Não desistir, mesmo quando os tempos são difíceis e os desafios duros: este poderia ser o mote dado pelas intervenções da cerimónia que distinguiu as 25 Mulheres Mais Influentes de Portugal. O Espaço Espelho d’Água, em Lisboa, recebeu ontem, 25 de maio, a 6.ª edição deste prémio, uma iniciativa do site Executiva que parte do estudo anual realizado pelo jornalista Filipe S. Fernandes e que este ano contou com o apoio da SEAT, Samsung e Clarins. O evento, que celebra o impacto positivo gerado pelas 25 profissionais que mais se distinguiram no nosso país em áreas como Ciência, Economia, Comunicação, Política, Artes ou Desporto, reconheceu a Ministra da Saúde, Marta Temido, como a portuguesa mais influente durante o ano que passou. A apresentação foi uma vez mais conduzida pela radialista Sónia Santos e contou com a presença da Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Rosa Monteiro.
“É importante alertar para os retrocessos”
Isabel Canha, diretora da Executiva, deu as boas-vindas aos convidados, salientando o “enorme significado que esta iniciativa tem para a Executiva, particularmente num ano tão difícil”, em que as mulheres estiveram também mais expostas a riscos sociais. “Por isso, faz ainda mais sentido assinalar o talento, capacidade de organização e trabalho daquelas que, em Portugal, mais se distinguiram. São modelos inspiradores para outras mulheres e isso é muito importante, porque não podemos ambicionar ser aquilo que não conhecemos, precisamos de referências. É com o objectivo de dar modelos à sociedade e às mais jovens que realizamos estes prémios.”
“Foram as mulheres quem mais perdeu emprego, quem mais viu as suas horas de trabalho reduzidas e também quem mais recorreu aos apoios extraordinários à família”, Rosa Monteiro, Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade.
Na sua intervenção, a Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade lembrou que Portugal tem vindo a avançar mais rapidamente que outros países europeus nos temas da representação feminina em cargos de decisão e liderança, “resultado de políticas afirmativas, leis, programas e projetos que reconhecem e inspiram esta transformação.” Rosa Monteiro salientou, no entanto, a necessidade de continuar a vencer desigualdades que se acentuaram mais no último ano, com a crise pandémica, e que deixaram as mulheres em maior vulnerabilidade para situações como o desemprego ou a violência doméstica. “É certo que as mulheres estiveram na linha da frente da resposta à crise pandémica e Portugal foi o único país que ficou bem na fotografia, no que respeita à paridade das equipas que lideram a resposta à crise. Mas a nossa preocupação foi também de alertar para o risco de retrocesso, nomeadamente de retradicionalização dos papéis de género. Foram as mulheres quem mais perdeu emprego, quem mais viu as suas horas de trabalho reduzidas e também quem mais recorreu aos apoios extraordinários à família”, disse a Secretária de Estado, acentuando a necessidade de vencer os desafios na área da Ciência e Tecnologias, com programas e medidas que incitem mais raparigas a segui-las, uma vez que os números atuais são preocupantes. Dirigindo-se às premiadas, finalizou: “Muitos parabéns a todas por serem exemplos de inspiração.”
“Representar outras vozes femininas” através da comunicação
As mulheres que se destacam na área da comunicação e informação voltaram, nesta edição, a ter um peso significativo na lista das mais influentes. A primeira a subir ao palco foi a atriz Rita Pereira, mais uma vez distinguida em grande parte graças à sua importante presença nas redes sociais enquanto influencer — só no Instagram tem mais de milhão e meio de seguidores. “É um grande orgulho receber este prémio por vários anos consecutivos, mas também vem com o peso da responsabilidade de ser uma das tão incríveis 25 mulheres, saber que estou a influenciar alguém e que as novas gerações estão a ouvir-me. É a responsabilidade de aprender, de ouvir, passar a palavra e comunicar sobre aquilo em que acreditamos e lutar por isso”.
