Catarina de Almeida, luso-angolana, fundou a Pantest em 2014, com o objectivo de fabricar testes rápidos para fornecer o mercado angolano, onde tem uma empresa de distribuição de medicamentos e material hospitalar. O projecto cresceu e presentemente a Pantest é a única empresa portuguesa fabricante de testes rápidos e a líder de mercado na sua distribuição.
Diariamente, saem da fábrica de Oliveira de Frades 50 mil testes antigénio à SARS COV-2. Produz testes antigénio para o COVID19, mas também para outras doenças infectocontagiosas como malária ou o dengue, e marcadores tumorais, que exporta para países europeus e africanos. Mas neste momento, para dar resposta à elevada procura do mercado nacional, concentrou a produção no vírus pandémico e suspendeu as vendas ao exterior. A empresária tem planos para a robotização de alguns dos procedimentos, tem espaço para crescer e está disponível para contratar mais recursos humanos e, desta forma, aumentar a produção, assim existam no mercado as matérias primas necessárias à fabricação dos testes.
Detida a 100% por Catarina de Almeida, a Pantest é licenciada pelo INFARMED para fabrico de dispositivos médicos, incluindo dispositivos médicos in vitro, empresa certificada internacionalmente como Cumpridora das Boas Práticas Internacionais de Fabrico de Dispositivos Médicos, reconhecida pela ANVISA (autoridade sanitária brasileira) como cumpridora das Boas Normas de Fabrico e tem no seu portfólio mais de 30 testes rápidos com certificação CE, sendo que recentemente o teste rápido de coronavírus profissional da Pantest foi reconhecido em termos europeus como aceite internacionalmente para viagens.
Em Angola para além da empresa distribuidora de material médico e hospitalar, é também representante das tintas Dyrup, projecto ainda em desenvolvimento. E sonha com a primeira fábrica de testes rápidos neste país africano.
Nasceu em 1984 no Hospital Militar em Lisboa. Filha de um pai militar, de uma mãe dedicada a 100% à família e de um pai médico luso-angolano, foi a primeira criança em Portugal nascida por procriação medicamente assistida, facto de que apenas tomou conhecimento aos 27 anos. Hoje é membro activo de uma organização internacional de indivíduos concebidos por procriação medicamente assistida, tendo sido oradora em Genebra na ONU na celebração dos 30 anos da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, defendendo o direito ao reconhecimento e fim do anonimato da parentalidade biológica dos nascidos por procriação medicamente assistida.
Com uma vida tão ligada à actividade médica, surpreende que seja licenciada em Direito em 2007 pela Faculdade de Direito na Universidade de Lisboa, pós-graduada em Direito do Trabalho e da Segurança Social em 2009, pela Faculdade de Direito na Universidade Católica de Lisboa, pós-graduada em Business & Administration, em 2012, pela Nova Business School, mestre em Direito do Trabalho e da Segurança Social em 2012 pela Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa e doutoranda em Ciências Jurídico-Civis pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Acredita que a saúde deve estar disponível a todos, independentemente do seu poder económico, e a Pantest é prova disso mesmo: os testes rápidos permitem diagnóstico de várias patologias a preços acessíveis para todos, democratizando o acesso aos cuidados de saúde.
Mãe de um rapaz há 5 meses, divide o seu tempo entre Portugal e Angola, fazendo questão que o filho a acompanhe sempre que possível. É apaixonada por arte africana e pelos seus três cães.
É licenciada em Direito, mas apenas exerceu a actividade de jurista durante menos de um ano e meio. Porquê?
Sou licenciada em Direito, pós-graduada em Direito, mestre em Direito e doutoranda em Ciência Jurídico-Civis. Exerci advocacia durante pouco tempo, apesar de manter a minha inscrição activa. Jurista serei toda a vida. O Direito é, acima de tudo, uma área de conhecimento que nos ensina a pensar, a problematizar e a ter espírito crítico, ferramentas indispensáveis para a vida, qualquer que seja o caminho profissional que tomemos. A Faculdade de Direito (licenciei-me na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa) ensinou-me a pensar e moldou-me o carácter. Se eu vivesse novamente voltaria a tirar Direito.
