“Ainda é mais fácil para os homens largar tudo para fazer um MBA”

Falámos com Sofia Salgado Pinto, a Dean da Católica Porto Business School, sobre os desafios e aptidões necessários ao cargo — e porque ainda há menos mulheres que homens a frequentar MBA.

Sofia Salgado Pinto reconhece que é comum as mulheres adiarem o MBA por causa dos filhos.

Sofia Salgado Pinto, 46 anos, é a primeira antiga aluna da Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Católica do Porto a assumir a direção de uma das unidades académicas desta instituição. Ocupa o cargo de dean da Católica Porto Business School desde 2013. Foi lá também que começou a ensinar em 1997 — é professora auxiliar naquela faculdade, numa área em que se tornou especialista e sobre a qual tem também um livro publicado: gestão de operações de serviços e qualidade dos serviços.

Casada e mãe de três filhas, consolidou a carreira académica na instituição em que se formou: mestre em Gestão de Operações Comerciais pela Católica, onde também fez um MBA, doutorou-se em Gestão pela Universidade de Warwick no Reino Unido; foi Associate Dean da Católica Porto Business School entre 2008 e 2013 e Associate Dean for Executive Education entre 2011 e 2013. Há cerca de um ano assumiu também o cargo de administradora não executiva da Sociedade de Transportes Coletivos do Porto (STCP).

Conversámos com Sofia Salgado Pinto para saber como é estar à frente de uma das principais instituições académicas nacionais para a área da gestão.

Fazendo o balanço destes quase quatro anos à frente da Católica Business School do Porto, a que lhe sabe esta liderança?
Sabe-me a responsabilidade, desde o início. Nunca pensei, até ao momento em que recebi o convite, que iria assumir o papel e a responsabilidade que assumo hoje. Este é um projeto desafiante e isso agrada-me muito — é algo que agarro com amor e entusiasmo — mas que vejo, acima de tudo, como algo em que vou tentando perceber quais são as competências que tenho e que podem fazer a diferença. O que é que aprendi nesta casa e o que fui desenvolvendo ao longo da vida e que me permite estar em condições de poder liderar esta faculdade.

O que hoje assistimos, ao nível dos MBA, reflete um pouco o que se passa nas empresas: como há mais homens a progredir profissionalmente, há mais homens a fazerem MBA.”

E que competências são essas?
Perseverança, porque trabalhamos com pessoas e para pessoas (um slogan que ouço em muito lado). A perseverança de ouvir sempre o que as empresas e as organizações precisam e vão precisar, de ouvir professores e alunos, que também confiam em nós para esse desenvolvimento. O gostar do que se faz, acreditar e ter visão do que esta é uma escola que forma carácter, que vê o indivíduo como um todo e não somente alguém que é treinado para ser um bom gestor e um bom economista, sem que nos interesse o que faz da porta para fora. É muito difícil, aos 20 e poucos anos, sabermos o que queremos e gostamos profissionalmente. Mas há que começar o exercício de ir descobrindo. É mais fácil, por exemplo, na formação executiva fazermos exercícios de “provocar a reflexão”, porque a pessoa já trabalhou, já teve boas e más experiências, gostou e não gostou de coisas que fez.

Há mais mulheres formadas em quase todos os graus académicos mas nos MBAs aparecem poucas. Como é que se garimpa o talento feminino nesta área?
Queremos garantir, sobretudo, que há igualdade de oportunidades. Quero acreditar que vamos conseguir reequilibrar esta diferença dentro de alguns anos, ou daqui por uma década. O que hoje assistimos, ao nível dos MBA, reflete um pouco o que se passa nas empresas: como há mais homens a progredir profissionalmente, há mais homens a fazerem MBA. Quando houver igualdade de oportunidades acredito que isso se vá refletir aqui na escola. Temos dois programas de MBA na Católica Business School: o MBA em full-time e o MBA executivo. No programa full-time, em que as pessoas tiram um ano para estudar a tempo inteiro, vemos mais homens, apesar de variar um pouco ao longo das edições. Têm, em média, 5 anos de experiência profissional e é mais fácil para eles largarem tudo do que para as mulheres. No entanto, vão aparecendo cada vez mais mulheres.

No MBA executivo, mulheres e homens estão a trabalhar e podem conciliar o MBA com o horário de trabalho. Há uns dez anos era mais assim: naquela fase de vida em que os homens trabalhavam e faziam MBA, as mulheres trabalhavam e tinham filhos (fazendo uma caracterização muito geral). Quero acreditar que vamos ter cada vez mais alunas que já foram mães. Mesmo a tirar MBA em full-time, vemos isso: profissionais com mais de 40 anos, com os filhos mais crescidos, e que tiram um ano para fazer um programa de full-time, porque também já têm um suporte familiar que lhes permite fazer isso. Acho que vale a pena estarmos atentos a estas transformações, até porque as mulheres têm filhos mais tarde, mas acho que começa a haver mais equilíbrio, outra forma de olhar para as coisas. Eu diria que pode, em algum momento, ser difícil para a mulher fazer tudo, mas não quer dizer que não faça a seguir.

“A gestão de topo empresarial ainda é um mundo muito masculino.”

Já vai sendo menos solitário ser uma das poucas mulheres à frente de uma instituição académica em Portugal?
Se fizer uma análise de todas as faculdades da Universidade Católica, não me sinto nada sozinha. Quando assumi a liderança da faculdade, o Conselho Consultivo era composto só por homens. Recordo-me da primeira reunião, em que me senti lindamente porque era a única mulher. Estava preocupada em que corresse tudo muito bem, mas no final disse: “Estou preocupada não por mim, mas pelos senhores, porque me sinto o centro das atenções. Para haver um maior equilíbrio, provavelmente seria mais rico se existissem aqui mais senhoras.” E fomos fazendo um alargamento nesse sentido, sem preocupações com quotas. Mas em alguns contextos, sobretudo empresariais, ainda me sinto um pouco sozinha. Como a Faculdade de Economia e Gestão lida muito com empresas, sinto isso em algumas reuniões onde só estão presentes homens. A gestão de topo empresarial ainda é um mundo muito masculino.

 

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