“Fazem cada vez mais falta jornalistas influentes e gostaria muito de, num futuro mais próximo, ver esta lista engrossada com mais jornalistas”, Sandra Felgueiras, jornalista da RTP.
O jornalismo esteve representado por Sandra Felgueiras, distinguida pela segunda vez pelo seu trabalho enquanto jornalista de investigação aos comandos do programa de grande informação ‘Sexta às 9’, na RTP. “Este prémio é o reconhecimento de um sólido trabalho de equipa de um conjuntos de repórteres que têm a mesma dificuldade que eu em trazer a verdade à tona. Fazem cada vez mais falta jornalistas influentes e gostaria muito de, num futuro mais próximo, ver esta lista engrossada com mais jornalistas. Seria, sem dúvida, prova de uma boa saúde democrática, porque não há democracia sem liberdade de imprensa e não há liberdade de imprensa sem jornalistas livres.”
Ainda na área da comunicação, e outra das presenças já habituais entre a lista das 25 mais influentes, Ana Garcia Martins, autora do blogue e marca digital A Pipoca Mais Doce, aproveitou a sua intervenção para falar da importância do humor em tempos de desesperança e confinamento. “Além da minha influência nas áreas do entretenimento e o humor, aquelas em mais me movo e que acredito poderem ser uma mais-valia numa fase em que estamos todos mais tristes e vulneráveis, também quero usar a minha plataforma para falar em temas que me parecem prementes trazer para cima da mesa. Só posso estar muito agradecida por esta distinção.”
“Sei que grande parte da minha influência não pertence a mim diretamente, mas à antena da televisão onde estou todos os dias, sentada no sofá com muitas pessoas que me vêm contar as suas histórias de vida. Quero continuar a dar espaço a estas vozes”, Júlia Pinheira, apresentadora e diretora da SIC Caras e SIC Mulher.
O ano que passou marcou também o regresso de Júlia Pinheiro à Radio Renascença, onde assumiu o espaço de entrevistas “A Hora da Júlia”, para além da sua habitual presença televisiva na SIC, estação onde acumula ainda a direção da SIC Caras e SIC Mulher. Foi aí, contou, que ouviu muitas histórias femininas de dificuldade. “Sou muito pragmática e sei que grande parte da minha influência não pertence a mim diretamente, mas à antena da televisão onde estou todos os dias, sentada no sofá com muitas pessoas que me vêm contar as suas histórias de vida. Vejo, este ano, uma situação muito desequilibrada em questões paritárias, que se irá refletir ainda mais com o tempo, quando se começarem as fazer contas ao teletrabalho e às moratórias e a tudo o que vai aparecendo no atual contexto económico e que provam, mais uma vez, que as mulheres são as mais desprotegidas. Tenho recebido, quase exclusivamente nos últimos tempos, histórias de mulheres, quase todas de pobreza, de falta de proteção, de violência doméstica, problemas de saúde e falta de esperança. Quero manter a minha antena e todas as minhas tribunas para continuar a dar espaço a estas vozes porque, como costumo dizer, em mim habitam mil vozes femininas.”
“É preciso que a Ciência esteja sempre visível”
Isabel Jonet, diretora do Banco Alimentar Contra a Fome, começou a sua intervenção com um “obrigado à Isabel Canha e Maria Serina por não desistirem e pela sua capacidade de continuarem, apesar das dificuldades que se impuseram.” Salientou ainda a importância inspiracional deste evento. “As jovens olham para estas mulheres como modelos e fontes de inspiração para gerarem mudança e impacto. E mais do que as raparigas, são hoje também os rapazes que necessitam destes exemplos inspiradores.” Isabel Jonet aproveitou para lembrar a responsabilidade que lhe é confiada pelos voluntários dos Bancos Alimentares e do enorme peso social que esta instituição tem nos tempos atuais. “Hoje, 4,5% da população portuguesa recebe comida no seu prato que vem de um banco alimentar e sem estas mulheres e homens voluntários não poderíamos continuar. Quando recebo este prémio é também em nome de todas as mulheres e homens do sector social, que também não desistiram e que têm levado conforto, esperança a alegria a tantas pessoas que ficaram fechadas em casa, para que não fiquem ainda mais sozinhas.”
