Aprender a empreender com os especialistas

A Conferência Empreendedorismo Feminino reuniu um painel de especialistas que partilharam os seus conhecimentos sobre recrutamento, aspetos jurídicos, investimento, como fazer um plano de negócios impactante e atingir o sucesso apoiado na relação com o cliente.

A conferencia juntou, no Salão Nobre da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, centena e meia de interessados nos aspetos que realmente interessam, quando se lança um negócio.

Dar mais ferramentas a todas as mulheres que ambicionam construir um negócio, através dos conselhos práticos de especialistas e da partilha de experiência de outras empreendedoras foi mote que a inspirou a Conferência Empreendedorismo Feminino, mais uma organização da Executiva, com o patrocínio da Adecco, do Grupo Your e da Monday. Centena e meia de pessoas encheram o Salão Nobre da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, em Lisboa, na manhã 21 de março, para ouvir empreendedores experientes ou ajuda os especialistas que os ajudam a chegar mais longe.

A abrir a sessão, Isabel Canha e Maria Serina, fundadoras da Executiva, partilharam as lições aprendidas em 4 anos enquanto empreendedoras. A importância da escolha dos sócios surgiu à cabeça. “A Isabel e eu já nos conhecemos quase há 30 anos e trabalhámos muitos anos juntas. Sempre funcionámos muito bem em equipa e isso é uma vantagem”, revelou Maria Serina. Já Isabel Canha salientou como a experiência vale ouro, ao empreender. “Todas as aprendizagens e contactos que fomos fazendo foram convocadas para este projeto e são muito relevantes. Apesar de o empreendedorismo estar hoje muito ligado a buzzwords como start-up, venture capital, business angels ou ao empreendedorismo tecnológico dos jovens acabados de sair da faculdade com ideias geniais e escaláveis para todo o mundo, empreender também é isto que fazemos. ”

As fundadoras da Executiva deixaram ainda o alerta: “Preparem-se para fazer mil e uma coisas ao mesmo tempo.” Sobretudo no início do negócio e quando a equipa é pequena, os empreendedores têm que assumir a gestão, mas também tarefas pequenas. “Não podemos e muito perfeccionistas, a não ser na qualidade do trabalho que entregamos é mesmo verdade”, rematou Isabel Canha.

Oportunidades ainda não são iguais para as mulheres

Enquanto presidente da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG), Teresa Fragoso está à frente de um organismo da administração pública cuja missão é garantir a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres. Mas ambos os géneros não partem ainda do mesmo ponto de igualdade, como salientou Teresa Fragoso ao longo da sua intervenção. “Muitas vezes, o primeiro obstáculo é interno e as próprias mulheres questionam-se se conseguirão alcançar aquilo a que se propõe como empreendedoras, porque as mensagens que vão ouvindo desde pequenas é que esse não é o seu primeiro papel. Isso vai ser importante quando nos dirigimos às fontes de financiamento. Quer seja um homem ou uma mulher que atendem quando nos dirigimos à banca, vão ter a mesma dúvida e perceção: será que as mulheres vão rentabilizar o dinheiro que estou a investir nelas?”

“Muitas vezes, o primeiro obstáculo é interno e as próprias mulheres questionam-se se conseguirão alcançar aquilo a que se propõe como empreendedoras, porque as mensagens que vão ouvindo desde pequenas é que esse não é o seu primeiro papel.” Teresa Fragoso, presidente da CIG

Em todos os países há mais homens do que mulheres empreendedoras, segundo dados da OCDE apresentados pela presidente da CIG. Em Portugal, as mulheres são apenas 30,2% das pessoas que trabalham por conta própria. No entanto, 55% do total de homens empregadores têm apenas escolaridade básica, enquanto que 43,3% das mulheres empregadoras já têm uma formação ao nível do ensino superior.

