Quando trabalhei fora do país

Há uns dias, contava aos meus filhos sobre o tempo em que trabalhei fora do país, na Alemanha. Era recém-licenciada e estive uns meses a estagiar numa empresa alemã fabricante de compostos de plásticos e borrachas.

A conversa nem foi tanto pelo que estava eu lá a fazer, passou mais pela forma como eu me entretinha. A televisão era praticamente só alemã, com a exceção da CNN (acompanhei com afinco as eleições americanas entre o Bush e o Al Gore), não havia a internet de hoje — tirando uns sites de notícias, pouco mais havia — sem redes sociais, o cinema era dobrado (já disse que não falava o idioma germânico?). Restava pouco mais do que ler, bordar (sim, sim, fiz muito ponto-cruz), escrever, ter aulas de alemão, e visitar algumas cidades periféricas.

Eles comentaram, cheios de pena de mim: “Que seca, mãe!”

Não era seca, era mais calmo e serviu para me conhecer. Comecei a escrever e-mails semanais para familiares e amigos com algumas das minhas aventuras — antecipando o boom dos blogues uns anos depois —, os amigos ligavam, tive visitas quase todos os fins de semana. Comecei a cozinhar, a gerir uma (mini) casa, principalmente, aprendi a viver só comigo.

Enquanto estive fora do país fiz poucos amigos, uma família portuguesa apenas. E trabalhei muito. Tanto que, por vezes, o meu orientador nem sabia o que mais me dar para fazer.

Se hoje os contactos estão facilitados, toda a logística e componente emocional de uma mudança de país continua a ser desafiante. Recomeçar uma vida fora do país, procurar casa, iniciar um trabalho, conhecer pessoas, fazer amigos, aprender uma língua, tudo isso continua a ser novo, um esforço extra. Mas traz consigo um traquejo, uma noção de si mesmo e uma sensação de realização inigualável.

Ficamos capazes de avaliar de forma mais realista o nosso país, as nossas origens.

Emigrar não é fácil. Sozinha ainda menos. Apenas experimentei por uns meses e fiquei ansiosa por regressar ao meu país. E com um respeito tremendo por quem o faz a longo prazo.

Um respeito ainda maior por quem se meteu a caminho por terras novas quando a única forma de contacto era por carta. O que tiveram de estudar, trabalhar, ajustar e crescer sozinhos.

Iria outra vez, com data de regresso. Mas levaria comigo os meus.

 

 

Inês Brandão é fundadora e Global Business Manager da Frenpolymer. Leia mais artigos de Inês Brandão.

Publicado a 16 Novembro 2023

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