Nos últimos anos, a gestão de recursos humanos ganhou um novo mote: contratar primeiro pela atitude certa e só depois pelas competências técnicas. A formação nestas últimas é um dado adquirido ou pode sempre ser dada mais tarde e as empresas começaram a constatar que os comportamentos e valores dos colaboradores podem ter um impacto no desempenho, rentabilidade e retenção de talento da empresa. O problema é que os famosos soft skills e atitudes adequadas ao perfil das organizações não são assim tão fáceis e imediatos de identificar.
Num inquérito de 2016 feito a 291 diretores de recursos humanos norte-americanos, o LinkedIn apurou que 59% acham que é difícil recrutar candidatos com as aptidões pessoais certas. O inquérito do LinkedIn analisou os soft skills que parecem atrair mais os empregadores e chegou a uma lista de 10, de onde se destacam a aptidão para a comunicação, liderando o ranking, logo seguida da capacidade organização e espírito de equipa. Características como o pensamento crítico, bom relacionamento interpessoal (ou ter boas competências sociais), a criatividade e adaptabilidade também são bastante valorizadas.
E quando falamos de um mercado de trabalho cada vez mais internacionalizado, onde os negócios se fazem à escala global e a geração millennial procura oportunidades e experiência fora de portas, são sobretudo este tipo de aptidões e características que podem fazer a diferença na carreira de um jovem profissional.
Adaptação a novos contextos culturais
Os profissionais que demonstrem mais aptidões para interagirem de forma eficaz com colegas e parceiros de negócio de outras origens étnicas, de trabalharem em outros países e contextos culturais, estarão mais bem preparados para construírem uma carreira sólida. Isto envolve dominar não apenas uma ou mais línguas para além da sua, como estarem bem informados sobre o ambiente político, legal, social e cultural de outros países.
Depois existem nuances a que é preciso ter atenção, como escreve Richard T. Alpert no site da Diversity Resources, organização norte-americana líder em soluções de otimização da diversidade. Um bom exemplo é a forma como se partilha informação. “As pessoas de diferentes culturas diferem na forma como lidam com as más notícias, por exemplo.” Compreender e respeitar as dinâmicas de trabalho próprias de cada cultura também é importante: se prezam mais o individualismo e independência, outras valorizam estilos mais colaborativos e apostam mais no team building. Até a perceção sobre tempo difere muito e é crucial nesta equação, seja no que toca a prazos, seja no equilíbrio entre vida profissional e familiar, diz Alpert.
Mas não é preciso sair do país e da sede da empresa para necessitar de adaptabilidade cultural. As equipas de trabalho concentram cada vez mais gente de origens diversas, com as quais é necessário aprender a lidar no local de trabalho e os negócios fazem-se em tempo real, graças às videoconferências, com parceiros de negócio internacionais.
Forte aptidão para a comunicação
É o soft skill mais procurado pelos recrutadores de vários setores de atividade, de acordo com alguns inquéritos. E quando falamos no mercado global, ganha ainda mais importância. Agora que áreas como as finanças ou tecnologia dependem cada vez mais da automação e do software, também os profissionais destes setores, tradicionalmente mais técnicos, precisam de boas competências de comunicação verbal no local de trabalho. Para fazer valer o seu ponto de vista numa reunião com um cliente, ou para fazer uma apresentação clara e concisa, precisará de saber do que fala mas também como fala.
A importância da comunicação escrita também tem sido subestimada enquanto aptidão e, aparentemente, preocupa bastante os empregadores de vários setores de atividade. Um estudo de 2016, promovido pela Partnership for 21st Century Skills e The Conference Board, concluiu que as aptidões de escrita de 26,2% dos recém-licenciados nos Estados Unidos eram deficitárias. Um problema, se pensarmos que 50% dos executivos inquiridos confirmaram ter em conta esta competência no momento de contratarem. Mais: 80% dos empregadores avaliam essa capacidade quando o colaborador está a ponto de subir na carreira.
Flexibilidade
É uma das características que mais destacamos na parte do currículo que respeita às aptidões pessoais, mas será que sabemos ao certo o que este conceito envolve? Hoje, os gestores esperam que os novos colaboradores demonstrem, quase de imediato, uma boa capacidade de adaptação à cultura da empresa, às suas chefias e equipas com quem trabalham. Esta flexibilidade traduz-se também na capacidade de resposta ágil às rápidas transformações do mercado, adotando novas soluções, processos de trabalho ou estratégias sempre que somos confrontados com novos cenários. Para isto é preciso alguma capacidade de antecipar a mudança e de reconhecer que no mundo dos negócios e no mercado de trabalho nada se mantém imutável e constante. Isso pode significar uma proatividade maior em assumir novas responsabilidades, projetos fora da sua área de atuação habitual, procurar formação em novos temas ou aptidões técnicas.
Mas flexibilidade também implica cada vez mais aceitar que já há poucos empregos das 9h às 17h e que, em busca de um maior equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, muito do trabalho poderá ter que ser feito a partir de casa. O home office é uma solução que colhe cada vez mais adeptos em setores como a tecnologia, mas também deve corresponder a um esforço das empresas, nomeadamente em facilitar as ferramentas técnicas e tecnológicas que permitam aos seus colaboradores fazê-lo, bem como uma maior flexibilidade de horários para que possam conseguir um equilíbrio mais estável entre o tempo para a família e o trabalho.
