Quinta Nova renasce pela mão de Luisa Amorim

A mais nova das três filhas de Américo Amorim apostou na diferenciação, na qualidade da oferta e na sustentabilidade para transformar a Quinta Nova num negócio em que 50% da produção de vinho é exportada e num hotel de luxo premiado e a que não faltam clientes.

Quando Luisa Amorim começou a gerir a Quinta Nova, do Grupo Amorim, a marca praticamente não existia. Apenas havia um primeiro Vinho do Porto vintage, lançado pela Burmester. Com Ana Mota, diretora de produção da quinta, que ainda hoje é o seu braço direito, deu os primeiros passos de um projeto de produção de vinhos do Douro e do Porto que vende hoje 330 mil garrafas. Estava, com certeza, longe de imaginar que o enoturismo que também criou, constituído por um pequeno hotel de luxo, com 11 quartos, um restaurante, uma loja e vários outros espaços alcançasse tanto sucesso e impacto mediático. Recentemente, a Quinta Nova Luxury Winery House foi distinguida pela publicação Luxury Travel Guide como Luxury Country Retreat Award para 2017. Ou seja, foi considerada o melhor retiro de campo de luxo para o próximo ano, depois de ser distinguida com o título de Unique Luxury Hotel of the Year no ano passado pela mesma publicação.

Desde a infância, passada entre Espinho e Granja, que ganhou o gosto pelo contato com a natureza.

Luisa Amorim nasceu a 20 de Agosto de 1973, no Porto, e é a mais nova das três filhas do empresário Américo Amorim. Passou a sua juventude entre Espinho e Granja, a sul do rio Douro, onde teve uma infância feliz na companhia das irmãs e de muitas amigas, com espaço para brincar, andar de bicicleta e ir à praia. Com 15 anos mudou-se para o Porto, onde estudou e fez parte do percurso universitário.

Cedo descobriu que tem jeito para mais do que uma área específica de trabalho. Gosta, em particular, das áreas dinâmicas, de todas as que impliquem relações pessoais e com a natureza, algo que diz ter herdado da família. Não foi com as ligações que tem ao Douro que foi ganhando esse gosto, até porque a primeira vez que visitou a região duriense foi aos 24 anos. Foi, talvez nas férias que usufruiu desde criança no Alentejo e no Algarve, onde fazia “vida de sulista enquanto as gentes do Porto iam de férias para as praias do norte”.

Aprender sempre

Como queria dedicar-se à área do turismo, tirou o curso de gestão hoteleira. Primeiro no Porto, depois no Estoril. Terminou aos 21 anos e fez depois uma licenciatura em marketing, no Instituto Superior de Gestão e Administração (ISAG), do Porto. Mais alguns pequenos cursos de especialização em marketing e gestão, em Portugal e nos Estados Unidos, contribuíram para solidificar os seus conhecimentos.

Na Quinta Nova Luisa Amorim concilia o gosto pelo empreendedorismo e pela natureza.

Terminou os estudos com algum alívio, porque 40% das matérias não eram do seu agrado. Detestou todas as disciplinas que obrigavam a decorar, pois considera que “é preciso entender o porquê das coisas”, mas gostava e ainda gosta de estudar, fazer pesquisas e projetos. E também de aprender com todo o tipo de pessoas, nunca se escusando de fazer preguntas para saber coisas novas. “Começar a trabalhar foi fantástico”, diz Luisa Amorim. Fez estágios profissionais ligados à hotelaria na Quinta do Lago e na Quinta da Marinha. Esteve algum tempo a trabalhar num Hotel Mercure e no Casino da Figueira da Foz, “um mundo completamente diferente”.

Quando regressou dos Estados Unidos, iniciou um período de dois anos de enquadramento no Grupo Amorim, onde passou por diversos departamentos, em Portugal e no estrangeiro, com o objetivo de ter uma visão abrangente de todas as suas atividades. “Foi um trabalho que me fez percorrer o mundo inteiro”, explica.

“Era complicado trabalhar na holding, reunida em conselhos de administração, à secretária a ler papéis e folhas de Excel”. Queria pôr as mãos na massa.

Manteve-se na holding até 2000, quando assumiu a direção de marketing da Burmester, empresa produtora de vinhos do Porto e do Douro adquirida no ano anterior pelo Grupo Amorim. Dois anos depois voltou para a holding da família, onde esteve principalmente ligada ao desenvolvimento de novos negócios, entre eles a Barrancarnes, produtora de presuntos e outros produtos de porco preto, e a partir de 2005 ficou definitivamente afeta à Quinta Nova, que pertencera à Burmester.

Era um projeto novo, de uma marca que praticamente não existia, e o projeto certo para quem gosta da natureza, de relacionamentos interpessoais, essenciais no negócio do vinho, e de empreender. Para a sua maneira de ser, “era complicado trabalhar na holding, reunida em conselhos de administração, à secretária a ler papéis e folhas de Excel”. Queria pôr as mãos na massa, construir o seu próprio caminho.