“As mulheres aqui premiadas mostram que há uma diversidade tão grande entre os seres humanos, que não pode ser perdida. Nós mulheres representamos 50% da população mas, por vezes, falamos nestes temas como se fossemos uma minoria,” Maria Manuel Mota, investigadora e diretora executiva do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes.
Maria Manuel Mota, cientista que se destaca pela sua investigação sobre malária desde 1995 e que é, desde há 7 anos, diretora executiva do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes, começou por falar da necessidade de se abordarem as questões de género por uma nova perspectiva. “As mulheres aqui premiadas mostram que há uma diversidade tão grande entre os seres humanos, que não pode ser perdida. Nós mulheres representamos 50% da população mas, por vezes, falamos nestes temas como se fossemos uma minoria. Não somos: a sociedade continua a contar connosco para 50% do trabalho necessário a ela. No ano que passou, vimos uma maior importância ser dada à Ciência, mas ela deve estar sempre visível. Falamos hoje muito de vacinação e de como ela mudou a nossa vida no século XX — e vai continuar a fazê-lo no séc. XXI. Mas ainda temos uma doença como a malária, que todos os anos mata mais de 500 mil crianças abaixo dos 5 anos. Essas mortes valem tanto como todas as outras. Precisamos de ter a noção de que a Ciência tem de continuar a trabalhar para todos esses processos e não podemos deixar de pensar que o mundo é mais do que Covid.”
A vacinação, mais concretamente o Plano Nacional a ela consagrado, foi eleito por Graça Freitas, diretora-geral de Saúde, como a sua “obra de vida”, à qual se dedica desde 1996. Mas é ao seu papel na gestão das questões de saúde pública durante a pandemia da Covid-19 que o seu nome ficará ligado. “No ano passado, nenhum de nós sabia o que nos esperar, na direção geral de Saúde, e acho que todos nós, homens e mulheres deste país, fomos capazes de lutar, de nos entreajudar, fomos de capazes também do melhor e de estar aqui hoje, cheíssimos de esperança, graças à Ciência, à sensibilidade, à boa-vontade e à colaboração de milhões de pessoas em todo o mundo.”
“Espero poder continuar a influenciar na minha área em específico, a da investigação científica, e espero vir a ter muitas raparigas a seguir o caminho da Ciência futuramente”, Elvira Fortunato, investigadora e vice-reitora da Universidade Nova.
2020 foi um ano marcante também para Elvira Fortunato, investigadora e vice-reitora da Universidade Nova. Galardoada com o Prémio Pessoa, recebeu ainda o WFEO GREE Award Women, atribuído pela Federação Mundial das Organizações de Engenharia, considerado o maior prémio mundial da engenharia desenvolvida por mulheres. A investigadora e vice-reitora aproveitou a sua intervenção para falar do importantíssimo papel da Ciência e da sua visibilidade durante o ano que passou, bem como dos mecanismos em curso destinados a minimizar a desigualdade de género na sua área de atuação e na Academia. “O que une todas as mulheres que aqui estão hoje é o facto de gostarmos todas muito do que fazemos. É a 6.ª vez que recebo este prémio e fico sempre muito contente por isso. A responsabilidade vai subindo, mas é sempre um gosto e espero poder continuar a influenciar na minha área em específico, a da investigação científica, e espero vir a ter muitas raparigas a seguir o caminho da Ciência futuramente, uma discussão que hoje em dia está em cima da mesa. Todos tivemos agora um contacto mais direto com a Ciência e com a importância que ela tem nas nossas vidas.”
Cláudia Azevedo, Paula Amorim e Cristina Ferreira fizeram-se representar na cerimónia por Leonor Sottomayor, responsável de Public Affairs da Sonae, Marcela de Mello Breyner, diretora de comunicação da Amorim Luxury, e Inês Mendes da Silva, CEO da agência Notable.
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