Estar bem preparada para fazer uma apresentação ou discursar frente a uma audiência é uma das maiores preocupações das profissionais de hoje. Mas, além do conteúdo, há cuidados a pôr na forma como ele é dito. Algumas das ideias que temos sobre o que é um discurso apelativo e bem formulado não estão assim tão certas como poderíamos achar à partida, como prova a coach vocal, Inês Moura, no seu livro, ‘O Poder Secreto da Voz’, publicado recentemente pela Porto Editora.
“A dicção e fluência do discurso têm de ser tecnicamente perfeitas”
A audiência consegue perceber instintivamente a diferença entre uma forma genuína de falar e uma dicção tecnicamente perfeita, mas que soa mecânica e artificial. Optar por esta última hipótese pode resultar numa comunicação enfadonha, segundo Inês Moura. Por vezes, o segredo está na espontaneidade. “É por isso que nunca deve decorar ou ler integralmente um discurso, por mais claras que fiquem as palavras. As irregularidades e interrupções normais devem ser mantidas. Uma das minhas partes preferidas de trabalhar discursos enquanto coach vocal é incluir imperfeições naturais quando o orador já domina as mensagens, para que não pareça preparado.”
“Fala mais devagar para se perceber melhor!”
Segundo a coach, a ideia de que diminuir a velocidade do discurso vai ajudá-la a não “comer” palavras enquanto fala é muito comum, mas não é completamente certa. “Podemos falar devagar e de forma imprecisa. Quase sempre o problema é a falta de precisão dos sons (e não a velocidade) que leva à omissão ou distorção.” Por outro lado, ao preocupar-se com a dicção correta das palavras já estará automaticamente a regular a velocidade a que fala.
Nem sempre é fácil apercebermo-nos se temos tendência para falar depressa ou devagar. Como testar? Leia um livro, em voz alta, durante um minuto exato. Marque onde ficou e conte as palavras ditas. Se contabilizou até 90, a velocidade da sua fala é lenta —“recorde-se dos discursos do ex-ministro das finanças, Vítor Gaspar”, diz Inês. Entre 100 e 160 palavras: velocidade moderada. Entre 170 e 200 palavras por minuto: velocidade acelerada — “190 era a média de Steve Jobs nos discursos de lançamento dos produtos da Apple”. Mas se ultrapassar as 200/250 palavras por minuto, então sim, é provável que não se perceba o que diz.
Os discursos mais acelerados conferem mais energia à mensagem, mas podem levar a audiência à exaustão. Já a pouca velocidade sugere autoridade e poder.
“Evita fazer pausas”
A resistência à pausa é uma das atitudes que Inês Moura encontra mais frequentemente nas pessoas que prepara, como escreve no seu livro. Mas a pausa também serve para comunicar e é vital no discurso. “Anuncia que algo importante virá a seguir ou permite à audiência processar o que foi dito. Alguns momentos de silêncio sugerem que o orador tem a autoridade e a confiança para permitir espaço entre as suas palavras.”
A noção de tempo do orador é muito desfasada da perceção que a audiência tem, observa. “O silêncio mínimo para uma pausa ser considerada como tal dura um quarto de segundo. Eu costumo aconselhar três segundos.” No entanto há cuidados a ter. Um deles é não a preencher com bengalas como o som “hum” (dizemos 200 destes por dia, em média), que podem ter um efeito negativo quando são feitos de forma recorrente ou abrupta, pois denunciam tensão e esforço na voz.
Hábitos que prejudicam a boa dicção
Ajudar a corrigir os desvios de fala que interferem com a correta articulação das palavras é uma das principais áreas de intervenção de quem, como Inês Moura, se dedica ao treino vocal. Mas, se é normal que descuremos mais a dicção quando estamos em ambientes mais familiares e informais, isso não deve acontecer durante uma apresentação ou intervenção frente a uma audiência atenta. Estas são algumas das falhas de dicção mais frequentes:
— Não permitir que a língua faça total contacto com os dentes, tornando a dicção débil e difícil de entender, sobretudo nos sons “t”, “d”, “n”, “l”.
— Omitir silabas nas palavras (como “tá” em vez de “está”)
— Omitir partes de grupos de consoantes (dizer “poblema” em vez de “problema”, por exemplo)
— Falar “para dentro”, que normalmente corresponde a falta de precisão e diminuição de movimentos da mandíbula e de outros articuladores de palavras. Além de diminuir a energia do discurso, a voz acaba por perder projeção.