Ainda a seleção de executivos e quadros superiores por headhunting era pouco conhecida em Portugal quando, em 1992, com 29 anos, Soledade Carvalho Duarte aceitou o desafio de liderar o escritório da Invesco Transearch em Lisboa, tornando-se na única mulher na Europa a liderar uma representação desta multinacional especializada em executive search – só tinha mais uma colega, nas Filipinas.
Desde que entrou para a equipa, em 1986, como managing director, Soledade Carvalho Duarte ganhou “uma paixão pela busca de executivos”. E foi o gosto por este trabalho que a ajudou a enfrentar um ambiente maioritariamente composto por “homens de cabelos grisalhos” sendo ela ainda tão nova. Mas o que Soledade Carvalho Duarte começou por sentir como dificuldade acabou por achar “muito gratificante” e a sua carreira não parou de evoluir. Já como managing partner confirmou que saber mobilizar os projetos para satisfazer (ou exceder) as expetativas das partes interessadas é a sua missão profissional. Os quase 30 anos de experiência na área fizeram de Soledade Carvalho Duarte uma especialista em desbravar caminhos e em inspirar os trajetos dos outros. Na Invesco Transearch, a primeira empresa de executive search em Portugal, Soledade sente que venceu o desafio.
Em 1992, era das poucas mulheres e tão nova à frente de uma empresa em Portugal. Isso facilitou ou dificultou a sua entrada no mercado?
De facto, quando fui nomeada managing partner da Invesco Transearch era a única mulher na Europa à frente de um escritório da Transearch e no resto do mundo, em 55 países, só havia outra nas Filipinas. Entrar naquele mundo de homens, mais velhos, que olhavam para mim com alguma incredulidade, mas que ao mesmo tempo me “adotaram” e me deram o benefício da dúvida, foi muito gratificante.
Gosto de pensar no exercício da liderança como uma cascata, em que recebemos, tratamos e passamos para o nível seguinte
Em Portugal, a pesquisa e seleção de executivos e quadros superiores por headhunting ainda era pouco conhecida apesar de trabalharmos neste mercado desde 1986.
No início, achei que era uma dificuldade acrescida o facto de ser mulher e ter 29 anos, numa atividade tradicionalmente atribuída a “homens de cabelo grisalho”, em que teria de convencer os clientes a confiarem-me a procura de um quadro de topo, e os candidatos de que o desafio que lhes estava a lançar era uma boa aposta para as suas carreiras. Completo este ano 30 anos de experiência em executive search, 24 dos quais como managing partner. Acho que consegui vencer o desafio.
O que considera fundamental para se exercer uma boa liderança?
Há várias competências fundamentais para uma boa liderança, mas apontaria a capacidade para inspirar, influenciar e desenvolver equipas.
Saber liderar é importante e saber ser liderado também o é?
Claro, pois a liderança deve ser vista com uma perspectiva de 360º, em que se procura “inspiração” acima para exercer influência aos que nos rodeiam, fazendo com que os objetivos sejam atingidos.
Gosto de pensar no exercício da liderança como uma cascata, em que recebemos, tratamos e passamos para o nível seguinte, com a certeza de estar a contribuir, a gerar valor.
As empresas procuram quadros que acrescentem valor. A uma base técnica robusta devem acrescentar uma leitura própria da empresa e do mercado.
O que procuram as empresas quando precisam de recrutar?
Quadros que acrescentem valor. Os perfis dependem muito do desafio que as organizações atravessam — podem vir ao mercado buscar quem as ajude a ultrapassar um momento mais difícil ou simplesmente quererem injetar sangue novo, fertilizando a equipa de gestão. De uma forma geral, procuram quadros que transportem consigo um saber de experiência feito, em que a base técnica é robusta e obviamente tem de estar lá, mas que conseguiram pôr uma camada por cima que lhes permite ter uma leitura própria da empresa e do mercado, antecipar os temas que podem surgir, capacitar as suas equipas para responder adequadamente e assegurar que entregam, idealmente acima das expetativas…
Há um estilo de liderança diferente entre géneros?
Há estilos de liderança diferentes entre pessoas, até do mesmo género, dependendo das circunstâncias de vida, da idade, do ambiente onde vivem, do que conseguiram aprender e integrar. Nas organizações, pela sua diversidade e de acordo com ela, também há estilos de liderança mais adequados do que outros.
Dependendo da idade, as mulheres lideram de uma forma diferente?
Sim, claro. Numa primeira fase, estão muito mais centradas num estilo de liderança mais “impositivo”, em que deixam claro que são competentes e que estão à altura do desafio. Depois amadurecem e percebem que a liderança se pode e se deve fazer de forma mais “soft”, que já não têm de estar tão “defensivas” e que podem adaptar o seu estilo pessoal à forma de liderança que exercem. Para ser justa, os jovens líderes masculinos também tendem a ser mais autoritários no início da carreira, para depois adotarem um outro estilo.
Há muitas mulheres que não estão no topo porque escolheram não estar.
O que impede então as mulheres de ascenderem a lugares de topo?
Há dois tipos de fatores que concorrem para esse impedimento, que é factual, basta ver o número de mulheres que compõe os conselhos de administração. Por um lado, temos uma cultura e uma história em que vemos que são os homens que num passado ainda recente eram a maioria dos licenciados e estavam também em maioria na contratação por parte das empresas. Naturalmente, chegavam ao topo das organizações porque também eram a maioria na base.
O segundo factor, é que as mulheres nem sequer entravam nesta corrida. E não o faziam por diferentes razões: algumas porque claramente não o queriam, tinham outras coisas que as preenchiam mais, que as faziam mais felizes; outras porque sentiam que por mais que se esforçassem (e esforçavam) nunca seriam reconhecidas e que o caminho lhes era barrado pura e simplesmente porque eram mulheres. Mas algumas conseguiram furar estas barreiras e avançaram, mas eu diria que a maioria até há muito pouco tempo, nem sequer tentava. Muitas mulheres puderam escolher e optaram por não abdicar de outras facetas da vida que as faziam mais felizes e realizadas.
Que conselhos daria a jovens gestoras?
Que têm uma carreira longa pela frente, que terão tempo para tudo e que não se esqueçam de viver. Graças a Deus as novas gerações têm muito mais claro que têm de equilibrar a vida pessoal com a familiar. Têm uma série de interesses e valorizam aspetos da vida fora do contexto estritamente profissional. A minha geração “hipervalorizou” a carreira profissional e os jovens que estão a dar os primeiros passos na vida profissional são os filhos dessa geração, que tiveram pais ausentes, que atravessaram situações de divórcio e querem para a sua vida algo de diferente.
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