No que toca à advocacia sempre a vi como uma passagem. Aprendi imenso com o Dr. Benjamim Mendes, de quem fui estagiária na ABBC (hoje DLA Piper), e por quem tenho uma gratidão enorme. Se a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa me ensinou a pensar e me moldou, o meu curto percurso pela advocacia ensinou-me a necessidade do rigor das palavras e a necessidade de sermos perfeccionistas e darmos o melhor de nós em tudo o que fazemos.
Como e porquê ingressou no mundo das empresas? Que experiências profissionais teve?
Quando deixei a advocacia estava numa fase em que não sabia o que queria, mas sabia o que não queria: ser advogada. O não sabermos o que é que queremos não é mau, pois temos um ponto de partida por exclusão. Numa das paredes de minha casa, tinha o Cântico Negro, de José Régio e como gosto imenso de ler, especialmente poesia, naquele momento aquele poema dizia tudo sobre como me sentia.
Eu não acordei um dia e pensei: quero ser empresária. Nem acho que seja empresária. Sou empreendedora, isso sim, e sempre fui. Gosto de imaginar e de fazer acontecer e a maior parte das vezes correr atrás dos sonhos.
Até que decidiu tornar-se empresária. O que a moveu nessa direção?
Eu não acordei um dia e pensei: quero ser empresária. Nada disso. Aliás, não me vejo como “empresária”. É estranho esse epíteto da mesma forma que sempre estranhei ser tratada por “Dra.”. Eu sou a Catarina, não são os títulos académicos ou a “catalogação” empresarial que fazem de mim o que quer que seja. Gosto de ser tratada por Catarina, gosto de rir, conduzir a minha Mahindra em Luanda e chegar a casa com as sandálias de 8.000kz [12,50 euros] que comprei na Ilha cheias de pó, comer banana assada com Ginguba (amendoim) e uma Coca-Cola… é assim que eu sou… É isso que eu gosto e que me define e não acho que seja empresária. Sou empreendedora, isso sim, e sempre fui. Gosto de imaginar e de fazer acontecer e a maior parte das vezes correr atrás dos sonhos.
Porque se decidiu pela área de material médico e hospitalar? Tinha experiência nessa área?
Foi na altura em que deixei a advocacia. Um momento muito difícil da minha vida. Não por deixar a advocacia, mas foi nesta altura que a minha vida pessoal passou por uma transformação muito grande e profunda. E apesar de ter sido um “naufrágio assistido”, acabei por integrar um projecto totalmente novo, em Angola, nessa área.
Lançou a PrimeDiagnostics e a Pantest. Como se relacionam estas empresas?
A PrimeDiagnostics foi o “balão de ensaio” do que seria a Pantest, dois anos depois. A PrimeDiagnostics foi uma empresa que criei no Reino Unido, que levou os primeiros testes rápidos para Angola, e que teria a função de trading de material médico, nomeadamente testes rápidos. Ainda tivemos alguma faturação (que em parte acabou por financiar a Pantest), mas depois surgiu o projecto da Pantest – cuja ideia inicial era fabricar testes para a PrimeDiagnostics – e as coisas evoluíram noutro sentido.
O facto de ser jovem e ser mulher dificultou bastante a “caminhada” e digo, com toda a segurança, que se eu fosse homem a Pantest não tinha enfrentado tantas dificuldades como enfrentei.
Qual foi o investimento inicial e como se financiou?
O principal capital que temos são as nossas ideias e o principal investimento que fiz na minha ideia foi (todo) o meu tempo, dedicação e paixão. Embora, inicialmente, tenha tentado recorrer a outro tipo de investimentos, o único que de facto resultou foi o financiamento bancário.
Quais as principais dificuldades que enfrentou inicialmente?
A minha idade (na altura tinha 30 anos) e o facto de ser mulher. Infelizmente, em Portugal, ainda há muito o estigma de se ser jovem e principalmente de ser mulher e já tive a oportunidade de o dizer publicamente, várias vezes. O facto de ser jovem e ser mulher dificultou bastante a “caminhada” e digo, com toda a segurança, que se eu fosse homem a Pantest não tinha enfrentado tantas dificuldades como enfrentei. Infelizmente, Portugal ainda tem uma sociedade muito machista em determinados sectores e senti-me discriminada várias vezes por ser mulher, coisa que nunca senti, por exemplo, em Angola.