Motivação para aprender continuamente
Uma característica que também decorre da flexibilidade. O desenvolvimento tecnológico torna os processos de trabalho — e até certas funções— obsoletos mais rapidamente que nunca, o que significa que os colaboradores mais valorizados serão os que mostram motivação para a aprendizagem contínua de novas aptidões ao longo de toda a vida ativa. Mostrar interesse junto das chefias ou administração da empresa para obter formação profissional em determinada área ou competência é uma prova de proatividade e do seu compromisso com a organização.
A interação geracional pode funcionar muito bem neste campo, através da implementação de programas de mentoring bidirecional: os profissionais mais velhos transmitem experiência e os segredos do negócio aos millennials, enquanto estes podem aproveitar as suas maiores aptidões tecnológicas para auxiliar e dar formação nesta área aos colegas mais velhos.
Criatividade
Não é apenas uma característica essencial a jovens designers, artistas ou candidatos a uma vaga numa agência publicitária. Esta é uma das aptidões mais procuradas e necessárias a todo o tipo de profissionais e setores de atividade, da comunicação às finanças. Até porque a criatividade tem a ver com a capacidade de encontrar soluções mais ‘fora da caixa” e representa sempre uma vantagem competitiva para as empresas, sobretudo face às exigências do mercado global. Ela é o motor da inovação, sempre que se cria um novo produto para o mercado, uma nova ferramenta ou método de trabalho. Mas criatividade é também agilidade na resolução de problemas, uma competência muito apreciada em gestão e em perfis de liderança, e curiosidade de tentar novas abordagens sem medo de falhar. Uma mente criativa não se contenta com o plano A; consegue pensar num plano B e C e pô-los em marcha se o primeiro falhar.
Espírito crítico
Não é ao acaso que está no top 5 das aptidões mais valorizadas pelos gestores no inquérito conduzido pelo LinkedIn. Os profissionais mais orientados para resultados não têm medo de reanalisar e questionar processos de trabalho e estratégias, de forma a readaptá-los de forma mais eficiente, usando a lógica e os factos e tentando afastar fatores menos mensuráveis que possam estar a influenciá-los.
Ainda que não seja muito cómodo para quem está a começar na carreira — no fundo, existe sempre o receio de que possa ser entendido como uma forma de confronto ou presunção — a capacidade de questionar de forma pertinente (e não conflituosa) é muito valorizada pelas lideranças mais bem-sucedidas. Muitas vezes, basta um simples “porquê?” lançado na altura certa, sempre que se toma por garantida a eficácia de um método ou o sucesso/fracasso de uma estratégia, por exemplo.
Espírito de equipa em contextos de diversidade
Dividir tarefas eficazmente e consoante os pontos fortes de cada membro da equipa, completar o seu trabalho para não comprometer o do parceiro, ajudar e aceitar ajuda, abdicando do ego para que os resultados sejam atingidos, “vestir a camisola”, são atitudes válidas para qualquer empresa e em qualquer negócio. Aprender a trabalhar em equipa tem ainda a grande vantagem de nos fazer desenvolver as nossas competências sociais.
Mas hoje este espírito de colaboração joga com cartas diferentes: as de uma maior diversidade geracional e cultural. Os estudos indicam que os millennials são a geração de profissionais que mais aceita e procura a diversidade no local de trabalho. Atualmente, as empresas já concentram colaboradores de 3 ou 4 gerações diferentes — a geração Z (nascidos depois de 1993), os millennials, a geração X (entre meados dos anos 60 e 1980) e os baby boommers (nascidos entre o pós guerra e 1965), que representam 3 ou 4 conjuntos de valores e de visões do mundo bastante diferentes. Os profissionais mais velhos estão habituados aos mesmos métodos de trabalho e ferramentas há vários anos e, por isso, é preciso um bom equilíbrio entre apresentar novas soluções de forma disruptiva e o respeito pela experiência adquirida. Esta interação geracional no local de trabalho pode ser foco de conflitos. Quem souber ouvir, dialogar e integrar diferentes saberes e experiências está mais bem equipado para enfrentar os desafios do trabalho em equipa.
Manter o foco
Não é só para os jovens profissionais — constantemente confrontados com o chavão de serem a geração do multitasking, mas de não conseguirem manter a atenção durante muito tempo — que a capacidade de se manterem concentrados durante o dia de trabalho pode provar-se um desafio, num mundo completamente informatizado e ligado à web 24h por dia. Por isso a capacidade de gerir o próprio tempo transformou-se num critério crucial nas avaliações de desempenho das empresas. As chefias estão sempre atentas a quem completa os projetos no prazo estipulado, não só porque timing é tudo no mundo dos negócios, mas porque este é um bom sinal de que esse colaborador tem aptidões de organização e se concentra na tarefa.
A capacidade de se manter focada também é decisiva a longo prazo. Uma das estratégias de carreira mais inteligentes para provar que trabalha orientada para metas é pedir a oportunidade de acompanhar um projeto em todas as fases, da conceção até ao fim. Esta é uma aptidão essencial para quem trabalha em ambiente de startups, como explica à Forbes a vice-presidente da Updater, Lindsey Dole, mas na qual a grande maioria dos jovens colaboradores não tem ainda experiência. Mesmo que o projeto seja pequeno na escala da empresa, demonstrará compromisso, proatividade e que é capaz de assumir responsabilidades. É também uma boa preparação para lhe serem atribuídos projetos cada vez mais importantes.