Superar desafios

No ano passado, a Quinta Nova, teve um volume de negócios de 2,6 milhões de euros e as previsões para este ano apontam para um crescimento de 15% para o conjunto dos negócios da empresa, o enoturismo e a produção de vinhos, tanto no mercado doméstico como para exportação. Os mercados externos absorvem 50% da produção, sendo a Suíça o principal destino das garrafas, seguida do Reino Unido, estando também no Canadá, Estados Unidos, Holanda e Dinamarca.

Todos os membros da equipa têm de ser vendedores, pois isso é o ganha-pão da empresa.

Hoje a empresa tem uma organização comercial montada, com três pessoas, distribuidores regionais em Portugal e importadores internacionais. Mas, no início, Luisa Amorim teve também de assumir a área comercial, apesar de não se sentir à vontade nesse papel. “Fui eu que arranjei os primeiros clientes da empresa, apesar de ser essencialmente uma pessoa de marketing”, diz Luisa Amorim. Empreendedora, não esconde que gosta mais de desenvolver projetos e enfrentar e superar os desafios subsequentes. Mas na Quinta Nova, tem de ser vendedora, tal como qualquer dos membros da sua equipa. “É o espírito que imprimo nesta empresa. Todos, desde as pessoas que atendem o telefone aos que estão no armazém, têm de o fazer, pois este é o ganha-pão da equipa e toda a gente tem de sentir isso”, afirma

Colocar o enoturismo no mapa

Hoje a empresa assenta o seu negócio na produção de marcas próprias e no enoturismo. Quando fez o estágio de dois anos integração no negócio da família, Luisa Amorim viajou muito para conhecer toda a actividade do Grupo Amorim e visitou também clientes das regiões vitivinícolas mundiais que, na altura, já tinham os seus enoturismos bastante desenvolvidos. “Como cá havia tão pouca coisa nessa área, peguei em tudo o que tinha visto e aprendido e adaptei para a Quinta Nova aquilo que achei que podia ser usado na realidade do Douro”, explica.

Mais de 90% dos clientes do enoturismo são estrangeiros.

O projeto de enoturismo levou 11 anos a ser consolidado. Quando abriu a loja, o que aconteceu antes do hotel, passavam-se dias sem ter um só cliente. A marca era desconhecida e, devido à falta de qualidade das veredas estreitas e sinuosas da região na altura, a Quinta ficava longe até da cidade mais próxima, Vila Real, .“Chegar aqui representa muito trabalho”, conta Luisa Amorim, que defende que tudo na vida se consegue com empenho. É mais que trabalho, pois exigiu motivação, capacidade e vontade de galvanizar, acreditar que é possível. Hoje, apesar de as estradas ainda serem serpenteantes, como é natural numa região alcantilada como é o Douro, “os turistas surgem por detrás das árvores”.

O terraço do restaurante da Quinta Nova, o Conceitus, que serve uma cozinha assente na sazonalidade e nos produtos da terra.

O terraço do restaurante da Quinta Nova, o Conceitus, que serve uma cozinha assente na sazonalidade e nos produtos da terra.

É evidente que os caminhos estarem melhores ajuda, tal como a Quinta Nova estar no mercado há mais de 10 anos, depois ter sido uma das percursoras do enoturismo nesta região produtora de vinhos. Mas o argumento que melhor explica esta capacidade de atração da Quinta Nova é talvez o usado pelo Luxury Travel Guide, quando lhe atribuiu o prémio Luxury Country Retreat: “devido à forma como está integrada na paisagem do Douro e ao serviço distinto que presta a quem a procura”. No interior desta unidade, a sensação é que se está numa casa de campo tradicional (o que é verdade), com quartos confortáveis e agradáveis, mas não opulentos. No bar, nos terraços e mesmo no caramanchão junto à loja, há muitos recantos que convidam a momentos de lazer e contemplação, com ou sem um copo de vinho na mão na companhia de alguns do petiscos que a quinta oferece. Quem gosta de caminhar, pode andar por ali, pelo meio dos vinhedos, pois a paisagem não cansa.

“Estamos sempre a evoluir, e todos os anos tentamos sempre fazer algo melhor, adaptável à nossa região, à nossa tipologia de quinta e ao tipo de turistas que nos procuram”, diz Luisa Amorim, acrescentando razões para o sucesso do seu enoturismo. Actualmente, mais de 90% de quem procura a Quinta Nova são estrangeiros, principalmente casais entre os 30 e 40 anos e com mais de 60 anos. Há também muitos produtores, enófilos, e membros de clubes de vinho oriundos de todo o mundo.

