O mote dado pelas irmãs Sá da Bandeira (e que aqui serve de título) descreve bem o conceito da Mad Mary, o espaço que abriram em parceria no n.º 29 da Rua Rodrigues Sampaio, em julho de 2016, e que junta à mesa o prazer do pão como alimento essencial e um menu com alternativas saudáveis e gourmet.
Para Maria, este é “um sonho antigo que até já estava meio arrumado na gaveta”. Deixou para trás o trabalho em relações públicas, que a fizera passar por hotéis emblemáticos da capital, como o Bairro Alto Hotel e o Valverde. Sentia-se realizada e gostava muito do que fazia, mas decidiu juntar-se ao projeto da irmã e arriscar numa velha paixão. “A cozinha sempre foi uma área que adorei. O que me levou a dar o salto? Vontade de crescer. É sempre um passo que se dá com um certo medo, mas é um desafio.” Ganhou-lhe o gosto vinte anos antes, quando trabalhou em Nova Iorque numa casa especialista em saladas, comida gourmet e saudável, temperos diferentes, e que lhe abriu o apetite para fazer algo semelhante. “Daí ter-me juntado à Madalena neste projeto, um pouco na mesma vertente.”
O pão em primeiro lugar
Madalena vinha da Banca, depois de 26 anos no Banco Espirito Santo terminados no início de 2014, aquando da crise que afetou a instituição. Fez a sua carreira toda no banco, onde começou como “caixa” e terminou na direção. O Mad Mary era um sonho que queria realizar há muito, mas nunca teve coragem de trocar a vida confortável que tinha para dar vida ao sonho. “Às vezes é preciso que alguma coisa nos abane, por um bom ou mau motivo, e nos faça dar esse passo em frente. No meu caso não foi por um bom motivo. Estava a trabalhar num projeto muito interessante e desafiante em França, liderava uma equipa de 30 pessoas espalhadas pelo país e adorava o que fazia”, partilha.
O objetivo é recuperar nos portugueses o hábito de comprar pão fresco diariamente.
Sempre disse que, se abrisse um negócio próprio, teria de ser uma padaria. “Em França fui fazendo vários pequenos cursos de padaria e bolos. Recebia muitos amigos em casa e o pão feito por mim era uma das coisas que sempre gostei de lhes proporcionar. Lá, é mesmo visto como um bem essencial, toda a gente o compra de manhã e à tarde. Aqui a realidade é bem diferente: as pessoas têm um bocado de aversão ao pão porque dizem que engorda; não o compram fresco, congelam-no. Nesse aspeto, achava que fazia falta um projeto como este, mas não é fácil criar esse apetite nos portugueses. Quando nos instalámos aqui, não foi por acaso, e sim a pensar que estávamos inseridas numa zona de escritórios e que as pessoas podiam sair do trabalho e levar pão acabado de cozer para casa.”
As irmãs estão presentes em todas as frentes, de segunda a sábado, das sete e meia da manhã às oito da noite. “Até ao meio dia estamos na cozinha, depois vimos atender os clientes; às quatro da tarde vamos às compras e às onze da noite ainda estamos a falar sobre o que correu mal e bem… e amanhã é outro dia. Criámos o nosso posto de trabalho e fazemos de tudo aqui”, diz Madalena com um sorriso.
Sem experiência na restauração, todos os dias são de aprendizagem para as irmãs Sá da Bandeira.
Aprendizagens diárias
A hora de almoço é o período mais concorrido, mas ainda querem dinamizar mais os pequenos almoços, apostar nos fins de tarde e happy hours com alguma programação, e estão disponíveis para fazer eventos ou jantares. Se as saladas eram a especialidade que, inicialmente, atraía uma maioria de público feminino, diversificaram a ementa com pratos do dia e risotos e, com eles, a diversidade de género da clientela. “Aos poucos a curiosidade fê-los virarem-se mais para as saladas, as lentilhas, o arroz selvagem, a granola. Hoje eles procuram mais comida saudável”, revelam as irmãs.
Que lições aprenderam então em seis meses de negócio? “O negócio da restauração tem muitos quês e essa experiência não a tínhamos. Tem sido uma aprendizagem diária e sentimos que o que estamos a viver agora não tem nada a ver com o que vivemos num primeiro momento. Porque a ansiedade era enorme, não sabíamos se estávamos a fazer as coisas certas, não tínhamos bem a noção das quantidades do que se consome – a restauração é um negócio que tem de gerir o desperdício. Tenho um filho que tirou um curso de cozinha e ajudou na parte de fichas técnicas. Fiz um curso online de gestão de restauração, da Aresp. Hoje sentimos que talvez não tenhamos divulgado tão bem a parte de padaria, no início. É importantíssimo pensar em como apresentar um novo negócio ao consumidor e temos uns erros iniciais nesse aspeto. Mas não gostaríamos de alterar o nosso projeto inicial: produtos frescos, de grande qualidade, gourmet. “
Para já a dedicação ao negócio é total, mas mesmo sem tempo para mais nada as duas irmãs estão satisfeitas com o seu novo projeto.
Maria faz o balanço destes seis meses de aposta: “Este projeto é recompensador porque me preenche interiormente. Por outro lado, abdiquei de muita coisa e não tenho tempo para nada. Tenho dois netos e mal os vejo porque saio daqui estoirada. Perder estes pequenos prazeres da vida custa um bocadinho. Mas estamos a trabalhar muito para um dia podermos ter mais tempo. O início de qualquer projeto é sempre assim, mais duro. Requer dedicação total.” Afinal, é esse o fermento que faz crescer o sucesso.