Batom vermelho

Há umas semanas, em conversa com umas amigas, falava-se sobre o uso do batom vermelho. Muitas não usavam porque não gostavam de se ver, porque não tinham, porque achavam inapropriado.

Para mim, o batom vermelho sempre representou força e resistência. Talvez por conhecer as várias histórias por detrás deste produto aparentemente tão banal, associado tantas vezes a futilidade porque é um acessório exterior de beleza. Usar batom vermelho é um momento, para mim, de grande satisfação e autoestima.

Assim, e no seguimento da nossa conversa, acabei por oferecer um exemplar deste pequeno objeto a algumas amigas e por lhes contar algumas histórias, que agora vos deixo aqui.

O batom vermelho começou a ganhar relevo durante o movimento das sufragistas no início do século XX. Como se associava o uso desta maquilhagem à capacidade de intimidar os homens, as sufragistas usavam esta cor para chamar a atenção para a sua causa durante as marchas de protesto. A Elizabeth Arden, que era uma grande defensora deste movimento, criou batons neste tom e oferecia-os durante as marchas em Nova Iorque. Foi um escândalo.

O batom vermelho passou a ser sinónimo de rebelião e liberdade.

Durante a Segunda Guerra Mundial, e por causa do que representava, soube-se que Hitler detestava este produto de cosmética. Assim, Winston Churchill criou o conceito de que usar batom vermelho era um símbolo de luta contra o fascismo e sinal de patriotismo. Por isso, em muitas das imagens que conhecemos das mulheres da Resistência elas surgem com os lábios bem encarnados.

Há uma história fascinante que aconteceu no final da Segunda Guerra. Quando começaram a libertar os campos de concentração, equipas de militares geriram-nos durante os primeiros tempos, tratando e alimentando os sobreviventes. Ao Campo de Bergen-Belsen, onde dizem que viveu os seus últimos dias Anne Frank, chegaram caixas de batons vermelho. As tropas britânicas ficaram em choque: faltava tudo, mas tinham entregado batons vermelhos. A verdade, conta o Tenente-Coronel Mervin W. Gonin num texto que é possível encontrar online, é que este objeto serviu para que a moral das mulheres resistisse o suficiente para sobreviver mais uns tempos. Ele refere que foi um ato de génio: “It was an act of genius, sheer unadulterated brilliance. I believe nothing did more for these internees than the lipstick”. As mulheres quase despidas, cobertas com mantas improvisadas, vagueavam pelo campo sem nada exceto, os lábios pintados de encarnado.

O batom trouxe-lhes de volta a sua humanidade.

Desde então, movimentos femininos pelo mundo fora usam este artigo de cosmética como símbolo de luta e união.

Ainda hoje, vemos muitas mulheres que representam força e perseverança com esta cor. Margaret Tatcher não prescindia do batom vermelho, a Alexandra Ocasio-Cortez surge-nos sempre nos ecrãs com este tom.

Gostamos de ver nas outras, dizem-me. Agora que sabem aquilo que representa, rebelião, liberdade, humanidade, luta, união, sentem-se mais motivadas a vê-lo em vocês?

Até porque, como diz uma das minhas atrizes favoritas de sempre, e que significa tão mais do que o que está escrito literalmente: “There is a shade of red for every woman” (Audrey Hepburn).

 

Inês Brandão é fundadora e Global Business Manager da Frenpolymer. Leia mais artigos de Inês Brandão.

Publicado a 26 Outubro 2023

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