Com uma carreira de quase três décadas há muito que José Miguel Dentinho perdeu a conta aos vinhos que provou. Fala sobre vinhos com um saber e uma paixão capazes de captar a atenção dos mais distraídos e até dos desinteressados sobre o tema. Não consegue beber um vinho como o comum dos mortais. Enquanto o saboreia, tenta ‘casá-lo’ com uma comida, de forma a que ambos, vinho e comida, saiam valorizados da relação. É júri de vários prémios nacionais e, desde o ano passado, também de alguns internacionais. Recentemente, esteve na Bulgária onde se estreou como júri do Concurso Mundial de Bruxelas 2016.
Organizou em exclusivo para a Executiva o primeiro jantar e curso vínico (inscrições aqui), que acontecerá a 21 de junho, pelas 18h30m, no restaurante A Pateira, que fica na Tapada da Ajuda, paredes meias com o Instituto Superior de Agronomia, onde se licenciou.
Há quantos anos escreve sobre vinhos?
Há 28 anos, tantos como tenho de jornalismo.
Como se entusiasmou por essa área?
Licenciei-me em Agronomia, no Instituto Superior de Agronomia, e tentei ser engenheiro agrónomo. Depois de quatro anos de experiência voltei à profissão que queria realmente ter, a de jornalista.
Não consigo resistir a uma prateleira de vinhos sem a olhar de alto a baixo. É útil para ver novidades e observar tendências.
Como era agrónomo, os meus chefes na altura entenderam que tinha de perceber vinhos, e foi assim que comecei a escrever sobre eles. É verdade que já provava muitos vinhos na altura. Gostava de sentir os seus aromas e sabores, e já pensava na sua conjugação com a comida. Com o tempo fui provando cada vez mais, seleccionado vinhos nas prateleiras, e escrevia sobre os que gostava mais.
Com o tempo, a paixão foi crescendo, não só com a evolução extraordinária do setor vitivinícola nacional, em toda a fileira, desde a vinha ao marketing e comercialização, mas também com o contacto com um universo que tem muito a ver com a natureza e o homem.
Hoje não consigo resistir a uma prateleira de vinhos, cá e lá fora, sem a olhar de alto a baixo. É útil porque há sempre coisas novas a surgir, mas também para observar tendências. E também não consigo apenas beber vinho. Olho, cheiro, saboreio e penso naquilo que senti. Volto a fazê-lo, penso qual seria a melhor comida ou comidas para emparceirar, e só depois é que vou bebendo, mas repetindo o ritual quase sempre. Se todas as pessoas fizessem isso, tomariam certamente decisões mais corretas na escolha de vinhos na prateleira ou no restaurante.
Já devo ter provado entre 20 a 30 mil vinhos.
É jurado de que prémios?
Sou jurado do prémio Escolha de Imprensa, da Revista de Vinhos, do Concurso de Vinhos do Douro Superior, e de vez em quando faço parte de outros, mas geralmente não tenho tempo. A internacionalização é recente. Em Novembro de 2015 fiz parte do júri do Concurso Tempranillos al Mundo 2015, da Federação Espanhola de Associações de Enólogos. Este ano integrei o júri do Concurso Mundial de Bruxelas 2016, que decorreu em Plodviv, na Bulgária.
Em quantas provas participa, em média, por ano?
Além dos vinhos que provo em casa, dos eventos realizados pelos produtores, das feiras de vinhos, e dos concursos que referi, sou também membro do painel de provas de vinhos do Instituto Superior de Enologia (teses finais de curso, pós-graduações, mestrados e doutoramentos).
Quantos vinhos já terá provado ao longo da carreira?
É difícil de contabilizar. Mas o número deve estar entre 20 e 30 mil. Há quem prove muito mais, como o Manuel Moreira [escanção com vários prémios internacionais e formador da Executiva Wine Academy], por exemplo.
Vibro sempre mais com um bom espumante ou champanhe.
O que o faz vibrar quando prova um vinho?
A elegância e a complexidade de aromas que se vai sentido à medida que a sua temperatura sobe. As pequenas diferenças que refletem, por exemplo, o terroir. A forma como se conjuga com a comida para proporcionar mais prazer a cada prato.
Qual o vinho mais surpreendente que já provou?
Como, felizmente, há sempre boas surpresas a acontecer no mundo dos vinhos, é muito difícil selecionar uma.
Qual o seu tipo de vinho preferido?
Depende das ocasiões. Mas vibro sempre mais com um bom espumante ou champanhe.
Tem uma garrafeira em casa?
Sim, com cerca de 800 garrafas.
Qual a experiência mais marcante que teve como jornalista de vinhos?
Tive e tenho muitas experiências marcantes neste mundo dos vinhos. Mas há uma de que me lembro sempre: a da primeira vez que provei um Porto Vintage. Foi numa deslocação à feira Alimentária, de Barcelona, para fazer uma reportagem sobre o evento, quando ainda estava a dar os primeiros passos nesta área.
O momento único da minha carreira foi ter provado um Porto vintage com quase 50 anos.
Entre a delegação portuguesa estava o Instituto de Vinho do Porto, agora Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto. A primeira vez que me aproximei do stand, Luis Roseira, produtor da Quinta do Infantado, convidou-me a provar um vinho. Pegou num decanter que estava sobre a mesa, e serviu-me um copo de um vintage que, soube depois, era década de 40. Tinha, na altura, 48 ou 49 anos e era um vinho vivo, muito complexo de aromas, ainda cheio de fruta, com uma frescura fantástica. Um momento único, que nunca mais se repetiu.
Qual o melhor conselho que recebeu sobre vinho?
Estou sempre a aprender nas boas conversas que se geram à volta do vinho.