Teresa Fragoso falou ainda de oportunidades para mulheres empreendedoras, como o Programa Operacional Inclusão Social e Emprego, que conta com financiamento da União Europeia para iniciativas de apoio à capacitação e constituição de empresas por mulheres, que permite também ações de sensibilização e capacitação para o empreendedorismo. O concurso será aberto em breve, vocacionado para a criação de pequenos negócios. “Estamos também prestes a lançar os planos para a igualdade nas organizações, aos quais as empresas (privadas ou públicas) podem candidatar-se, com acesso a financiamento que as apoie a fazer um diagnóstico de necessidades — como está a paridade entre homens e mulheres, o acesso aos salários e à tomada de decisão ou as políticas de apoio à conciliação.”

Tendências no mundo da contratação

“Interessa-nos combater os desequilíbrios no mercado laboral porque acreditamos que esta é a única forma de fazer com que o mundo do trabalho funcione para toda a gente. E também porque está provado que a diversidade é um alavancador de performance.” Foi com as razões que levaram uma empresa de soluções em recursos humanos como a Adecco a associar-se a esta conferência, que Carla Rebelo, diretora-geral daquela empresa, abriu uma intervenção onde falou de tendências e novas soluções, em termos de contratação de pessoas, adequadas a quem esteja prestes a abrir o seu negócio.

A diretora-geral falou das tendências que vão marcando hoje o recrutamento e que podem apresentar-se como soluções viáveis para quem está a começar o seu negócio. Podem passar, por exemplo, pelo recrutamento de perfis profissionais até então não equacionados por quem contrata. “Com formação adequada, pessoas com perfis que não eram primeira escolha podem resultar bem.”

“O mito de que tudo o que é flexível é precário não passa de desinformação e demagogia. Sem flexibilidade as empresas não conseguem avançar e não há crescimento de PIB nos países.” Carla Rebelo diretora Geral da Adecco.

Outras tendências atuais nesta matéria passam pelo re-skilling  — requalificação e formação e reconversão de pessoas vindas de outras áreas, mas que podem começar a desempenhar funções em áreas onde há mais escassez de recursos humanos — ou os assessements, “outra forma de mitigar riscos, evitando promover ou despedir pessoas indevidamente”, onde se avalia se os colaboradores têm o perfil e a experiência necessários às funções que já desempenham ou vão desempenhar.

Carla Rebelo falou ainda de tipos de contratação, remunerações e de flexibilidade laboral. “A flexibilidade é importante, sobretudo num conceito de empreendedorismo, e não há nada de errado ou ilegal nela. O mito de que tudo o que é flexível é precário não passa de desinformação e demagogia. Sem flexibilidade as empresas não conseguem avançar e não há crescimento de PIB nos países.”

A diretora-geral da Adecco terminou com uma análise sobre o impacto que uma maior diversidade na iniciativa empreendedora pode ter na economia. “Ainda vemos que apenas 1/3 dos novos empreendedores são mulheres. O potencial de crescimento feminino é bastante grande e necessário para o desenvolvimento da economia.”

Um plano de negócio à prova de bala

“O primeiro grande segredo de um plano de negócio… é não escrever um.” Foi assim que Bárbara Barroso, fundadora do laboratório de literacia financeira MoneyLab e do Blogue Dicas da Bá, iniciou a sua apresentação sobre como construir um bom plano de negócios. Apoiada na sua larga experiência em simplificar os por vezes sinuosos meandros financeiros e empresariais, a ex-jornalista de economia cativou assistência com uma apresentação didática e bem-humorada. “Há cada vez mais defensores de que não faz sentido escrever um plano de negócios — exceto se forem pedir financiamento ao banco e vos obrigarem a apresentar um”, ressalvou.

“Tudo o que precisam é de uma boa apresentação de 20 minutos, de 10 slides e uma demo ou protótipo da vossa ideia. Não precisamos de ter o negócio mais disruptivo; precisamos de ter o melhor.” Bárbara Barroso, fundadora do MoneyLab e do blogue Dicas da Bá.

Mas então, qual a alternativa? “Tudo o que precisam é de uma boa apresentação de 20 minutos, de 10 slides e uma demo ou protótipo da vossa ideia (quando existe).” Uma das questões que deve vir logo à cabeça da apresentação é explicar o que é o negócio, “qual o problema que resolve ou o prazer que proporciona”, atribuindo-lhe “uma promessa de valor”. O fator diferenciador do negócio, qual a inovação que traz e quem o poderia comprar é também essencial. “Não precisamos de ter o negócio mais disruptivo; precisamos de ter o melhor”, diz Bárbara.

