Brasil a acabar o mestrado em Moda e a trabalhar na Osklen e via as minhas amigas a criar marcas próprias, que lançavam em pequenos eventos, mas que eram um sucesso porque os produtos esgotavam. Achei que se tivesse a minha marca também poderia ter sucesso. Como tinha imensa vontade de desenhar as minhas peças, aproveitei o facto de estar na Osklen a estagiar para aprender todo o processo de produzir uma peça de roupa. Quando achei que já sabia o suficiente, e porque também não adorei viver no Brasil, voltei para Portugal com a ideia do +351.
O que é que não gostou no Brasil?
Não havia segurança. Tive de mudar de casa três vezes. Fazia surf e não podia deixar a roupa na areia porque desaparecia tudo. Senti que em Portugal a minha qualidade de vida era muito melhor e se eu podia voltar e criar a minha marca de roupa, era perfeito!
Como é que se lembrou do nome +351?
Acho que foi pelas saudades que tinha de Portugal [+351 é o indicativo de Portugal]. Lembrei-me do nome quando estava a trabalhar na Osklen e percebi que queria que a roupa fosse toda feita cá porque a indústria têxtil portuguesa é ótima.
“Tive de começar a fazer as peças com tecidos que as fábricas tinham em stock, restos de coleção que não eram reutilizados. Nos intervalos das grandes produções conseguia fazer umas t-shirts aqui ou uns calções ali.”
Que passos deu na fase inicial do negócio?
Encontrei uma lista de fábricas num site sobre indústria têxtil em Portugal, enviei o meu currículo e o projeto da +351 às fábricas, e fui visitar ao Norte aquelas que me responderam, para conhecê-las e perceber o que é que ia conseguir fazer. O problema neste tipo de negócio e em começar “pequenino” é que são precisas determinadas quantidades de produto, e com pouca quantidade é difícil ter uma linha de produção. Tive de começar a fazer as peças com tecidos que as fábricas tinham em stock, restos de coleção que não eram reutilizados. Nos intervalos das grandes produções conseguia fazer umas t-shirts aqui ou uns calções ali. Na fase inicial do negócio também tinha peças de senhora, que eram feitas por costureiras aqui em Lisboa.
Como define o conceito das suas peças?
O conceito da minha roupa é ser confortável, ter um design simples e bonito, em que as pessoas se sintam bem e possam usar todos os dias. Hoje dedico-me mais às coleções de homem porque tenho mais facilidade em desenhar peças para eles e porque são clientes mais fáceis – quando gostam de uma peça compram em todas as cores. As roupas de homem são mais confortáveis do que as de mulher, mas tento que as minhas peças sejam unissexo.
É esse o target, unissexo?
Sim. As mulheres também compram as peças masculinas, e é por isso que já fazemos o tamanho XS. Mas pedem-nos tanto peças de senhora que, à partida, no próximo verão, vamos ter umas peças especiais para mulher, mas que vão ser apenas vendidas na flagship store, a loja do Chiado. Mas temos peças de senhora que estão sempre a vender, por norma são mais os básicos.
Qual foi o investimento inicial?
28 mil euros.
Quais as fases mais importantes da concretização deste negócio?
A fase mais importante foi quando abri a primeira loja, na rua Poiais de S. Bento, que é loja e atelier. Até ali só vendia online, por isso a abrir a primeira loja foi o meu primeiro contacto direto com os clientes, com pessoas que entravam, gostavam da marca e queriam comprar.
Onde vende mais: em loja física ou online?
Em loja física.
“É bom começar ‘pequenino’ e com um investimento pequeno porque temos de passar por todas as fases e saber um pouco de tudo acerca do nosso negócio. Já costurei e embalei peças, já tive de ir diretamente às costureiras na Amadora ou às fábricas do Norte, para conhecer as pessoas e perceber como é que as coisas funcionam.”
Que lições tem aprendido enquanto empreendedora?
É bom começar “pequenino” e com um investimento pequeno porque temos de passar por todas as fases e saber um pouco de tudo acerca do nosso negócio. Já costurei e embalei peças, já tive de ir diretamente às costureiras na Amadora ou às fábricas do Norte, para conhecer as pessoas e perceber como é que as coisas funcionam. Também estive um mês a estagiar numa fábrica para compreender melhor todo o processo de produção e conseguir transmitir aos outros o conhecimento adquirido. Acho que, enquanto empreendedora, é importante a relação que se cria com as pessoas.
As peças são desenhadas por si?
Sim, sou eu quem desenha toda a coleção. Mas o meu trabalho é 15% desenhar peças. Quando comecei não tinha formação em gestão porque a minha formação é em artes e design. Hoje, as faturas, as lojas, a gestão de pessoas e da empresa, ocupam-me o resto do tempo [risos].
De que modo é que as passagens pela Osklen e Billabong a ajudaram?
A Billabong foi importante porque quando acabei o estágio tive a certeza de que queria fazer mestrado em Moda, pois até aí só tinha estudado Design na generalidade. A Osklen porque sempre foi uma marca com a qual me identifiquei e acho que tudo aquilo que eles fazem é muito bem feito. Sempre quis ter as peças deles, achava que tinham bons materiais, que o design era bonito, e adorava a filosofia da marca. Perceber como é que trabalhavam e o conceito por trás da marca ajudou-me a criar o conceito da +351. Na verdade, não sinto que seja uma estilista. O que eu faço é roupa, é diferente. Não sou uma estilista que faça um desfile na Moda Lisboa, não é a marca “Ana Penha e Costa”. É simplesmente roupa fácil de usar, mas com design.
