Como enfrentar “o medo gigante” em tempos de imprevisibilidade

No primeiro painel de debate da 6ª Grande Conferência Liderança Feminina as líderes Sara do Ó, Laura Galhardo Simões, Filipa Montalvão e Cristina Saiago partilharam quais foram os seus pontos de força num ano de imprevisibilidade e como estão a transformar as suas organizações no regresso ao "novo normal".

Cristina Saiago, da Clarins, Filipa Montalvão, da White, Laura Galhardo Simões, da Vorwerk/Bimby, e Sara do Ó, do Grupo Your, no painel Liderar na imprevisibilidade.

De regresso à Universidade Católica, onde se realizaram as duas primeiras edições deste evento, a 6º Grande Conferência Liderança Feminina trouxe ao palco do Auditório Cardeal Medeiros, na manhã de 14 de outubro, painéis ecléticos de debates e especialistas sobre o tema da presença das mulheres enquanto líderes das organizações. O evento, organizado pela executiva.pt contou com a apresentação de Fátima Lopes e com a transmissão em streaming na Internet e redes sociais.

No seu discurso de boas-vindas, Isabel Canha, directora e cofundadora da Executiva, salientou a emoção de estar de volta aos eventos presenciais, depois de um ano em que estes estiveram interditados, bem como a resiliência que levou a que tantas mulheres líderes se destacassem num último ano tão crítico a nível global. “Em todo o mundo foram as mulheres quem mais perdeu os seus empregos e quem mais teve de se desdobrar no papel de profissionais e cuidadoras da família, quem mais sofreu de burnout… De tal forma que a expressão ‘primeira recessão feminina’ começa a implantar-se para descrever o impacto que a pandemia provocada pela Covid-19 teve sobre as mulheres. Mas apesar de principais vítimas, não baixamos os braços. À frente de Estados, de empresas e de outras organizações, as mulheres emergiram como melhores líderes e evidenciaram o seu papel visionário, conciliador, organizador e também cuidador.”

Isabel Capeloa Gil, reitora da Universidade Católica, lembrou como esta instituição de ensino se tem vindo a destacar por abrir caminhos à liderança paritária como uma das poucas instituições superiores de ensino que “não tiveram apenas uma, mas contam com duas mulheres a liderar a reitoria. “A segunda e terceiras reitoras é que demonstram a consistência na política de empoderamento das mulheres. Tenho o prazer de ter uma equipa paritária de diretores de unidade com uma representação feminina forte e esse exemplo é muito importante para a organização porque os estudantes têm de se reconhecer nas lideranças. Temos 52% de alunas, que têm que reconhecer em quem as lidera a capacidade de as fazer aspirar e de desenvolver capacidades que as façam transformar o mundo. Sabemos que é necessário que isto se reflita também a nível das estratégias de ensino e das iniciativas para o reconhecimento da liderança feminina na área das empresas”

O primeiro painel de debate, ‘Liderar na Imprevisibilidade’, juntou Sara do Ó, CEO do grupo Your, Laura Galhardo Simões, sales director da Bimby, Filipa Montalvão, partner da White Way, e Cristina Saiago, diretora-geral da Clarins em Portugal, que partilharam os seus maiores desafios e as grandes lições que aprenderam ao longo deste último ano tão desafiante e marcado por mudanças drásticas na vida das organizações. De forma abrupta, a pandemia da Covid-19 pôs em risco as bem sucedidas estratégias de negócio das suas empresas, apresentando novos paradigmas em diferentes áreas.

“Foi muito importante passarmos tranquilidade através de uma comunicação constante, porque as pessoas precisam de sentir essa segurança em tempos de imprevisibilidade.” Laura Galhardo Simões, sales director da Bimby

Laura Galhardo Simões, que assumiu o pelouro das vendas e marketing da Bimby em janeiro de 2020, apanhando o início da pandemia pouco depois, deu início à conversa, em que as quatro líderes partilharam abertamente as suas experiências mais marcantes nos últimos meses. “Foi um grande batismo de liderança. Em primeiro lugar era preciso garantir a segurança dos nossos colaboradores independentes e dos nossos clientes. Como assegurar o rendimentos de duas mil pessoas que colaboram connosco, sem poder entrar em casa dos nossos clientes, como seria a nossa estratégia? Em três dias, implementámos aquilo que acreditámos que era o melhor plano para continuarmos o nossos negócio. Foi muito importante passarmos tranquilidade através de uma comunicação constante, porque as pessoas precisam de sentir essa segurança em tempos de imprevisibilidade. É preciso alinhamento e muita comunicação.”

Uma tranquilidade que Filipa Montalvão, partner da empresa de comunicação estratégica White Way, confessa não partilhar inteiramente. “Começámos a receber emails do nosso CEO a falar-nos de que isto ia acontecer e que era preciso que todas as agências do grupo começassem a testar o trabalho remoto, uma semana antes do confinamento.” Aquilo que a princípio lhes pareceu um exagero acabou por se comprovar e representar um desafio logístico gigante para a instalação do homeoffice em casa dos colaboradores e criativos e também uma radical mudança de processos de trabalho criativo. “O principal desafio foi perceber como passar essa calma e confiança quando os próprios líderes estão um pouco incertos do que vai acontecer. Passá-la foi essencial, tal como a mensagem de que estávamos todos no mesmo barco e a viver a mesma coisa.” 

