A edição especial Best Of 10 anos Executiva, lançada ontem no El Corte Inglés, celebra uma década do site Executiva. Junta entrevistas, testemunhos e citações de 140 mulheres líderes em Portugal entrevistadas pela Executiva ao longo dos últimos 10 anos, e também de alguns homens que destacam as mulheres da sua vida.
O que pensam, sentem e fazem as executivas portuguesas, pode ser lido nas 300 páginas desta edição de colecionador. As leitoras ficam a conhecer alguns dos desafios que é necessário enfrentar, como se ultrapassa o medo e a dúvida em momentos chave, como se lideram e motivam equipas, como se lida com o erro, como se conquista visibilidade dentro e fora da empresa, e como é possível manter o equilíbrio entre a vida profissional, pessoal e familiar.
Isabel Canha: “Partimos para esta aventura com um misto de receio e entusiasmo”.
Aos 50 anos, as jornalistas Isabel Canha e Maria Serina, que somavam mais de duas décadas de experiência em revistas de negócios, criaram o site Executiva. Foi a concretização de um sonho, que nasceu em 2015, e a sua estreia como empreendedoras: um meio de comunicação social que desse voz a mulheres líderes, que, com o seu exemplo, inspirassem outras mulheres a trilhar o mesmo caminho, se assim o desejassem.
Determinadas em dar visibilidade e o merecido palco às mulheres em posições de liderança, “partimos para esta aventura com um misto de receio e entusiasmo”, revela Isabel Canha, cofundadora e diretora da Executiva. “Medo de arriscarmos num negócio que poderia facilmente correr mal. Sempre trabalháramos em grandes grupos de comunicação e, por isso, não tínhamos experiência enquanto empreendedoras e preparávamo-nos para lançar um projeto numa área em forte crise e em completa reestruturação: a comunicação social. Entusiasmo porque íamos, finalmente, dar asas à nossa ambição de lançar um negócio em que poderíamos definir o nosso caminho, e dar corpo ao nosso sonho: o de um produto editorial para mulheres de carreira.”
Há dez anos ainda se ouvia dizer que não havia mais mulheres líderes porque, simplesmente, não havia mulheres preparadas para assumir a liderança de empresas e organizações. Hoje esta ideia soa despropositada. “Há um pipeline de mulheres muito bem preparadas e competentes”, diz Isabel Canha que acredita que a Executiva tem sido um motor da transformação, ajudando a formar líderes mais seguras, capacitadas e preparadas para moldar um futuro mais igualitário e inclusivo. “Ter mais mulheres na liderança de empresas é uma questão de justiça, de dar as mesmas oportunidades à outra metade da população mundial. Mas é também muito importante para as organizações. Está provado que as empresas lideradas por mulheres obtêm melhores resultados e apostam mais na sustentabilidade económica e ambiental.”
Prosseguindo a missão de valorizar o trabalho das mulheres, a Executiva tem deixado uma forte marca, ao longo desta década, com muitas e variadas iniciativas. Soma no seu portfólio 7 revistas e 8 livros. Realizou 12 Grandes Conferências Liderança Feminina e 6 conferências com outras temáticas, com destaque para a de dinheiro e a de saúde da mulher. Foram lançados dois prémios: As Mulheres mais Influentes de Portugal, com 9 edições, e Executivas do Ano, na 2.ª edição. Na área da formação, contam-se quatro Bootcamps e 5 programas OSA – One Step Ahead, estes últimos em parceria com a escola de negócios AESE. “Não fizemos este caminho sozinhas. Longe disso! Todos os colaboradores deste projeto deixaram nele uma marca positiva e são merecedores do mérito de aqui termos chegado”, reconhece Maria Serina, cofundadora e diretora-adjunta da Executiva. “Sem as empresas e outras instituições que patrocinam as nossas iniciativas, elas seriam apenas boas ideias. A uns e a outros, aqui expressamos a nossa gratidão.”
Maria Serina: “Reparem como em 10 anos, a forma como vemos o mundo mudou completamente. Que mundo queremos daqui 10 anos?“
Quando lançaram a Executiva, as suas fundadoras diziam que o seu sonho seria que esta sua missão se tornasse irrelevante, porque se assim fosse as mulheres chegariam à liderança das empresas pelo mérito. Admitem que hoje, receiam que a Executiva se possa tornar irrelevante se as mulheres deixarem de ter o direito de chegar às funções que ambicionam e merecem. “Reparem como em 10 anos, a forma como vemos o mundo mudou completamente. Que mundo queremos daqui 10 anos?”, questiona Maria Serina, que garante estar cada vez mais apreensiva com o que vemos acontecer à nossa volta e que está a ameaçar seriamente os direitos das mulheres em diversas partes do mundo, sejam eles relacionados ao acesso à educação, à saúde, ou à igualdade no mercado de trabalho.
Basta lembrar um exemplo recente e tristemente emblemático que é o das mulheres no Afeganistão. “Como disse a atriz Meryl Streep num evento à margem da Assembleia Geral das Nações Unidas, ‘uma gata, um esquilo e um pássaro têm mais direitos do que uma mulher ou uma rapariga no Afeganistão'”, sublinha Isabel Canha, que avisa para a necessidade de continuarmos vigilantes e de não darmos as conquistas como garantidas.
