Carla Rebelo é diretora-geral do Adecco Group em Portugal
Num mundo que requer permanente adaptação, insistimos todos, é certo que ainda demasiadas vezes, em soluções convencionais. Os líderes procuram ferramentas de diferenciação, mas as que procuram hoje são com certeza diferentes de qualquer registo histórico jamais observado. Começámos uma tábua rasa em que a referência do passado já de nada servirá como a base para a tarefa vazia de tentar projetar o futuro.
É ponto assente que merecer o rótulo de “empregador de escolha” determinará o sucesso das empresas, e sim, de qualquer uma. A receita inclui normalmente garantir um ambiente de trabalho designado de felicidade e bem-estar, segundo se lê com frequência. Recrutam-se por todo o Globo os milagreiros chefes de felicidade (CHO – Chief Happiness Officer).
Porém, uma das coisas mais ansiogénicas é a busca constante pela felicidade e bem-estar.
A preocupação com a saúde mental integra (ainda que de modo cego) as agendas de todos executivos, num momento em que não vemos sequer a ponta do iceberg. Será necessário muito avanço na prática da medicina regenerativa para que se restaurem as lacunas e os processos inflamatórios deixados pelo isolamento prolongado. Serão só episódios agudos para já, mas que muito em breve passarão a crónicos perante a inércia das organizações (escolas, empresas, creches, residências de repouso) e sociedade civil em geral, através de intervenções precisas e que resgatem o ser, neste caso em modo híper humano para que a dose possa servir de contramedida.
A verdade é que ter saúde mental não é só a ausência de doença mental, mas sim e essencialmente dar aos outros a possibilidade de florescer. Esse florescimento acontece na convergência de fatores externos adequados. Dito de modo simples, tal e qual como uma planta necessita de sol e de água para se desenvolver.
A propósito de jardinagem, Alison Gopnik, professora na Universidade da Califórnia, estudiosa da evolução humana e autora do livro The gardener and the carpenter (2017) disserta sobre o valor de cuidar explicando-o à luz da metáfora dominante de que ser mãe ou pai é como ser um carpinteiro. Constrói-se um bom adulto, como um carpinteiro constrói uma boa cadeira, se os materiais forem bons, as ferramentas forem boas e o processo for bem desenhado. Só que não.
Gopnik acredita que a melhor metáfora é a de jardineiro (e não a de carpinteiro) na medida em que, como um bom jardineiro, com trabalho árduo, debaixo de chuva ou sol, pese embora o resultado não seja controlado, sempre algo aparece e floresce mesmo nos locais onde menos se poderia esperar.
O papel do jardineiro é então o de criar o ecossistema, que tem a capacidade de se ajustar às diversas e imprevisíveis circunstâncias, reservando sempre espaço onde a luz e a água criarão as condições para o florescimento natural.
Assim o mais seguro é que não se busque a felicidade, mas que se deixe o ser humano florescer, caso em que ela aparecerá naturalmente, sem ansiedades nem frustrações.
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