Turismo direto

O enoturismo da Quinta Nova vive muito do turismo direto, individual, que procura via internet. Segundo Luisa Amorim, “são pessoas que gostam do bem-estar, do sossego, da paisagem, que fogem claramente da cidade e vêm aqui provar vinhos”. Andam a pé, interessam-se pela cultura local e querem apreciar o melhor de Portugal.

Luisa Amorim relembra uma visita que fez a Bali, onde lhe venderam o pôr-do-sol como algo extraordinário. Lá foi, com mais uns milhares de outros turistas, assistir a um espectáculo semelhante a muitos outros, que acontecem por todo o mundo e em cada canto do nosso País, mas que ninguém vende. E aqui não há, pelo menos por agora, “o barulho de mais 10 mil turistas, ao lado, a tirar fotos e a falar”, que tira o prazer ao usufruto da cena. Com esta história pretende salientar que há muitas coisas que fazemos bem, com qualidade, ou são belas e atrativas e simplesmente possuímos, como as paisagens. Como “temos as pessoas mais graciosas do mundo a receber os outros, não é preciso fazer muito mais”, defende.

A diferenciação é a única maneira de o mercado nos perceber.

Mas há uma coisa que os portugueses têm de fazer ainda melhor: vender o que temos, apostando nas nossas diferenças e no carácter único do nosso País, nas nossas pessoas e naquilo que fazemos bem, sem cair no facilitismo do volume e da massificação, insustentável no médio e longo prazo. Para Luisa Amorim, qualidade não é perfeição no Douro. É a excepção, a diferença. Defende que o estilo de cada marca e da casa que a produz deve ser seguido afincadamente. “É a única maneira de o mercado nos perceber”, defende, acrescentando que as pessoas que trabalham na empresa “têm de o entender, porque se nós não soubermos para onde vamos ninguém o consegue fazer”. Muito menos o consumidor, que não vai perceber onde a empresa e as suas marcas se posicionam num mercado tão imensamente competitivo como o do vinho. Na basta colocar à venda produtos de boa qualidade a bom preço. É preciso que sejam diferentes, que tenham um carisma que os distinga dos outros.

Aposta na inovação

Hoje a Quinta Nova, que tem 120 hectares, possui 85 hectares de vinha. Para além desta propriedade, o Grupo Amorim possui outra, no Douro Superior, a Quinta de São Cidrão, com cerca de 200 hectares, que ainda não começou a ser desenvolvida porque, para Luisa Amorim, os projetos têm de ser sustentáveis e, para isso, têm de ser desenvolvidos devagar, sem precipitações. Mais de 10 anos após o início de atividade, considera que ainda há muito a fazer para perceber as potencialidades totais do projeto, das castas plantadas na vinha e aquilo que o mercado quer da Quinta Nova e dos seus vinhos.

Não é preciso vender barato para se ser competitivo.

Considera, por exemplo, que o portefólio da empresa ainda está sobredimensionado. Mas isso acontece porque continua a inovar, a lançar novos produtos (como o recente vinho Mirabilis rosé reserva) na procura da oferta mais adequada ao mercado. De tal forma que, na última década, 40% do portefólio da Quinta Nova foi colocado no mercado e retirado. “Estamos a chegar a uma gama cada vez mais consistente”, afirma Luisa Amorim, salientando que a empresa não trabalha gamas baixas: não é preciso vender barato para se ser competitivo; basta fazer diferente, com qualidade, saber explicar a diferença e manter o rumo com empenho, e procurar ter uma gama de preços justos em relação à oferta que se coloca no mercado.

Pomares, uma das marcas do portefólio da Quinta Nova, à beira da piscina do enoturismo.

Luisa Amorim exemplifica. Diz que não tem um enoturismo barato no vale do Douro, mas a sua “casa” está sempre cheia “porque as pessoas compreendem que aquilo que damos é exclusivo e estão disponíveis a pagar o preço da qualidade que lhes oferecemos”. No fundo, o que quer é estabelecer uma relação de confiança entre a Quinta Nova e os seus clientes. “É esse o meu objetivo, construir uma marca em que as pessoas confiem”, defende. O negócio não tem sido fácil, porque o mercado de vinhos é muito competitivo e a produção varia com as condições climáticas. Mas está a resultar.

A Associação Bagos d’Ouro

Luisa Amorim fundou, há cinco anos, a Associação Bagos d’Ouro, em que estão envolvidas cerca de 20 empresas produtoras de Vinhos do Douro e do Porto, para apoiar crianças e jovens de famílias carenciadas. “São inteligentes, têm imenso potencial e, de outra forma, não teriam oportunidades”, explica a empresária, referindo que todos os envolvidos são acompanhados até à inserção na vida activa. “O apoio da Bagos d’Ouro, associação sem fins lucrativos, pode fazer uma grande diferença na vida destas crianças.”

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