Cristina Saiago, directora-geral da Clarins, partilhou como a crise acabou por trazer novas oportunidades à marca. “Nesta crise, apesar do segmento de maquilhagem ter ficado adormecido durante muito tempo, o segmento de tratamentos de cuidados de pele subiu rapidamente porque as pessoas estavam em casa, tinham mais tempo e passaram a fazer outras escolhas, cuidando mais de si com tratamentos de rosto e corpo.” 

“Esta crise pôs em evidência as fragilidades do tecido empresarial português, nomeadamente a falta de literária financeira. De repente vimos os nossos clientes com muito mais vontade de entender conceitos como o que é um fundo de catástrofe, aos planos de negócio e poupanças.” Sara do Ó, CEO do Grupo Your

Para a “otimista incurável” Sara do Ó, a primeira palavra que marcou o início da crise enquanto líder foi o medo, partilhou. “Senti um medo gigante pela minha empresa, pelos meus colaboradores e clientes, mas também pelo país. Na área do suporte às PME’s houve uma dupla dor, de olhar para o negócio e pensar se estávamos preparados para ter 300 pessoas em casa, e a dor de perceber como iríamos dar o nosso melhor. O medo das decisões erradas era imenso e havia uma procura enorme pelas respostas e decisões certas, mas com um medo enorme de aconselhar. Esta crise pôs em evidência as fragilidades do tecido empresarial português, nomeadamente a falta de literacia financeira. De repente vimos os nossos clientes com muito mais vontade de entender conceitos como o que é um fundo de catástrofe, e atentos aos planos de negócio e poupanças. Esta dor da sobrevivência é a dor da verdade, porque houve muitas portas que fecharam. Adotei logo o slogan ‘começamos isto juntos, acabamos isto juntos’, e isso não significaria necessariamente acabar bem. Nunca fomos tão empáticos, estávamos de facto todos juntos.” 

Para Laura Galhardo Simões, uma das grandes lições que transpiram agora para esta nova fase, que se quer de sucesso e retoma para as empresas , é a da importância da solidariedade das equipas e da aprendizagem rápida, onde saber como começar a usar as novas tecnologias de comunicação à distância foi vital para a manutenção do negócio. “Foi preciso passar do presencial ao digital numa questão de dias. Tivemos senhoras de 70 anos a aprenderem a fazer diretos para a internet. Nunca tínhamos feito reuniões motivacionais online e fizemos isso. O sentido de urgência que experimentámos no início mantém-se.” 

“Os projetos à distância aconteceram e as equipas adaptam-se mas ainda estamos a testar o que foi de melhor do que passámos e o que queremos recuperar do que perdemos com esta crise.” Filipa Montalvão, partner da White Way

Essa aprendizagem ainda é um processo em curso, comentou a partner da White Way, Filipa Montalvão, pensando nas estratégias adoptadas durante este período que querem adotar para o regresso ao escritório e ao trabalho presencial. “Já estamos numa segunda fase mas isto ainda não está estável. Os projetos à distância aconteceram e as equipas adaptam-se mas ainda estamos a testar o que de melhor passámos e o que queremos recuperar do que perdemos com esta crise. Creio que todas as equipas estão neste momento a testar formatos do que de melhor se adapta ao negócio e aos processos de trabalho.” 

“Uma cultura de confiança e calma faz com que toda a gente se junte para ultrapassar dificuldades e a resiliência vem mesmo daí: toda a gente quer fazer parte da solução.” Cristina Saiago, diretora-geral da Clarins

“As pessoas são o maior ativo das empresas e se cuidarmos delas, elas cuidarão das empresas”, comentou Cristina Saiago. “A comunicação nesta altura em que não víamos luz ao fundo do túnel foi essencial, dando direção às pessoas, recordando o que é a marca e para onde queremos ir. Uma cultura de confiança e calma faz com que toda a gente se junte para ultrapassar dificuldades e a resiliência vem mesmo daí: toda a gente quer fazer parte da solução.”

Outra das consequências deste período foi uma maior aproximação entre equipas e os coletivos das empresas, apesar de se ter perdido em proximidade física. Cristina Saiago falou da ligação directa online com clientes, que se refletiu em muitos casos numa maior relação e aproximação destes às marcas, enquanto Laura Galhardo Simões lembrou como as equipas da Bimby usaram o digital para partilharem processos de trabalho em diferentes regiões do país. O reencontro do regresso ao escritório foi também importante no grupo Your, com lições importantes aprendidas pelo caminho. “Creio que esta foi uma oportunidade única de aprendizagem para mim, quando foi preciso parar para repensar o negócio de forma a salvá-lo”, comentou Sara do Ó. “Parar para refletir e olhar para as segundas linhas de direção, que em todo lado vi a entrarem em ação tomando decisões rápidas. Que esta agilidade venha para ficar.” 

 

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