Os nossos amigos têm superpoderes

Quando se juntam mais de uma dúzia de adultos, já na sua meia-idade (embora nenhum de nós use ainda essa expressão), é garantido que haverá novidades para dar. Em poucos meses, neste grupo de amigos tomaram-se decisões, receberam-se notícias (umas boas, algumas más), há histórias para contar. Não se procuram soluções. Só partilha. Percebem-se os pormenores do que aconteceu, umas coisas são novidade, outras não, numas o desfecho já aconteceu, noutras ainda decorre. Mas todas elas merecem um brinde. Por termos chegado àquele dia, juntos.

Se esses adultos são amigos, a maioria quase desde sempre, há como que um superpoder que nasce em cada um deles e parece fazer desaparecer qualquer preocupação. Pelo menos, nas horas que dura o encontro. Não há ansiedade que resista a um vinho bem escolhido, angústia que não seja aniquilada com uma piada, cansaço que não se neutralize com uma boa sobremesa.

Talvez por isso, o momento acontece à volta de uma mesa. E talvez não sejam segundos. Serão horas. Começa de dia e estende-se até à noite. À volta deles e delas, levitam filhos de muitas idades, uns sofrem com as noites ainda mal dormidas, enquanto outros contam sobre os primeiros tempos da faculdade. Entre temas triviais — discussões feministas, clubes de futebol, comentários de férias, sugestões de auriculares, dicas para o esqui e memórias de fins de semana juntos (marcando já o seguinte!) — abordam-se assuntos mais sérios e comentam-se tratamentos médicos, preocupações com familiares, explicam-se projetos profissionais, recordam-se datas importantes, encontram-se coincidências comoventes.

Invariavelmente, no entanto, olhamos para cada um de nós como nos dias em que nos conhecemos. Sem o peso dos dias, o nosso e o dos outros. E é por isso que, entre o sério e o brincar, o superpoder atua na sua plenitude e nos sentimos imortais.

A vida vai e vem. Acontece. Perde-se e ganha-se. Entre as rotinas de escolhas e desassossegos, estes momentos entre amigos são uma âncora para o que não muda.

Sabemos que porta fora, o mundo, como o deixamos antes do almoço, ainda é o mesmo. Mas, enquanto ainda não o enfrentamos (ao mundo), reaprendemos e reencontramo-nos: os nossos amigos trazem-nos, acima de tudo, ao que somos. Lembramo-nos.

E recuperamo-nos.

Entre as memórias e as coincidências.

(“O meu irmão também se chamava Pedro Manuel.”)

Venha o mundo lá fora.

Eu guardo os meus amigos, e os seus superpoderes, cá dentro.

E, quando é preciso, vou lá buscá-los.

 

Inês Brandão é fundadora e Global Business Manager da Frenpolymer. Leia mais artigos de Inês Brandão.

Publicado a 18 Janeiro 2024

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