De como fazer dinheiro com o produto até à estratégia de marketing adotada para o divulgar “sem ir à falência”, passando pela necessidade de “espiar a concorrência até não poderem”, a apresentação esquemática proposta por Bárbara Barroso permite “recolher um conjunto de dados que ajuda a obter uma ‘fotografia’ do estado do negócio”, mesmo para quem não vai ainda preparado para fazer um pitch a um investidor.

A finalizar deixaria ainda uma provocação em jeito de motivação às futuras empreendedoras: “Se soubessem que não existia risco no vosso negócio, o que fariam? Se errarem podem sempre começar de novo. Temos que parar de pensar na falha como algo negativo porque ela é parte essencial do processo de aprendizagem.”

Leis: o importa saber antes de começar

“Há uma coisa que aprendi: temos de fazer contratos acerca de tudo. Não se pode confiar só porque são amigos ou família. (…) O dinheiro gasto em advogados é muito bem empregado. Isto é das coisas mais importantes, mas às vezes facilita-se muito.” A citação retirada do livro ‘O Sucesso não cai do Céu’, de Isabel Canha e Maria Serina, serviu de abertura à intervenção da advogada Ana Sofia Batista, advogada sócia da Abreu Advogados, que começou por lembrar que um especialista legal pode ajudar, logo na constituição da empresa, a prevenir situações que podem estagnar negócios ou até pô-los em risco.

A advogada falou dos tipos de sociedades que podem ser formadas, no início do negócio, e dos mecanismos disponíveis para o fazer. “De há uns anos a esta parte, a Empresa na Hora permite resolver esta questão de forma rápida e prática, porque trata tudo de uma vez num único balcão. Funciona bem, mas não permite uma escolha muito flexível: é preciso escolher um nome comercial de uma lista pré-existente e entre os estatutos disponíveis para cada tipo de sociedade. Mais tarde posso fazer uma alteração de estatutos ou até do nome.”

Em sociedades empresariais mais sofisticadas podem revelar-se necessários documentos legais mais elaborados, que requerem o apoio de um advogado especialista nestas matérias. É o caso do acordo parassocial. “Trata-se de um acordo feito apenas entre os sócios, por isso privado e que não tem efeitos perante terceiros. Regula questões como a entrada e saída dos sócios da sociedade, distribuição de dividendos, como desbloquear situações de empate em deliberações sobre determinadas matérias, como nomear os membros dos órgãos sociais, em situações de aumento de capital ou acautelando em que circunstâncias posso modificar a sociedade ou ela ser dissolvida, entre outras.”

“É normal as pessoas relegarem um pouco as questões jurídicas um pouco áridas, mas mais vale fazê-lo agora do que mais à frente, quando os problemas já existem.” Ana Sofia Batista, advogada partner na Abreu Advogados.

A especialista em Direito Comercial aproveitou para lembrar ainda sobre a necessidade de ter muito em conta, desde a primeira hora, o novo regulamento de proteção de dados aprovado recentemente, bem como o registo de marcas, patentes e designs. “Caso não o faça, corre o risco de outra pessoa registar a marca posteriormente, ou de ela estar já registada em nome de outro, o que pode vir a trazer consequências negativas para o negócio. É normal as pessoas relegarem um pouco as questões jurídicas um pouco áridas, mas mais vale fazê-lo agora do que mais à frente, quando os problemas já existem.”

O que esperar de um business angel?

Este é um ano especial para Isabel Neves. Há 30 anos juntou-se à Associação Portuguesa de Mulheres Empresárias; mais tarde conheceu o mundo dos investidores informais, tornando-se business angel e presidente do Business Angels Club de Lisboa. Foi sobre investimento que falou na Conferência de Empreendedorismo Feminino.

