A empresa J. Carranca Redondo, Lda, é fabricado na Quinta do Meiral na Lousã (distrito de Coimbra, Portugal). Com mais de 12 hectares, parte das plantas e sementes aromáticas utilizadas no seu fabrico são aqui produzidas, permitindo desta forma um maior controlo da qualidade. Os restantes ingredientes são importados de locais tão distantes como a Índia, Sri Lanka, Brasil e Turquia, entre outros. À frente do marketing desta empresa centenária, está Estíbaliz Vicario, espanhola que por casamento faz parte da família Carranca Redondo.
Quando e como se deu a sua entrada na empresa produtora do Licor Beirão?
Comecei o meu contributo em março de 2006. Eu tinha sido mãe recentemente, estava em plena licença de maternidade, e passava grande parte do meu tempo na Quinta do Meiral, residência da família Redondo e morada da sede da empresa e fábrica. Na altura a empresa – J. Carranca Redondo – estava num bom momento e as solicitações começavam a ser demasiadas para os recursos humanos existentes. Comecei, então, a dar uma ajuda ao Daniel, meu marido e neto do fundador. Em outubro de 2006, percebi que o meu futuro passaria mesmo pelo Licor Beirão e comecei a trabalhar no Departamento de Marketing a tempo inteiro.
Como foi recebida na família?
Fui muito bem recebida, tanto no seio família, em 1999 quando me mudei para Portugal, como, posteriormente, na empresa.
Que experiências profissionais e académicas tinha já?
Quando cheguei a Portugal estava, na altura, a tirar a Licenciatura em Gestão de Empresas, começada na Universidade do País Basco e que terminei na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Pelo meio estudei em Groningen, no norte da Holanda, cidade onde vivi ao abrigo do programa Erasmus – foram três instituições de ensino e três países diferentes em cinco anos de estudos. Assim que terminei a licenciatura a entrada no mercado de trabalho foi direta: primeiro como diretora de um centro de formação e depois na J. Carranca Redondo.
Quando estudou que sonhos profissionais tinha?
Apesar de me considerar uma pessoa que não define projetos a longo prazo, escolhi gestão, e posteriormente marketing, de olho no futuro. Na altura, considerei que estas seriam áreas que me dariam alguma polivalência para enfrentar o mercado de trabalho. Numa fase inicial, esta decisão também foi influenciada pelas escolhas do meu irmão que estudava economia. A juntar a estes factos, havia também o meu gosto pessoal por publicidade… Sempre me lembro de devorar anúncios e decorar slogans e jingles. No entanto, quando era adolescente achava que o meu futuro seria em Bilbao, a trabalhar num banco ou numa agência, e tinha ainda o sonho de fazer voluntariado nas zonas mais carenciadas da América do Sul, algo que ficou por concretizar.
Que dificuldades sentiu por ser mulher e estrangeira, ao entrar numa empresa familiar portuguesa?
Eu fui entrando na empresa sem que nada tivesse sido planeado. Comecei por ajudar e colmatar uma necessidade, no final acabei por ficar porque era o que fazia sentido. Nunca sofri nenhum constrangimento por entrar na empresa, porque eu já cá estava, já fazia parte. Ser mulher ou ser estrangeira nunca foi um impedimento ou um constrangimento em nenhuma situação. Percebo que há sempre uma curiosidade bem viva nas pessoas de entenderem o que é que uma espanhola faz numa empresa da Lousã, depois percebem a minha ligação pessoal com a família, descobrem que sou casada com o Diretor Geral da empresa e tudo faz sentido, mas é algo que vejo de forma natural.
Como se adaptou a mudar de país e residir numa pequena vila em Portugal?
