Ana Oliveira: “Nunca mais direi ‘não’ por medo”

Antes de chegar à Samsung, onde é diretora de Marketing e Retail da Divisão Mobile da Samsung Electronics, Ana Oliveira recusou um desafio profissional por receio de não estar preparada. Neste testemunho, explica o que aprendeu com esta decisão.

Ana Oliveira é diretora de Marketing e Retail da Divisão Mobile da Samsung Electronics.

Ana Oliveira passou por diversas indústrias de FMCG — tais como bebidas, cosmética, perfumes e tabaco, liderando equipas de marketing e trade marketing — até chegar à Samsung em 2018. Foi precisamente quando trabalhava na Puig, onde esteve 11 anos, que recusou um desafio porque receou não estar preparada. “Recusei uma proposta numa empresa de cosmética porque achei que não era o momento, que não era capaz, e quando o disse ao meu marido ele respondeu que eu não o devia ter feito. Aprendi nessa altura que nós pensamos demasiado e os homens saltam para a frente e vão. Não voltarei a repetir este erro”, assumiu na Na 6.ª Grande Conferência Liderança Feminina, da Executiva, em que participou no painel Mulheres na Tecnologia.

Neste testemunho explica o que aprendeu com esta decisão e de que forma ela influenciou a sua carreira.

 

O que a levou a não aceitar?

Achei que não estava preparada, que não era o momento certo para dar esse salto. Tive receio do que poderia encontrar lá fora e de não ter capacidade para dar resposta, para enfrentar os desafios que pudessem vir a impor-se. Agora sei que teria tido. Sei, também, que é inevitável sentirmos medo e ficarmos assustados com o desconhecido, mas pode ser surpreendente (pela positiva) quando decidimos dar o passo em frente e dizer “não” ao medo. Pode sempre correr mal, mas pelo menos tentámos e acreditámos, e saímos da experiência mais completos. Saímos dela com menos receio para futuros desafios ou obstáculos que surgem no futuro, mais seguros e confiantes sobre quais são as nossas competências e propósito.

O obstáculo principal estava na minha cabeça, na falta de confiança que tinha em mim, nas minhas competências e até onde poderia ir.

O que mudaria na sua vida se tivesse aceitado a proposta?

Penso que talvez tivesse enveredado cedo por uma carreira internacional. Creio que uma das piores sensações com as quais podemos ficar é a da incerteza: “E eu se tivesse tentado?”. Ninguém tem forma de saber ou adivinhar como seria a sua vida se tivessem optado por fazer determinadas escolhas diferentes daquelas que fizeram. Ainda assim, estou certa de que, independentemente do que tivesse mudado na minha vida, teria sido sempre uma forma de me desafiar e de provar, a mim própria, que era capaz. Acima de tudo, teria acreditado em mim e isso é a base de todo o sucesso que podemos alcançar. O resto, vem por acréscimo.

Qual o impacto que essa decisão teve na sua carreira?

Após ter percebido que os homens não pensavam se estavam ou não preparados, e estavam efetivamente sempre predispostos a encarar novos desafios, sem pensar demasiado, deixei de me colocar a mim própria essas barreiras. O obstáculo principal estava na minha cabeça, na falta de confiança que tinha em mim, nas minhas competências e até onde poderia ir. Ser mulher, nomeadamente no mercado profissional, já tem os seus desafios incutidos. É preciso fazer frente a esses “obstáculos” e fazer parte da mudança de paradigma, para que, dessa forma, gerações futuras de mulheres acreditem mais, arrisquem mais e agarrem oportunidades que podem ser cruciais para o seu futuro. Que busquem esse desejo de superação.

Os desafios chegam-nos e temos de olhar para eles como oportunidades de crescimento, e [pensar] que estamos sempre preparados para esses desafios porque são eles que nos vêm ensinar algo e fazer-nos crescer enquanto pessoas e profissionais.

Em que medida tem usado essa aprendizagem para impedir que outras mulheres também se deixem paralisar pelo medo?

A mensagem que passo para as minhas equipas, independentemente se são homens ou mulheres, é a de que os desafios nos chegam e temos de olhar para eles como oportunidades de crescimento, e que estamos sempre preparados para esses desafios porque são eles que nos vêm ensinar algo e fazer-nos crescer enquanto pessoas e profissionais. Arriscar é, também, por vezes errar, mas principalmente aprender com esses erros e perceber que eles fazem parte do caminho. Como se dizia na minha mesa Mulheres na Tecnologia: “Dores de barriga dão músculo“. Todos nós temos de enfrentar obstáculos em certos momentos da nossa vida, nomeadamente a nível profissional. Faz parte da jornada e da aprendizagem. Do nosso crescimento enquanto pessoas e parte da construção da nossa personalidade. O segredo está na forma como pegamos nessas aprendizagens e, a partir delas, criamos algo melhor e passamos ao próximo nível.

Acredito, também, que estamos a avançar na direção certa e isso é encorajador. Ainda assim, há um longo caminho que falta percorrer para alcançar a paridade total de género no local de trabalho, e as empresas têm um papel ativo a desempenhar no combate a esta situação. No exemplo concreto da Samsung, acreditamos que a igualdade e a inclusão são fundamentais para moldar um futuro melhor, e a nossa equipa deve ser, também, um espelho da nossa base diversificada de clientes.

As mulheres têm de acreditar mais nelas próprias, não se conterem e colocarem-se na linha da frente. Qualquer barreira que as mulheres possam pensar que existe no que toca à sua entrada na área da tecnologia, não existe verdadeiramente.

De que forma esta lição aprendida pode ser útil a jovens ou mulheres que estejam hesitantes em escolher uma carreira na tecnologia?

Acredito que as mulheres têm de acreditar mais nelas próprias, não se conterem e colocarem-se na linha da frente. Além disso, acredito que temos de ser muito mais solidárias entre nós e unirmo-nos: é importante partilhar experiências que possam ajudar jovens mulheres a direcionar o seu futuro e a acreditar que na área da tecnologia temos uma palavra a dizer e um ponto de vista diferente e incremental à visão masculina do setor. De forma geral, em Portugal e na Europa, as mulheres continuam a estar sub-representadas nas áreas da Ciência e Tecnologia, uma realidade que é particularmente visível nas áreas das tecnologias de informação e comunicação. Qualquer barreira que as mulheres possam pensar que existe no que toca à sua entrada na área da tecnologia, não existe verdadeiramente. Muitas dessas “barreiras” são impostas socialmente, mas o certo é que o esforço, a dedicação e a paixão pela tecnologia são as bases para chegarem onde quiserem.

Acima de tudo, é importante reter que, independentemente do género, todos podemos ter um contributo a dar e fazer a diferença, porque somos, de facto, todos diferentes, e é na partilha de visões que se encontra o caminho certo a seguir para alcançar o sucesso. E este racional aplica-se a todas as áreas, não só à da tecnologia.

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