A diretora e cofundadora da Executiva não esconde o orgulho do novo desafio que assumiu recentemente como embaixadora da Aliança ODS Portugal, uma iniciativa da Associação Portuguesa de Ética Empresarial e da Global Compact Network Portugal. “Viram em mim o conhecimento, a disponibilidade e o desejo de contribuir para a concretização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 das Nações Unidas”, salienta. Nos próximos três anos, vai prosseguir a missão da ODS na promoção da igualdade de género, e garante continuar a ser uma voz activa “para conseguirmos atingir aquilo que ainda não foi feito. Este é o meu papel enquanto embaixadora e enquanto jornalista, pois acredito que a comunicação social é um agente de mudança.”
Direitos que foram conquistados com décadas de luta e sacrifício estão, agora, sob ameaça de retrocesso, por isso “não podemos continuar a fazer de conta que isto não é connosco, que não vai chegar a nós”, alerta Maria Serina. “Na Executiva, nos próximos dez anos, e mais ainda, vamos continuar a trabalhar para um futuro em que o género na liderança não seja uma questão. Queremos que mulheres e homens tenham iguais oportunidades — e igual reconhecimento — para alcançarem as funções que ambicionam.”
Uma coisa é certa, garantem as fundadoras da Executiva, não faltam bons exemplos de mulheres a fazerem coisas extraordinárias que merecem ser conhecidas. Por isso, vinca Maria Serina “quem melhor do que Helena Sacadura Cabral, que conhece o nosso percurso e que foi pioneira numa época em que as mulheres começavam a subir na hierarquia das empresas, para nos falar da sua experiência e das impressões que a leitura deste Best Of 10 anos lhe inspiraram?”
Helena Sacadura Cabral: “Já ganhei mais do que os homens e isso nunca me atrapalhou.”
Aos 90 anos, mantém a jovialidade que sempre lhe conhecemos e que extravasa nas suas gargalhadas fáceis. Dona de uma frontalidade desarmante e com um percurso em que sempre ditou as regras, Helena Sacadura Cabral falou sem filtros, durante a apresentação desta edição especial, à plateia que encheu a Sala de Âmbito Cultural do El Corte Inglés.
Mulher dos sete ofícios, foi economista, professora, jornalista e escritora, com 46 livros editados, abarcando vários géneros literários. Mas também se interessou pelo design de joias e pela cozinha. Diz que em nove décadas continua a gostar de tudo aquilo que gostava e a fazer tudo aquilo que fazia. “Nunca perdi a vontade de fazer coisas, nem de lutar por aquilo que acho justo e escrevo todos os dias.” No balanço que faz da sua vida, diz sem hesitar que fez vários disparates, mas erros só cometeu um. E esclarece: “Foi casar-me.”
Irreverente convicta, Helena Sacadura Cabral nunca deixou de fazer o que lhe apeteceu. Com a oposição do pai, um advogado conservador, licenciou-se em Economia no ISCEF, com a plena convicção de que a “Economia podia ajudar a transformar o mundo” e foi a melhor aluna do seu curso. O seu jeito para os negócios revelou-se durante a faculdade e provando que era capaz de pagar os estudos, tornou-se ‘sebenteira’. Era dos seus apontamentos que “vendia à associação académica e ainda exigia um fee sobre cada venda” que se faziam as sebentas de estudo das matérias. Este seu primeiro negócio permitiu-lhe perceber o valor do trabalho. “Todo o trabalho tem uma remuneração e não é por ser mulher que devemos pedir menos.” E sublinha: “já ganhei mais do que os homens e isso nunca me atrapalhou.”
Consolidou uma carreira de economista num mundo de homens. Foi a primeira mulher a ingressar nos quadros técnicos do Banco de Portugal e desempenhou vários cargos de chefia na Administração Pública. Dessa fase, guarda como lição que “as mulheres são tão capazes de dirigir uma instituição, como o Banco Central, como os homens.”
Helena Sacadura Cabral: “As mulheres têm a capacidade única de estabelecer pontes.”
Sempre quis ter iguais oportunidades e fazer escolhas com a mesma liberdade com que um homem as faz. Sabe pilotar aviões, ou não fosse sobrinha do famoso aviador Sacadura Cabral, e o tempo que trabalhou na aeronáutica civil aguçou-lhe a paixão. Afirma que nunca sentiu na pele qualquer tipo de assédio, e diz com graça, “julgo que assustava os homens.” Orgulha-se de ser mulher e de se ter reinventado a cada obstáculo, e recusa-se a ver o mundo como os homens. “Não gosto de mulheres a gerirem como homens. Gosto que o façam com a sua capacidade de ver o problema daquela forma.” E destaca: “As mulheres têm a capacidade única de estabelecer pontes.”
Não tem paciência nem vocação para o sacrifício. Garante que só não voa “quem não quiser ter asas para voar” e a idade nunca a impediu de fazer o que sempre quis. Por isso, assume com convicção que a sua vida “começou aos 45 anos.” E lança um desafio final à plateia: “nunca desistam e não se limitem à vida profissional. Façam também da vossa vida pessoal uma vitória.”
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