Como promoveu o negócio?
O pontapé de saída é sempre dado pela área de Marketing. O Marketing é fundamental e é uma área da Pantest que hoje, infelizmente, ainda terceirizamos. Gosto imenso da forma de fazer Marketing em Angola e no Brasil. Aliás, o Brasil nesse aspecto tem sido uma grande fonte de inspiração de como promover ideias. Em Angola, já começámos a ter muitos bons profissionais e boas agências e, por vezes, na Pantest recorremos a elas.
A qualidade dos nossos produtos, acabou por promover o negócio e a melhor publicidade é a que é feita pelos nossos clientes. É sempre um orgulho quando nos chega um pedido de cotação de “Testes Rápidos de Malária da Pantest”, por exemplo. É um orgulho quando os clientes não pedem um teste rápido qualquer e especificam que querem um teste da Pantest. Preocupamo-nos em ter um produto de qualidade, mas não só. Não nos limitamos a vender um produto, prestamos um serviço cujo valor, muitas vezes, ultrapassa o valor monetário do teste. Auxiliamos em todas as fases do negócio: aconselhamos, acompanhamos e estamos sempre junto do cliente para aquilo que for necessário, seja por telefone, email ou whatsapp.
Somos a primeira fábrica de testes rápidos em Portugal e das poucas na Europa. Acredito que agora com a pandemia exista a tentação de fazer um “copy-paste”, mas o mercado de testes rápidos não se esgota com o vírus COVID-19.
Quando soube que o seu negócio estava no bom caminho?
Eu penso que isso nunca se sabe. Vamos caminhando e vemos se os nossos passos estão a dar certo.
Como chegaram à liderança nos testes rápidos de imunocromatografia com a Pantest?
Somos a primeira fábrica de testes rápidos em Portugal e das poucas na Europa. Acredito que agora com a pandemia exista a tentação de fazer um “copy-paste”, mas o mercado de testes rápidos não se esgota com o vírus COVID-19.
A liderança de mercado não apareceu de imediato. Tem sido o trabalho dos profissionais da Pantest que tem permitido essa consolidação e liderança. Hoje, ninguém coloca em causa a qualidade dos nossos testes e quem trabalha connosco sabe que estamos ao nível da Roche, em termos de qualidade. Isso só é possível porque tenho uma equipa fantástica e que não me canso de elogiar, como a Luísa, a Susana, a Mónica e toda a parte de produção e da área administrativa que fazem os impossíveis para que o possível aconteça. Eu sou apenas a cara da equipa fantástica com quem tenho a honra de trabalhar.
Mais tarde entrou na representação das tintas Dyrup em Angola? Como surgiu esta oportunidade e como está a correr o negócio?
Um dos meus pais — eu sou uma mulher muito rica, como costumo dizer, tenho uma mãe e dois pais — conhece o director nacional da Dyrup PPG e era necessário colmatar a lacuna deixada pelo anterior representante. É nesse sentido que estamos a trabalhar. Não é um projecto fácil, por toda a grandiosidade que a Dyrup tem, as especificidades do mercado angolano e ainda para mais em época de pandemia, mas é sem dúvida um grande desafio. É um negócio com um potencial de faturação superior a 10 milhões de dólares/ano e que estamos paulatinamente a explorar e que quero superar largamente.
Aprendi que vivemos num mundo de lobos e que a máxima “keep your friends close and your enemies closer” deve ser levada à letra.
Qual foi o principal erro que cometeu neste percurso e o que aprendeu com ele?
Confiar demasiado e acreditar na boa-fé das pessoas. Aprendi que vivemos num mundo de lobos e que a máxima “keep your friends close and your enemies closer” deve ser levada à letra.
Quais os seus sonhos e metas para o futuro?
A Pantest vai ser o maior fabricante europeu de testes rápidos e eu vou construir a primeira fábrica de testes rápidos em Angola (e isto é um projecto que já tenho há alguns anos e que ainda não concretizei, não por falta de capital, mas por falta de tempo).