Vanda Jorge, cool hunter

Ex-jornalista, tornou-se caça tendências. "Ser cool hunter não é só ter um nome cool, há muito trabalho invisível."

Vanda Jorge é licenciada em Comunicação Social pela Universidade Técnica de Lisboa e de 2004 a 2018 foi jornalista e coordenadora editorial do programa Imagens de Marca, da Sic Notícias. O seu percurso académico e profissional conduziu-a à “análise da forma como se gerem marcas, como se identificam tendências, como se desenham soluções para mercados específicos”. Hoje é diretora criativa e de conteúdos do Eco, onde é responsável pela secção Ecoolhunter. Nesta entrevista, desvenda os segredos da sua profissão.

O que faz uma cool hunter e em que difere do trabalho de uma jornalista?
Lidewij Edelkoort, uma referência nesta área costuma dizer: “Trends Forecasting is much like archaeology, but to the future”, ou seja, fala da importância de colecionar informação, porque cada tendência tem uma raiz na história. É para mim a melhor definição.

Hoje o cool hunting é o mesmo que o trends reserarch ou trends forecasting, feito pelos chamados futuristas ou por grandes agências como a WGSN. E é sinónimo de procura de informação, do que é novo em termos criativos, de inovação, seja na arte, na moda, no design, na tecnologia. É identificar novas tendências e prever ou apontar caminhos sobre como pode vir a moldar determinada indústria. É observar o mundo e as pessoas, analisar comportamentos e acontecimentos e prever mudanças. Diria que um jornalista vive mais o presente e tem como missão relatar o acontecimento, um cool hunter vive mais da observação desse presente, mas trabalha no futuro.

Quando e como decidiu tornar-se coolhunter?
Resulta de um percurso académico e profissional que me trouxe até aqui, à análise da forma como se gerem marcas, como se identificam tendências, como se desenham soluções para mercados específicos. Como jornalista tive a oportunidade de ter acesso a pessoas e a experiências únicas, de contactar com indústrias muito diferentes que vão acrescentando layers de conhecimento e de expertise. Juntou-se a minha curiosidade natural de procurar todos os dias encontrar algo novo no mundo. É um trabalho de investigação, de permanente pesquisa, de inquietação e de interesse pelo que nos rodeia. De muita leitura. De procura soluções. De abertura para o mundo, em qualquer área de investigação. Resulta das muitas viagens que faço, das pessoas que conheço, da network internacional que fui construindo, também elas futuristas ou que trabalham em agências especializadas em tendências, e com quem troco insights.

Qual a formação necessária?
Diria que o dia em que escolhi que queria como futuro o cool hunting, ser key opinion leader em marcas e tendências foi no primeiro dia de aulas no Central Saint Martins, em Londres, onde estudei precisamente cool hunting. Mas vemos cool hunters com as mais diferentes formações. O que acho fundamental é irmos aprofundando conhecimento. Por exemplo, recentemente tirei um Executive em gestão do Luxo na Católica que me permite hoje olhar para o mercado do luxo com mais know how. Ser cool hunter não é só ter um nome cool, há muito trabalho invisível.

Quem são as pessoas que nesta profissão mais admira ou que a inspiram?
Sou suspeita porque nos tornámos amigas, mas gosto muito do trabalho da Geraldine Wharry, que trabalha principalmente em áreas como a moda e a beleza. Acho extraordinário o trabalho que ela desenvolve e pública por exemplo na Dazed Beauty, sobre as novas fronteiras daquilo que entendemos como beleza.

Vamos ver as máscaras como um novo normal, uma nova oportunidade de negócio num mundo que se quer mais higiénico e que vai surgir em novos materiais, em smart textiles e versões sustentáveis.

Como se formam e se identificam as tendências?
Havia uma ideia que me inquietava e que fui explorando nos últimos meses no meu Instagram. O uso de “máscaras” em tudo o que era coleções de moda e conteúdos digitais criativos. Acabei por escrever um artigo para a minha secção, o Ecoolhunter no jornal ECO. Fui fazendo essa coleção, essa tal arqueologia, e ligando ideias… Das checkin_invoices, à Balenciaga e mais recentemente na apresentação da última coleção da Benetton. Em alguns desfiles eram distribuídas e algumas personalizadas, as da Chanel com camélias, as da Fendi com os dois F e a da Gucci usada por Billie Eilish nos Grammys… e admitia no artigo que hesitei falar de moda e saúde no mesmo texto, quando muitos de nós saímos à rua de máscara, nestes novos tempos. E tanto tempo depois de terem sido criadas, em 1890 como símbolo da modernidade médica. E depois de terem continuado populares na China, sempre como símbolo do cuidado pela comunidade e de consciência cívica. Para além dos desfiles, também as vimos como forma de solidariedade ou protesto em manifestações pró-democracia como as recentes em Hong Kong, uma moda defensiva ou de proteção de identidade; mas também as vimos a serem usadas contra a poluição. Portanto, há aqui uma tendência, a moda como camada de proteção ambiental, de privacidade e agora também por questões de saúde, uma tendência que já se via na Ásia e que esta Pandemia acelerou e tornou global. E acho que as vamos ver como um novo normal, uma nova oportunidade de negócio num mundo que se quer mais higiénico e que vai surgir em novos materiais, em smart textiles e versões sustentáveis.

Quem é o seu cliente?
O meu cliente neste momento é o meu leitor e seguidor, quer no Jornal ECO onde trabalho nessa área, e nas minhas redes sociais onde vou partilhando ideias, reflexões, descobertas. Mas a ideia é que o Ecoolhunter cresça, há planos para isso e que as tendências possam ser “vendidas” de outras formas.

Quais as tendências globais que irão marcar os próximos tempos?
Ao certo, acho que ninguém sabe. Ou melhor, esta Pandemia veio transformar tudo. Estamos todos a descobrir este mundo novo, o que será o novo normal. Mas acho que há algumas ideias que posso deixar: a moda cada vez mais defensiva e smart como explicava em cima, novas oportunidades para um mundo que se quer mais higiénico, seja com novos produtos e serviços que nos façam sentir segurança; e deixava mais um – Kindness is the new cool. Unimo-nos todos e chegámos à conclusão que as vidas precisam de mais generosidade, na saúde e na doença, ligar a revolução verdadeiramente digital que vivemos nestes tempos de isolamento ao aspeto mais humano.

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