Para além de dinheiro, um business angel também investe a sua experiência no mundo dos negócios e os seus contactos. “Procuramos negócios com alto potencial de inovação, que sejam disruptivos ou venham resolver problemas de mercado, e que tenham elevada capacidade de retorno. Não estamos à procura de micro-negócios e cujo retorno seja muito lento.”

A business angel corroborou a afirmação de Bárbara Barroso de que os planos de negócio estão a tornar-se obsoletos para apresentar ideias a alguns investidores. “Eu sou uma dessas pessoas. Se me aparecerem com um produto muito inovador, que não existe ainda, o que me interessa a projeção de vendas, se vocês não sabem sequer se o projeto vai começar? É uma falácia. O que interessa é acreditar que esse produto vai corresponder a uma necessidade real e vai interessar ao público. Preciso de uma fotografia que me diga o que é o produto, que me digam como lá chegaram e como vão vender. A partir daí, sou eu que faço as perguntas, enquanto investidora, e que me vou entusiasmar para perceber o negócio, montá-lo convosco e ajudar a colmatar lacunas.”

“Não há almoços grátis. Um business angel vai querer ganhar dinheiro e vai ter pressa em sair do negócio — temos um timming para estar convosco. Vamos entrar para a sociedade e vamos impor condições.” Isabel Neves, presidente do Business Angels Club de Lisboa

Outro aspeto essencial é a equipa que vai trabalhar o negócio. “Esse é um dos aspetos que o investidor mais valoriza no negócio em que aposta. Quando ela não existe, queremos alguém com muita garra. Eu invisto em pessoas, por isso o perfil do empreendedor é essencial para mim.”

No entanto, Isabel Neves lembra: “Não há almoços grátis. Um business angel vai querer ganhar dinheiro e vai ter pressa em sair do negócio — temos um timming para estar convosco. Vamos entrar para a sociedade e vamos impor condições. E preparem-se porque os acordos parassociais normalmente são duros. Não vos pedimos garantias como os bancos; vamos arriscar o nosso dinheiro em vocês.”

Co-criar o negócio com o seu cliente

O conceito de business design não será propriamente familiar à maior parte das empreendedoras, mas pode ajudar a estruturar um negócio com mais hipóteses de sucesso. É nisto que Diogo Romão, CEO da Monday, agência especializada no mercado digital, design e consultoria de negócios. Diogo é ele próprio um empreendedor em série vocacionado para a área tecnológica, que deixou já a sua marca em outras três start-ups e sabe que o segredo para garantir que o negócio está no bom caminho passa por orientá-lo pelas necessidades e gostos reais do cliente, em vez de lhe fazer somente o pitch dos serviços que está a pensar prestar. “Um dos conceitos mais interessantes de business design descreve-o como uma aproximação à inovação com o utilizador final no centro. Procura responder a 3 questões: algo que seja desejável, tecnicamente viável e economicamente viável.”

“É preciso saber verdadeiramente o que pensam, sentem e querem os nossos clientes, ou seja, que dores, que ganhos e que necessidades deles podemos resolver. Se conseguirmos construir o nosso negócio em co-criação, teremos mais hipóteses de sucesso.” Diogo Romão, CEO da Monday.

O conceito aplica-se não só a start-ups mas também a empresas maduras, onde pode servir de ferramenta de reformulação do negócio. “Mais de 90% das novas empresas falham e há várias razões para isso: por não existir uma necessidade de mercado, porque ignorámos os clientes ou porque não temos modelo de negócio. Não vamos conseguir resolver todas estas causas, mas podemos minimizar o impacto delas com a co-criação do business design. É preciso saber verdadeiramente o que pensam, sentem e querem os nossos clientes, ou seja, que dores, que ganhos e que necessidades deles podemos resolver. Quando envolvemos os clientes na criação de um produto ou serviço nosso, além de descobrirmos o que funciona mal, descobrimos também o que funciona bem — muitas vezes, quando se reformula o que está mal estragamos também, pelo caminho, os aspetos bons. Se conseguirmos construir o nosso negócio em co-criação, teremos mais hipóteses de sucesso.”

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