Esta pesquisa da Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) é “pioneira tanto pela amplitude do target que representa” — perto de 2,7 milhões de mulheres entre os 18 anos e os 64 anos, num total de 2428 entrevistas realizadas — “como pela diversidade das temáticas investigadas”, que abarca traços de personalidade e atitude perante a vida, vida familiar e afetiva, trabalho pago e não pago, situação económica, ou situações de assédio e violência, entre outras. O estudo apresentado esta terça-feira, 12, resulta de uma parceria entre a FFMS e a consultora PRM, foi coordenado por Laura Sagnier e Alex Morell e contou com a consultoria científica de Sara Falcão Casaca e Heloísa Perista, duas especialistas nacionais nas temáticas abordadas.
Mais de metade insatisfeitas com o emprego
O estudo revela uma elevada percentagem de mulheres presentemente ativas no mercado de trabalho (71%); 10% das entrevistadas estão desempregadas e os restantes 19% declararam-se inativas ou afastadas do mercado de trabalho. É nos níveis de escolaridade mais altos que os números do desemprego e abandono do mercado de trabalho são mais baixos. Também é aqui que o nível salarial é mais elevado.
Para a maioria das entrevistadas, o emprego de longa duração não é a situação mais comum: 20% estão nas suas funções atuais há menos de 1 ano e 28%, num período entre 1 e 5 anos. Só 14% estão no mesmo emprego há mais de 20 anos. No que diz respeito ao número de horas de trabalho, a situação mais comum são as 40 horas semanais (41%), com 26% a afirmarem trabalhar mais tempo. Duas em cada três mulheres trabalhariam menos horas, se pudessem escolher.
Em termos salariais, os números não são animadores: os rendimentos mensais líquidos não ultrapassam os €900 para dois terços (67%) das inquiridas. O escalão salarial onde mais mulheres se enquadram (34%) é o dos salários entre os €451 e os €680.
Um outro aspeto a destacar é o grau de felicidade feminino face ao tipo de trabalho que fazem. Mais de metade (51%) declararam-se infelizes com o seu trabalho pago. Para 36% o trabalho atual é visto como uma mera fonte de rendimentos, manifestando que não trabalhariam se não precisassem. No extremo oposto, 23% afirmaram que trabalhariam mesmo que não precisassem. As mulheres que se revelaram mais felizes são proprietárias de um negócio ou empresa, diretoras ou chefes de departamento/membros de um conselho de administração, e trabalhadoras independentes qualificadas.
Quanto ao grau de escolaridade, 39% das inquiridas fizeram algum tipo de bacharelato ou licenciatura, enquanto 38% deixaram de estudar após o ensino secundário. Entre as mulheres com ensino superior, as três áreas mais comuns são «Direito, Ciências Sociais e Serviços», «Economia, Gestão e Contabilidade» e «Humanidades, Secretariado e Tradução».
Conciliar carreira + vida pessoal= maior felicidade
Independentemente do nível de escolaridade das inquiridas, os dois aspetos mais relevantes num “emprego ideal” são o salário e a possibilidade de uma boa conciliação com a vida familiar. A partir dos 28 anos, a possibilidade de “conciliar bem o trabalho pago com a vida pessoal ou familiar” torna‐se a questão mais relevante para uma esmagadora maioria das mulheres consultadas, mas perde importância na faixa das maiores de 50 anos, passando a ser a 4ª prioridade no ranking.
O estudo concluiu ainda uma elevada relação entre as facilidades na conciliação entre o trabalho pago e a vida pessoal, e o grau de felicidade que esse trabalho lhes traz. Apenas as proprietárias de negócios e diretoras ou chefes de departamento afirmaram sentir-se felizes com o trabalho, apesar das dificuldades que têm para o conciliar com a vida familiar. Apesar disso, as mulheres que conseguem compatibilizar bem carreira e vida familiar demonstram sentir-se mais satisfeitas em termos laborais, independentemente do seu escalão de rendimento mensal, do que aquelas que auferem salários mais altos, mas têm dificuldades nesta conciliação.
Acumular frentes: filhos, trabalho, casal
Como seria de esperar, é para as mulheres que têm pelo menos um filho menor que a conciliação se torna mais complexa, segundo o estudo. Esta situação afeta 39% das mulheres no mercado de trabalho que, em média, destinam 7h:18m por dia ao trabalho pago e 6h:12m por dia ao trabalho não pago, que inclui tarefas domésticas e o cuidado e educação dos filhos. Dos 39% de mães trabalhadoras com filhos menores, 31% admitiram que, em alguma altura da sua vida, a vida familiar se sobrepôs à vida laboral. Neste grupo, 84% afirmaram ter auto-imposto algum tipo de “travão” para evitar o avolumar destas situações, enquanto que para 16% a solução foi abandonaram o mercado de trabalho. Entre aquelas que decidiram colocaram um travão à carreira, as opções mais frequentes são recusar uma oferta de trabalho mais exigente, ou terem hoje um trabalho onde o nível de dedicação é inferior ao que tiveram no passado.
O fator que mais influencia as mulheres a sobreporem a família ao trabalho, é o número de filhos que têm — 42% das mulheres com mais de 2 filhos afirmam ter travado a progressão profissional. O peso do abandono feminino do mercado laboral vai aumentando com a prole — de 7%, entre as mulheres que não são mães, dispara para 38% entre as que têm mais de 2 filhos.
O nível de escolaridade das mulheres também contribui para reduzir a proporção das que abandonam o mercado de trabalho para dar total prioridade à família.