Ou seja, é funcional, sem descurar a estética.
Sim, mas não é tanto design de autor. Tem de ser fácil de usar. A maioria das roupas apresentadas em desfiles é muito conceptual. Até a Osklen fazia isso e depois adaptava as peças mais irreverentes para peças que dessem para usar no dia-a-dia.
“O que me inspira é o dia-a-dia, é estar na cidade e ao mesmo tempo estar na praia, são as viagens que faço, é ir às feiras conhecer outras marcas e ver o que é que estão a fazer. Inspira-me o que vai acontecendo.”
O que é que a inspira?
O meu estilo de vida. Finalmente cheguei a um ponto em que consigo quebrar a rotina, consigo gerir melhor o tempo. Se me apetecer ir fazer surf, vou. Ter uma rotina e poder quebrá-la, fazendo coisas de que gosto, é ótimo. Adoro fazer surf, jogar ténis e andar de skate, dá-me imenso gozo. O que me inspira é o dia-a-dia, é estar na cidade e ao mesmo tempo estar na praia, são as viagens que faço, é ir às feiras conhecer outras marcas e ver o que é que estão a fazer. Inspira-me o que vai acontecendo. Sem querer, ditar tendências é uma forma de criar tendências. As pessoas na rua também me inspiram, aquilo que os outros vestem, a mistura de culturas.
Qual a grande aposta da marca para o futuro?
Ganhámos o Portugal 2020 há dois anos e já nessa altura o plano passava pela internacionalização, por participar em mais feiras e vender mais para fora. Queremos continuar a fazer isso, mas também queremos apostar no online. Queremos que o e-commerce seja mais forte e vamos também tentar dinamizar essa parte com o marketing digital.
Mas já estão no internacional.
Estamos, mas queremos expandir ainda mais. Temos alguns pontos de venda, em cidades como Nova Iorque, Londres, Paris, Saint-Tropez ou Cidade do México, mas são lojas multimarcas. Neste momento, ao todo, penso que são 11, mas queremos o dobro ou o triplo.
“Ter uma loja física é super importante, até porque quando vamos às feiras as pessoas confiam muito mais na marca quando veem fotografias da loja, por exemplo.”
Qual é o seu sonho para a +351?
Adorava abrir mais lojas próprias, por exemplo, uma no Porto, outra em Madrid ou em Paris. Acredito que a marca tem identidade para isso. Entrar na loja da +351 é completamente diferente do que entrar numa loja multimarcas. Os nossos produtos estão lá à venda, mas não se conseguem logo identificar porque estão misturados com peças de outras marcas. Na nossa loja sente-se a identidade da marca, por toda a envolvência que a loja tem, a decoração, os materiais, os colaboradores. Há toda a uma experiência que se consegue sentir. Ter uma loja física é super importante, até porque quando vamos às feiras as pessoas confiam muito mais na marca quando veem fotografias da loja, por exemplo.
Que conselho daria a uma jovem empreendedora que quer lançar a sua marca de roupa?
Primeiro, o conceito por trás da marca tem de ser mesmo muito forte porque existem tantas marcas que é difícil destacar-se. Segundo, less is more, ou seja, se essa pessoa conseguir lançar um só produto, fazer várias variantes desse produto e correr tudo bem, é ótimo. Por exemplo, nas feiras, se uma marca só vender camisas, os buyers preferem comprar camisas dessa marca à minha, porque a minha coleção tem seis camisas no meio de tantas outras peças de roupa.
Sempre quis fazer uma coleção full look, mas se me tivesse focado apenas numa peça, provavelmente tinha tido mais sucesso, pelo menos a nível de vendas. É mais fácil vender só t-shirts e colocá-las em vários pontos de venda. Até a nível de produção conseguiria produzir numa escala muito maior se fosse só uma peça de roupa. A verdade é que vejo marcas que fazem isso e corre muito bem. A nível de criatividade pode ser um bocadinho menor, mas, se olharmos para as vendas, acho que pode correr muito bem.
Já pensou fazer isso na +351?
Sim, já tentei diminuir a coleção. Também tentamos fazer maioritariamente mais malha. Na coleção as peças têm todas o mesmo tecido, jersey. Pode ter várias gramagens, várias texturas, várias cores, mas tentamos utilizar maioritariamente esse material. É mais confortável, veste bem, e são as peças que mais saída têm na loja. Também tentamos reduzir naquilo que vendemos menos, mas ao mesmo tempo não queremos deixar de ter a coleção full look. Por isso continuamos a fazer as peças que se vendem menos, mesmo que seja em menor quantidade. E a produção é sempre 100% portuguesa, o que valoriza o produto. Para mim está fora de questão produzir lá fora.
Quero muito voltar a fazer coleção de senhora, mas é quase como se abrisse uma nova frente [risos]. A nível de feira, por exemplo, só vamos a feiras de homem, e mesmo que esteja a vender unissexo, a feira é direcionada para homem. Uma marca que seja unissexo que queira apresentar coleção de mulher tem de repetir a feira, ou seja, vai à feira de homem e dois meses depois à feira de mulher. Nós não podemos fazer isso porque trabalhamos com várias fábricas, cada uma produz com um tipo de material e por vezes há atrasos na produção. Além disso, fazemos as coleções com um ano de antecedência. Neste momento estou a trabalhar na coleção que vai ser apresentada em janeiro, que é a coleção do inverno do ano que vem. O que está à venda na minha loja já fiz há um ano [risos], por isso tenho de estar sempre muito atenta, mas também é um pouco de feeling.