Eu vinha de Bilbao, uma das maiores cidades de Espanha, e chegar à Lousã, uma vila com 15 mil habitantes, foi um choque em alguns aspetos. Estava habituada a um núcleo onde ninguém me conhecia e passei para um meio onde, por várias razões, sempre existiu alguma curiosidade à minha volta: por ser espanhola, por ser uma mulher mais alta do que o “normal”, por trabalhar numa grande empresa ou pela minha ligação pessoal à família. Mas aceitei essa condição inicial e adaptei-me bem.
Qual a sua missão enquanto responsável pelo marketing da Licor Beirão?
A minha missão é perpetuar o legado de José Carranca Redondo, o espírito visionário do fundador da marca, fazendo muito com pouco. Esta é a minha missão e a de todos os colaboradores da empresa. É algo intrínseco, que é incutido de uma forma muito natural, e é o que norteia o nosso percurso dentro da empresa. Quanto à minha função em específico, sou responsável por fazer cumprir o plano de marketing e comunicação que definimos, anualmente, para o Licor Beirão e Beirão D’Honra, bem como para cada uma das marcas que representamos através da Companhia Espirituosa.
Quais as principais mudanças que introduziu na comunicação da imagem do Licor e que resultados foram alcançados?
Quando comecei a trabalhar no Licor Beirão, o Daniel já estava há alguns anos na empresa e já tinha começado a definir o caminho futuro. Na mesma altura entrou o meu cunhado Ricardo, e os três juntos começamos o processo de rejuvenescimento da marca. Conseguimos recuperar o legado da marca e alguns valores já esquecidos, transformámos a marca numa love brand, enaltecemos a sua portugalidade e aproximamo-nos do público mais jovem. Esta foi a minha grande contribuição, e ainda o é porque este é um trabalho contínuo, um caminho que nunca está percorrido.
Enquanto espanhola de nacionalidade, o que sente a trabalhar uma marca portuguesa tradicional?
Eu venho do País Basco, portanto ser nacionalista faz parte da minha herança genética. Aquilo que sempre senti pela minha cidade e pela minha cultura é canalizado para aqui. Sinto que interiorizar a portugalidade da marca e a sua vontade de ser um símbolo associado a Portugal é um aproveitamento de quem eu sou e da forma como sempre vivi. Adaptei-me bem a um país que não é o meu, fui bem recebida pelos portugueses, e pela família que passou a ser minha, e essa força sempre foi um recurso que usei em prol do sucesso do Licor Beirão.
Quais os seus projectos para o futuro?
A passagem à quarta geração da família Redondo é um projeto a médio prazo que quero preparar da melhor forma. Quero deixar-lhe um legado valioso e um caminho bem traçado. E estendo este desejo também à equipa que estamos a formar: quero ajudar a que estejam preparados para ser autónomos a levar o nome do Licor Beirão longe, como o faz qualquer pessoa da família. E gostava muito que esta nossa força fosse também, a médio prazo, uma pegada solidária. Na minha opinião, ainda nos falta construir uma obra solidária, uma instituição, uma fundação, algo que enriqueça o nosso futuro e que seja um bom uso do nosso valor enquanto marca. Na verdade, talvez já estejamos a trabalhar nisso…
A empresa J. Carranca Redondo, Lda, produtora do Licor Beirão, nasceu em 1940, mas a história deste licor é mais antiga. Ainda sem o apelido Beirão, o licor já se fabricava, na vila da Lousã, numa farmácia, há mais de um século. Mas o nome do Licor Beirão não aparece por acaso. Em 1929 realizou-se um Congresso Beirão em Castelo Branco e o licor foi assim baptizado em homenagem ao encontro. São as dificuldades trazidas pela 2ª Guerra Mundial que fazem com que a fábrica seja vendida, em 1940, a um jovem natural da Lousã, José Carranca Redondo, que ali trabalhou durante algum tempo. Com pouco mais de vinte anos e entretanto casado, decide investir as suas poupanças comprando a casa e o segredo, dedicando-se de corpo e alma ao licor que passou a ser fabricado pela mulher. Desde então as vendas não pararam de crescer, tornando-se, na actualidade, num licor de grande sucesso.